(Mais tarde foi alterado para Marcelo no local.)
Hoje é um dia histórico. Reportagem no aeroporto Francisco Sá Carneiro. Um adepto do Porto comprou o bilhete há meses porque tinha «fé». Um adepto do Braga chegou às três da manhã para apanhar um avião que sai às nove. Regresso ao estúdio. Excerto de It's a Beautiful Day, dos U2. Ligação a Dublin onde, afinal, chove. Reportagem com o tio de Domingos Paciência, que prepara uma sardinhada num pavilhão de Matosinhos. Vai levar entre duzentos e trezentos pães mas não apanhei o número de sardinhas.
É possível que o noticiário (?) das oito da TSF tenha incluído notícias (?) ainda mais bonitas mas eu, que admito ter uma relação complicada com a paciência (com o Paciência não tenho problemas, pelo menos enquanto ele não for treinador do Sporting), saí do carro antes de se chegar, sei lá, à informação (essa sim, seria relevante) de que hoje as strippers minhotas oferecem lap dances gratuitas aos sócios do Braga. (Aos do Porto parece que já ofereciam – ou era só aos dirigentes?) Enfim, acima de tudo, não esquecer de repetir pelo menos dez vezes durante o dia: hoje é um dia histórico.
Os suicídios na France Telecom colocam a nu a evidência: na maior parte das empresas de média e grande dimensão o ambiente é hoje frio e agressivo. O orgulho de pertencer à organização desvaneceu-se (ou, para ser mais exacto, foi destruído). Quase ninguém «veste a camisola». Os gestores actuais, que ainda fazem discursos apelando a vários «espíritos» (de grupo, de sacrifício, de luta), não percebem o óbvio: são eles os grandes responsáveis pela situação. Têm sido eles a desprezar os recursos humanos das empresas que lideram, pressionando-os para além do admissível, tratando-os como peças dispensáveis, insultando-os com frequência, antes de voltarem aos tais discursos de circunstância em que tudo soa idílico mas nos quais ninguém acredita. É, de resto, irónico que eles falem, do alto das suas cátedras feitas de cintilante teoria, de «fidelizar clientes», de levá-los a escolher por factores que não o preço, de «criar relações de parceria e confiança». Por que esperam dos clientes aquilo que eles próprios não estão dispostos a dar?
Muitas empresas actuais não são lideradas por gestores. São lideradas por meninos (independentemente da sua idade real) mimados que aprenderam a viver no INSEAD, na McKinsey ou nos bastidores da política mas estão a conseguir moldar a sociedade. E – última ironia – que, se se excluírem os tais discursos, parecem cada vez mais apenas «patrões».
Somos os bons/maus que dizem permitir que escritores, jornalistas e cartoonistas publiquem o que entendem mas, quando eles publicam, ou pretendem publicar, algo incómodo, os criticam e lhes exigem silêncio. Somos os bons/maus que consideram a lapidação ou a excisão feminina actos bárbaros mas os justificam com "especificidades culturais’. Somos os bons/maus que colonizaram e agora calam os erros e os crimes que vêem. Somos os bons/maus que, por não beneficiarem todos os actos históricos das mesmas atenuantes contextuais e por excessiva capacidade de desenvolvimento económico e social, causaram o terrorismo. Somos os bons/maus que, por motivos humanitários, libertam terroristas culpados da morte de duzentas e setenta pessoas e, em silêncio envergonhado, os vêem ser aclamados à chegada a casa. Somos os bons/maus com respeito pelos criminosos e sem respeito pelas vítimas.
