Há uns anos, ao ver os primeiros episódios da série Girls (tão recente e já tão imitada que até fica difícil recordar quão inovadora foi), lembrei-me de O Animal Moribundo, de Philip Roth. A certa altura, o professor David Kepesh afirma:
Enquanto cresci, o homem não era emancipado no reino sexual. Era um homem de segunda apanha. Era um ladrão no reino sexual. Surripiávamos uma apalpadela. Roubávamos sexo. Adulávamos, suplicávamos, lisonjeávamos, insistíamos - todo o sexo exigia luta, tinha que ser disputado aos valores, senão à vontade da rapariga.
Mais tarde, referindo-se à actualidade (de 2001), acrescenta:
Aparecem antigas namoradas de há vinte e trinta anos. Algumas já se divorciaram numerosas vezes e outras têm andado tão ocupadas a afirmarem-se profissionalmente que nem tiveram a oportunidade de casar. As que ainda estão sós telefonam-me para se queixarem daqueles com quem se encontram. Os encontros são detestáveis, os relacionamentos são impossíveis, o sexo é um risco. Os homens são narcisistas, não têm sentido de humor, são doidos, obsessivos, autoritários, grosseiros, ou então são muito bem-parecidos, viris e cruelmente infiéis, efeminados, ou são impotentes, ou são simplesmente demasiado estúpidos. (*)
A abordagem da revolução sexual ocorrida na década de 1960 é quase sempre feita partindo da perspectiva feminina. Antes de qualquer outra análise, salienta-se o modo como a pílula e a evolução dos costumes libertaram as mulheres para o sexo sem (demasiados) receios. Mas a liberdade feminina também representou o fim da submissão masculina a qualquer tipo de compromisso. O facto de, ao longo das últimas décadas, as mulheres terem exigido e obtido não apenas o mesmo estatuto no que respeita ao sexo, mas poder total sobre os seus corpos - incluindo o de terminar gravidezes indesejadas - foi extraordinariamente libertador para os homens. O esforço de cortejar, apoiar, assumir responsabilidades tornou-se-lhes opcional, em especial quando favorecidos pelo sorteio genético (i.e., quando atraentes). Nem sequer as regras do politicamente correcto - em muitos sentidos, a prisão dos tempos actuais - os forçam ao que quer que seja: adquirida a igualdade, as mulheres perderam o direito a queixarem-se de terem sido iludidas. Durante séculos, no mundo «civilizado», os homens viram-se obrigados a conjugar instintos e convenções sociais. Agora, estão livres para dar largas ao egoísmo. Às acusações de insensibilidade, podem responder que se limitam a «dar espaço» às mulheres; que estão a «respeitar» a «autonomia» delas.
Nos primeiros tempos de Girls, esta realidade saltava à vista. Hannah desesperava com a passividade de Adam. Para ele, a relação apenas parecia existir enquanto decorria o acto sexual. Em todos os outros momentos, Hannah sentia-se esquecida: ele não telefonava, não respondia às mensagens, demonstrava indiferença quando a encontrava. Fleabag, uma série de 2016 produzida pela BBC e pela Amazon, escrita e interpretada por Phoebe Waller-Bridge, atinge um novo extremo. Apresenta uma mulher que parece vogar entre relações sexuais sem significado (mas não sem consequências), nas quais se submete (sem ser explicitamente forçada) a actos que tem dificuldade em racionalizar. Tudo estaria bem se não as usasse como forma de evitar enfrentar o vazio e a infelicidade que a dominam. Fleabag vai tão longe que se permite incluir um indivíduo nada atraente e bastante irritante no séquito de homens que não têm qualquer dificuldade em ir para a cama com ela.
Sejamos francos: nas últimas décadas, o sexo tornou-se um produto de consumo como qualquer outro; mais uma forma semidescartável de sentir algo, totalmente desligada de sentimentos profundos. Em 1975, Woody Allen afirmava: «O amor é a resposta, mas enquanto se espera pela resposta, o sexo coloca perguntas interessantes.» A resposta continuará a mesma, mas as perguntas parecem ter vindo a perder interesse. Se a consequência óbvia de tanto desejo de independência (por parte das mulheres como por parte dos homens) é a solidão, a consequência óbvia de tanto sexo (real, imaginado, visualizado em ecrãs e na rua) só pode ser a banalização do acto e dos termos que se lhe referem. Em Os Livros que Não Escrevi, George Steiner dedica um capítulo à linguagem do erotismo. Considera-