Vários blogues (um, dois, três) chamaram a atenção para as declarações à TV de Carolina Patrocínio, a rapariga que o PS escolheu para mandatária da juventude e que tem apresentado algumas das incontáveis sessões de informação/propaganda que nos pretendem descerrar os olhos para o cerebrino desempenho de Sócrates, Lino e companhia. Num estilo, digamos, ditirambicamente auto-centrado, a rapariga provou ter a cabeça tão oca quanto as cerejas que só come depois da empregada lhes retirar o caroço (podem ver o vídeo aqui). Devo dizer que me parece uma escolha perfeitamente adequada para este PS e, especialmente, para este Secretário-Geral do PS. Relembremos a carreira de Sócrates: assinou projectos alheios, obteve licenciaturas por fax, fez carreira profissional num partido político, escolheu de forma pouco clara parceiros do governo que acabou por dirigir, defendeu teorias liberais numa semana e intervencionistas na seguinte, atacou ferozmente os adversários políticos por lhe colocarem questões difíceis no Parlamento e os jornalistas por não ignorarem notícias de escândalos em que o nome dele surgia envolvido, permitiu pressões sobre os magistrados que investigavam esses escândalos, inventou relatórios da OCDE, apoiou gente que perseguiu quem teve o descaramento de contar piadas acerca dele, contratou crianças para figurarem num dos já referidos shows esquecendo-se de pôr no final o aviso de que tínhamos acabado de assistir a uma obra de ficção, e revelou sempre, mas sempre o maior cuidado com as aparências (de tal modo que baixou o IVA para os ginásios e nunca esqueceu a corridinha panfletária por entre guarda-costas e operadores de câmara esbaforidos em todas as viagens oficiais que fez). Talvez com receio de que isto pudesse passar uma imagem de futilidade (mas terão os fúteis noção da sua futilidade?), tentou contrabalançar anunciando umas quantas reformas e várias obras públicas monumentais. Não teve grande sucesso porque (fiquemos por dois exemplos) tinha as coisas tão bem preparadas que nem os melhores professores entenderam o sistema de avaliação dos professores, e ao primeiro estudo feito com uma imagem de satélite e uma máquina de calcular se provou que a irredutível decisão sobre a localização do novo aeroporto de Lisboa tinha que ser corrigida. Depois confessou ter descurado a cultura, pestanejou três vezes com ar compungido, recuperou para afirmar estar muito satisfeito consigo próprio, referiu-se a “Caines” e toda a gente desatou a rir. Desconfio que, investigando um pouco, chegar-se-ia à conclusão de que alguém também lhe descaroça as cerejas. Pormenor irrelevante, aliás.
A PJ levou para interrogatório os dois elementos do 31 da Armada que foram devolver a bandeira da autarquia. Na sequência de um caso desta gravidade (passeio por cidade com escadote, subida a varanda pública, troca de bandeira alfacinha por bandeira de Vila Viçosa*, imitação não autorizada de Darth Vader, admissão de acto ilícito**, alteração das condições de limpeza da bandeira retirada antes da sua devolução) espera-se que ambos permaneçam em prisão preventiva, partilhando a cela deixada vaga por Oliveira e Costa. Já agora, que a PJ aproveite para lhes dar um daqueles banhos de agulheta que se vêem nos filmes. Eles até parecem rapazes limpinhos mas há oportunidades a não perder.
* É favor tomar isto em sentido figurado (de qualquer forma, têm ambas azul).
** Especialmente grave por poder abrir precedente.
Ele há coisas com piada: enquanto vários jornais e televisões ponderam ignorar a directiva da ERC (Entidade para o Respeitinho na Comunicação?) que tenta proibir os órgãos de comunicação social de manterem comentadores que sejam candidatos às eleições, o Jornal de Notícias, o primeiro jornal a anunciar ir cumpri-la, publica, a um mês e meio das eleições legislativas, um artigo de opinião (?) da autoria de José Sócrates. A rebeldia do Norte já teve melhores dias, carago.
O31 da Armadaresolveuhastear a bandeira monárquica na Câmara Municipal de Lisboa. Não vou comentar o acto (e daí até vou: pelo menos não destruíram nenhuma plantação) nem a finalidade do acto (ok, só uma observação, curtinha: é indubitável que D. Duarte teria sobre Cavaco a vantagem de possuir uma voz forte e bela) mas isto demonstra claramente a cada vez maior capacidade interventiva da blogosfera no mundo a (pelo menos) três dimensões. Claro que constatá-lo gera um problema para quem, como eu, começou um blogue na esperança de que tudo pudesse ser feito sem colocar o nariz fora da porta de casa.
Antes de publicar este post (e garanto que só o faço porque desejo sinceramente ter a fotografia abaixo no blogue), gostaria de deixar uma pergunta aos monárquicos: se reimplantássemos a Monarquia, podíamos ter uma princesa assim?
A renovação não é necessariamente uma coisa boa. Mas é uma oportunidade. Manuela Ferreira Leite está a ultimar as listas de candidatos a deputados. Resta saber se vai ter coragem para decidir sem medo de afrontar alguns caciques locais. É triste constatar que o que devia ser uma vantagem (as estruturas locais reflectirem melhor os interesses das populações onde se inserem) é afinal uma perversão. Ou alguém acredita que os filhos dos autarcas de Barcelos, Gaia e Coimbra são mesmo os melhores cidadãos simpatizantes do PSD que essas regiões têm para oferecer ao país? Aliás, as coisas andam de tal modo perversas que, mesmo que fossem, ninguém acreditaria.
José Sócrates declarou ontem, no que deve ser português técnico, que ainda está para nascer um Primeiro-Ministro que "tenha feito melhor no défice" que ele. Vamos supor que queria dizer que ainda está para nascer um Primeiro-Ministro que "faça melhor no défice" (como o Portugal Diário misericordiamente assumiu), o que, não sendo muito claro (o que é "fazer melhor no défice?"), pelo menos não mistura futuro com passado. Sendo assim, fantástico! (Ou porreiro, pá.) Já não nos bastava continuarmos à espera do D. Sebastião, vamos ter que aguardar no mínimo umas dezenas de anos por um Primeiro-Ministro decente.
(O que vale é que Sócrates raramente tem razão.)
Considero o parque da cidade do Porto um pequeno milagre. Escrevi-o aqui. Quando saiu da Câmara, Nuno Cardoso legou a Rui Rio uma situação armadilhada. Por um lado, Rio encontrou direitos de construção numa das frentes do parque cedidos a privados. (A cedência foi assinada por Cardoso nos últimos dias do mandato, o que levanta a eterna questão "onde é que já vimos este filme?") Por outro, Rio prometera durante a campanha não deixar construir no parque. Cumpriu a promessa e, em troca, obteve uma longuíssima batalha jurídica, com custos ainda não totalmente contabilizados. Hoje, Elisa Ferreira atacou-o pela opção feita. Na minha opinião, é um erro e um acto de descaramento. Os portuenses sabem que quem criou a situação foi o PS de Elisa (e deixemo-nos dos eufemismos da "independência" da candidatura; uma senhora que se fez eleger para o Parlamento Europeu e é candidata à presidência da segunda mais importante Câmara do país, sempre pelo mesmo partido e com tanta gente possuidora de cartão de mão estendida, é do menos independente que pode haver). Sabem também que Rio pode ter um estilo rebarbativo que nem sempre o leva aos melhores resultados da forma mais rápida possível mas é honesto e está a procurar cumprir a palavra. Mais importante, visitam o parque da cidade e percebem que defendê-lo é um dever colectivo. Mesmo que algumas críticas de Elisa possam ser, pelo menos em parte, verdadeiras, tudo empalidece perante estes factos. E afinal, que solução preconiza Elisa? Permitir a construção? Que o afirme claramente. Deve assegurar pelo menos os votos dos promotores imobiliários e dos construtores civis.
O i de hoje informava-nos* que analistas do banco de investimento Morgan Stanley na Grã-Bretanha pediram a Matthew Robson, um estagiário de 15 anos, para elaborar um relatório sobre a relação dos adolescentes com os media e que, ao recebê-lo, ficaram tão impressionados que decidiram publicá-lo.
Ao acabar de ler a notícia, eu pensava em duas coisas. Primeiro, na proposta de Miguel Portas durante a campanha para as eleições europeias: está visto que, com jovens como estes, baixar a idade de voto para os dezasseis anos é um acto de sensatez e justiça. Depois, e mais importante, que esta história nos permite confirmar a noção de que gestores e analistas financeiros são absolutamente incapazes de ver a realidade a menos que esta lhes seja colocada à frente num relatório. E que depois adoram mostrar no-la para que possamos perceber as fantásticas descobertas de que são capazes.
* A notícia está online numa versão mais curta do que a que foi publicada em papel.
Helena Roseta cedeu. O movimento "Cidadãos por Lisboa", que lidera, concorre às eleições para a Câmara de Lisboa integrado nas listas do PS. Esta coisa dos movimentos de cidadãos tem alguma lógica. Mas não quando as suas convicções são tão firmes (ou tão distintas) que rapidamente aceitam a integração num dos principais partidos em troca do proverbial prato de lentilhas. A ideia que ficou é que nas últimas horas Roseta e Costa andaram a discutir assuntos tão fundamentais como o lugar em que ela concorreria (segundo), se substituiria ou não Costa em caso de impedimento deste (a resposta é não), quantos elementos do movimento estariam em lugares elegíveis (dois, num total de quatro que integrarão as listas). Políticas para a cidade? Não ouvi nada. Aliás, não sei mesmo quais as diferenças fundamentais entre Costa e Roseta, pelo que esta coligação é capaz de fazer sentido. O movimento "Cidadãos por Lisboa" é que talvez não. Ah, esperem, vão concorrer autonomamente a algumas freguesias porque, segundo Roseta, é aí, no nível mais próximo dos cidadãos, que o movimento mais tem razão de ser. Suponho que ela ainda não leu a opinião da Maria Filomena Mónica sobre as Juntas de Freguesia (just for the record, eu também não sei quem é o presidente da minha). Assim como assim, Costa está de parabéns. Depois do "Zé", a Helena. Paulatinamente, está a aglutinar à sua volta todos os valorosos espíritos "independentes" que a cidade de Lisboa tem para oferecer. Com jeitinho, ainda vai buscar a Maria José Nogueira Pinto só para entalar o Santana e o Portas...
Segundo o i, há suspeitas de que o ministério das Obras Públicas pode ter descurado o interesse público na cedência dos direitos de exploração do Terminal de Contentores de Alcântara à Liscont. Mário Lino já negou, Jorge Coelho deve fazê-lo de seguida. Afinal, ele até afirmou esta semana que a Mota-Engil anda a ser prejudicada pelas decisões governamentais...
Pode ser uma injustiça colocar as coisas nos termos em que o vou fazer no final deste post. António Costa sempre me pareceu um homem razoavelmente ponderado, longe do estilo histérico-acéfalo de outros socialistas durante estes quatro anos e meio de poder absoluto do PS. Ainda assim, as críticas recentes ao governo, reiteradas (por palavras e silêncios) na entrevista de hoje ao jornal i, surgem como tardias e oportunísticas. Enquanto Sócrates pareceu imbatível, tudo era perfeito ou, pelo menos, todas as queixas eram caladas. Só me ocorre dizer que o navio socialista dá sinais de meter água e que os primeiros tripulantes começam a tentar abandoná-lo.
O Procurador da República alerta para a redução de liberdades individuais em nome da segurança. O aviso poderá ser visto como algo exagerado, uma vez que, de acordo com um estudo da Privacy International, uma entidade independente, Portugal tem um nível de protecção da privacidade "enfraquecido" mas mantém salvaguardas razoáveis, uma situação que, não sendo brilhante, é melhor que a de muitos outros países da UE (e em especial do Reino Unido, classificado ao nível de países como os Estados Unidos, a Rússia e a China). É curioso notar como, na Europa, muitos países que passaram recentemente por sistemas ditatoriais tendem (por enquanto) a apresentar um melhor nível de salvaguardas. (Há excepções notórias, como a Espanha).
Mas, apesar do ranking (referente a 2007) ainda não nos posicionar muito mal, o aviso de Pinto Monteiro tem razão de ser por (como diria o Eng. Ângelo Correia) três ordens de razão: a tendência é também por cá para o Estado aumentar as formas de intrusão na esfera privada dos cidadãos; as salvaguardas existem na lei mas, porque o nosso sistema judicial é mau, nem sempre na prática; e é antes da situação atingir níveis verdadeiramente preocupantes que os principais intervenientes no sistema devem falar.
Pinto Monteiro centra a questão na segurança. Como penso já ter deixado pelo menos implícito aqui e aqui, julgo que a tendência para a imposição (por parte dos governos) e aceitação (por parte do público) destas medidas vai para além das questões da segurança. Estas são sem dúvida importantes e a maior parte das pessoas, vendo notícias consecutivas sobre assaltos violentos ou baleamento de polícias (o terrorismo perdeu parte da carga ameaçadora que, pelo menos em alguns países, chegou a ter), tende a aceitar o aumento de medidas de segurança 'intrusivas', convencidas de que nunca serão afectadas por elas. Mas penso que a questão vai mais longe. Para além da sensação de insegurança, uma outra, de injustiça, tem vindo a impregnar a sociedade portuguesa (e admito que outras). A injustiça (parte real, parte percepção) de sentir que se é cada vez mais pressionado enquanto outros passam incólumes por todas as dificuldades. Afinal, o emprego só parece estar em risco para alguns. As reformas de certas pessoas permanecem obscenamente elevadas enquanto as da maioria caem. Os lucros de algumas empresas continuam astronómicos e os seus gestores e accionistas ganham milhões de euros por ano enquanto a maioria tem problemas para pagar o empréstimo da casa. Uma imensidão de pessoas recebe subsídios para nada fazer enquanto os restantes têm que trabalhar. Esta percepção (que, sendo justa, injusta ou apenas simplista, existe) cria um desejo de vingança sobre os que são vistos como privilegiados (não apenas os ricos mas todos os que parecem não fazer o suficiente para justificar aquilo que têm). Na opção de mentalidade expressa pela velha história dos dois jardineiros que vêem passar o patrão num Roll-Royce, dizendo um para si mesmo que ainda um dia há-de acabar com aqueles privilégios e o outro que ainda um dia há-de ter um carro como aquele, estamos claramente ao lado do primeiro porque já desistimos de ter esperanças que o nosso mérito (que nos parece inegável) seja convenientemente recompensado. Vigie-se e fiscalize-se toda a gente, pois então. No que nos diz respeito, é irrelevante: afinal, já somos controlados ao chegar e ao sair do emprego, já temos o acesso à internet monitorizado (ou bloqueado) pela empresa em que trabalhamos, já estamos sob vigilância nos shoppings, já nos sentimos sob vigilância nas estradas. Mais: já estamos, indefesos, expostos a todos os abusos das autoridades. E, no fim de contas, nada fizemos de mal. Se a redução das liberdades individuais levar a que possam ser apanhados os verdadeiros criminosos, óptimo. Claro que depois de os apanhar torna-se necessário puni-los. E aqui nasce a segunda parte do problema: o Estado, através do sistema judicial, não consegue fazê-lo. Diz-nos então que precisa de mais meios de vigilância para arranjar melhores provas e nós, cada vez mais desesperados e mesmo acreditando cada vez menos na possibilidade das coisas mudarem, aceitamos.
A solução? Uma economia a crescer para reduzir as tensões sociais. Políticas sociais cirúrgicas e justas. Um sistema judicial a funcionar. Toda a gente conhece a solução. A questão é como lá chegar.
A ministra da Educação culpa a comunicação social pela descida nos resultados dos exames de matemática. Diz ela que a comunicação social transmitiu uma imagem de facilidade e que, por isso, os estudantes não estudaram, levantando-se a dúvida ontológica (se isto fosse um exame, eu explicava o que quer dizer) de saber se estudantes que não estudam podem ainda ser considerados estudantes. Eu acho que não. Chamem-lhes outra coisa qualquer e excluam-nos das estatísticas. Os resultados melhorariam de imediato e a ministra poderia novamente sorrir e dizer que tudo se deve ao excelente trabalho do ministério. Quanto à comunicação social, e por muito que defendamos métodos pedagógicos avançados, devia levar dez reguadas (posso sugerir o seu representante?) e ser mandada para o canto, de onde apenas poderia sair depois de 27 de Setembro.
Uma pequena notícia no jornal i informava que Domingos Névoa, administrador da Bragaparques, apresentou uma queixa contra José Sá Fernandes por este, durante o processo por tentativa de corrupção no qual Névoa foi condenado, lhe ter chamado “bandido”. O vereador lisboeta foi constituído arguido e arrisca pena até dois anos e multa não inferior a 120 dias. Arrisca também, porque Névoa entende ter sofrido graves danos morais (nos dois dias seguintes à declaração de Sá Fernandes, nem foi trabalhar de tão perturbado que estava), ter que pagar uma indemnização de vinte e cinco mil euros. Se bem me lembro, Névoa foi condenado em cerca de cinco mil euros; se ganhar, não subsistem dúvidas: neste país, mesmo quando as coisas lhes correm mal, a corrupção é um negócio altamente lucrativo para os corruptores.
Cristiano Ronaldo deu uma longa entrevista ao jornal espanhol Marca e, como seria de esperar, os canais de televisão portugueses noticiaram abundantemente tão importante acontecimento. Foi realçado o facto de ele ser um rapaz de palavra, visto ter prometido à referida publicação, no ano passado, que teriam direito à primeira entrevista dele como jogador do Real Madrid, caso chegasse alguma vez a sê-lo. Ainda assim, o que me chamou a atenção – sacaninha como sou – foi a resposta, num daqueles questionários Proustianos que tão giros às vezes se revelam, que o livro preferido de Cristiano Ronaldo é a fotobiografia de Cristiano Ronaldo. Percebe-se: é um livro simpático, que se lê bem e tem um herói com que qualquer pessoa se identifica facilmente – mesmo uma super-estrela como Cristiano Ronaldo. Reparei também que, ao ser instado a escolher uma cidade, optou por Madrid, mas aí a gente percebe: a competição com Kaká não vai ser fácil e o tio Alberto João chatear-se-ia mais se ele respondesse “Lisboa”.
Elisa Ferreira garante que lutará contra todas as sondagens, sejam negativas ou sim, e que levará a sua candidatura à Câmara Municipal do Porto até ao fim: como se sabe, Estrasburgo. Diz ainda que os responsáveis do PS lhe dão "apoio suficiente". Supõe-se que já não a cumprimentam com dois beijos mas ainda lhe apertam a mão.
O ex-ministro Manuel Pinho foi ainda ontem à SIC Notícias dizer que está arrependido do gesto que fez durante o debate do estado da Nação. Acredito que esteja, mais pelas consequências que sofreu que por tê-lo feito (Pinho tratou imediatamente de acrescentar que foi provocado, como se isso transferisse a culpa para Bernardino Soares, o apreciador da democracia Norte-Coreana). Tendo que sofrer as consequências, estou até convencido que ele também está arrependido de não ter feito um gesto ainda mais forte (sim, aquele em que se estende um único dedo e se recolhem os restantes). Seja como for, na entrevista Pinho declarou, com ar de vítima do “sistema”, que não entende a política actual, por esta nada ter a ver com o país real, onde vivem as pessoas "normais". Veja-se bem que ainda recentemente estivera num distrito “fortemente PSD: Leiria” e fora muito bem recebido pelos empresários locais, com quem tinha sido possível discutir apoios e outras formas de auxílio. Esta gente não tem mesmo noção da realidade. Alguém esperaria que, num país em que tudo depende do Estado, os empresários de Leiria – simpatizantes do PSD ou não –, recebessem mal quem lhes levava dinheiro? Com – permitam-me citar uma frase do último livro de Vasco Pulido Valente – “o atávico oportunismo da miséria portuguesa”? Meu caro ex-ministro, para eles o senhor era nada mais que um porquinho mealheiro. Ou, neste caso, um tourinho mealheiro.
Pela primeira vez um debate sobre o Estado da Nação serviu verdadeiramente para a nação perceber alguma coisa sobre o seu estado ou, pelo menos, sobre o estado dos seus representantes. O acto de Manuel Pinho é apenas o corolário dos repetidos actos de autismo e de arrogância deste governo, cheio de pessoas medíocres que se multiplicam pelos diversos níveis do Estado, chefiado por um político inculto e mais que medíocre, apenas preocupado com a forma como as coisas parecem e não como elas são (as histórias da sua licenciatura e dos seus projectos, para além das repetidas encenações do governo, mostram-no à saciedade) e incapaz de aceitar a crítica. Os consultores de Obama devem estar a perguntar onde diabo vieram parar.
Na questão da venda da rede fixa à PT, Manuela Ferreira Leite deveria ter apenas declarado que fez o que entendeu dever fazer, considerando as circunstâncias que já por várias vezes explicou: a necessidade de manter o défice abaixo dos 3% e a inexistência – à época – de folga temporal para o reduzir por outras vias. Poderia ter acrescentado que a decisão política até vinha do governo Guterres – mas depois de assumir o acto.
Ainda assim, o caso permite-me lembrar Sócrates e o PS em 2004 e inícios de 2005. Nessa altura eles bramavam que o que se passara durante os governos do engenheiro Guterres era irrelevante. A crise devia ser totalmente atribuída aos governos PSD/CDS. Sócrates afirmou dezenas de vezes, no seu estilo onde apenas Ana Lourenço consegue introduzir a dúvida e a humildade, que a direita culpava Guterres para esconder o seu próprio fracasso. Hoje é o PS que tenta desenterrar o passado; que, no fundo, continua a esforçar-se por demonstrar que os governos PSD/CDS foram maus. Bom, meus caros, isso não é novidade para ninguém. Mas deixem que vos diga duas coisas: o governo de Durão Barroso ocorreu durante um período de quebra económica a nível europeu e teve a oposição da comunicação social e do Presidente da República, enquanto o vosso desfrutou nos primeiros anos de alguma retoma económica e teve durante muito tempo uma comunicação social e um Presidente cooperantes; e, parafraseando-vos, o que se deve discutir em 2009 são as vossas políticas. São elas que falharam. E, por muitas trapalhadas que os governos PSD/CDS tenham feito, nenhum deles atingiu o vosso nível de arrogância e de assalto ao poder.
Os socialistas não andam a gostar das declarações de Cavaco Silva. Bom, na realidade os socialistas não andam a gostar de uma data de coisas hoje em dia. Esta é só mais uma. Mas há um pequeno pormenor quando se trata de Cavaco: a maioria das pessoas que o elegeu fê-lo por esperar que ele pudesse moderar os excessos do governo. Eu sei que há aquela velha treta do "presidente de todos os portugueses" mas ninguém votou em Cavaco para este tratar dos jardins do Palácio de Belém. Se está preocupado, Cavaco deve falar. Provavelmente não o fez nos primeiros anos de mandato porque, como muitas outras pessoas (que votaram ou não nele, que votaram ou não no PS), ainda alimentou esperanças de que Sócrates fizesse o que era necessário fazer. Entretanto tornou-se óbvio que isso não sucederá. Pior: todos os vícios do PS (e, de certa forma, dos sistemas partidário e empresarial português) vieram à tona. Cavaco deve assistir em silêncio?
Bernard Madoff foi hoje condenado a 150 anos de prisão. Não gosto dele pela maldade que fez a tanta gente, incluindo à adorável Kyra Sedwick, que eu vejo sempre com um telecomando de um portão de garagem na mão explicando como o objecto significa a sua liberdade (Singles, de Cameron Crowe, circa 1991). Ainda assim, vou abster-me de dizer “bem feito” e de comparar a celeridade e a efectividade da justiça americana com o que pelas nossas bandas passa por justiça. Estou certo de que outros o farão abundante e merecidamente. Este texto é para outra coisa. Atendendo aos 71 anos de idade, Madoff falecerá na prisão e dentro de não muitos anos. Mas, a médio prazo, conseguirá algo que apenas os maiores burlões atingem: uma fama onde a admiração se mescla com e, na verdade, se sobrepõe a qualquer consideração ética. É necessário admiti-lo: adoramos burlões. Ficamos pasmados perante a sua audácia e os valores atingidos pelas falcatruas que executam. Basta pensar nos mais conhecidos burlões portugueses do século XX (políticos excluídos): Alves dos Reis e Dona Branca. São famosos. Já se fizeram séries televisivas sobre ambos. Pensamos neles com um esgar de admiração, não de raiva. À distância de alguns anos, até os entendemos. Dona Branca era uma senhora bondosa e bem intencionada, não era? E, na verdade, não nos importaríamos de imprimir dinheiro, desde que pudéssemos não ser apanhados. Normalmente um burlão é um gajo esperto e metê-lo na cadeia, se satisfaz o nosso desejo de vingança, é uma maldade quase tão grande quanto as burlas que ele cometeu. Pode ser necessário que passem alguns anos mas é assim que acabamos por vê-los. Madoff acabou de assegurar um lugar especial no panteão dos burlões. É responsável pela maior fraude financeira da história. Cinquenta mil milhões de euros. Impressionante. Dentro de meia dúzia de anos será reverenciado. Escrever-se-ão livros sobre a sua vida. Hollywood fará filmes sobre o que aconteceu. (Provavelmente nem será preciso tanto tempo.) Quantos financeiros honestos conseguem algo similar?
Muita gente o disse e escreveu. Um estilo de jogo como o de Rafael Nadal provoca elevado desgaste físico. O corpo humano - mesmo um corpo tão bem preparado como o de Nadal - tem limites. Há um par de anos começaram a surgir notícias de problemas nos joelhos. Neste preciso momento, Nadal não está em Wimbledon tentando defender o título conquistado no ano passado numa das melhores finais da história do ténis por causa deles. O i avança agora que ele pode ter que deixar de jogar dentro de pouco tempo. Os seus joelhos apresentarão o desgaste dos de um tenista de 33 anos (fez 23 no início deste mês). Para um fã de ténis (mesmo um que, como eu, aprecie o estilo leve e elegante de Federer acima do de todos os outros jogadores), a notícia é triste. A rivalidade entre Federer e Nadal foi o sal do ténis nos últimos quatro anos. Ainda por cima, os dois respeitam-se de uma forma rara no desporto. No ano passado, depois de bater Federer na final de Roland Garros pelo terceiro ano consecutivo, para mais com um resultado humilhante para o suiço, Nadal pediu-lhe desculpa no discurso final. Depois de perder a final do Open da Austrália deste ano, Federer interrompeu o discurso em lágrimas. Mas pegou de novo no microfone antes de Nadal falar porque "this guy deserves to have the last word". Num fim-de-semana em que, por cá, ocorreram agressões entre espectadores de uma final de um campeonato júnior de futebol, é significativo que quase todos os fãs de um dos dois maiores tenistas da actualidade apreciam e respeitam o outro. E é também por isso que espero que a realidade não seja tão grave quanto a notícia do i deixa antever. Independentemente das maiores dificuldades que a presença de Nadal possa trazer a Federer, eu quero-o nos torneios. Quero continuar a agonizar entre os desejos contraditórios de que ele perca antes de defrontar Federer e de ter mais uma final entre ambos.
O governo interferiu na decisão da PT comprar parte da Media Capital. Sócrates declarou tê-lo feito para evitar suspeitas de que o governo interfere nas decisões das empresas onde tem participações. Passando por cima do paradoxo, a manobra permitiu especulações interessantes, como a do CDS que avançou a possibilidade do governo ter perdido o interesse no negócio a partir do momento em que ficou claro que José Eduardo Moniz ficaria na TVI. Acho que se pode ir ainda mais longe. Depois do Ministro Mário Lino dizer esperar que a PT acate a posição do governo, como que receando que isso possa não acontecer, qualquer amante de teorias de conspiração sente um formigueiro na ponta dos neurónios. Se a PT acabasse por comprar a posição na Media Capital, o governo poderia dizer que nada tinha a ver com o assunto – como fora público, opusera-se ao negócio –, conseguindo ao mesmo tempo a tão desejada saída do casal José Eduardo e Manuela da TVI. Há só o pequeno detalhe do Primeiro-Ministro sair desautorizado, o que, num país onde as aparências são tudo, provavelmente faz ruir a teoria. Mas é pena (de certa forma...). Mostraria imaginação e maquiavelismo, e garantia-nos mais umas semanas de especulações ferozes.
(Acho que escrever comentários políticos em blogues aumenta o nível de cinismo. Só comecei isto há dois meses e meio e o meu cérebro congemina já todo o tipo de maquinações. Ou será que já o fazia antes?)
Paris Hilton acusa Ronaldo de ser demasiado gay. Já não nos bastava a crise económica, atacam-nos um dos símbolos maiores. Acusarem Afonso Henriques, Camões ou Cavaco era uma coisa. Ronaldo é outra, muito mais séria. Ronaldo é a nossa ambição e a nossa virilidade. Onde é que estas ficam depois disto? Sugiro calma e várias possibilidades de reacção:
As eleições no Irão e tudo o que se lhes seguiu têm suscitado comentários de preocupação, esperança, raiva, perplexidade. A fraude eleitoral, a coragem dos manifestantes, a violência da polícia, o uso das novas tecnologias, a personalidade de Mousavi, a luta entre Khamenei e Rafsanjani, as tentativas de Ahmadinejad associar os protestos a manipulações dos Estados Unidos e da União Europeia – tudo tem sido discutido até à exaustão. E ainda bem. Pela minha parte, espero que o regime iraniano caia ou que, pelo menos e mais realisticamente, sofra um susto que acabe por obrigar à introdução de reformas e, a prazo, à realização de eleições verdadeiramente livres. Contudo, também receio que o resultado possa ser um endurecimento do regime, mesmo que temporário, e dificuldades acrescidas no diálogo entre o Irão e os Estados Unidos.
Nuno Cardoso aproveita condenação a três anos de prisão (com pena suspensa) por favor ao Boavista em 2001 para anunciar o regresso à política. É para aí a centésima quadragésima oitava vez que o faz. Das duas, uma: ou sente-se compelido a fazer nova tentativa sempre que lhe colocam um microfone à frente, na esperança vã de uma vaga de fundo dos descontentes com Rui Rio, ou considera que agora tem mesmo mais hipóteses de regressar à ribalta da política, com uma condenação a melhorar-lhe o currículo.
(Já agora, ele diz ir recorrer da sentença mas admite que pode ter escrito e assinado o despacho em causa. Parece que bastava porem-lhe um papel à frente, ditarem-lhe um texto e pedirem-lhe para assinar que ele o fazia sem hesitações. Tem lógica: um presidente da Câmara não pode perder tempo a procurar que as palavras façam sentido na sua cabeça antes de passar à acção, como facilmente se constata assistindo a algumas conferências de imprensa de colegas de Nuno Cardoso ainda no activo ou a ele próprio anunciando, impante, o regresso à política.)
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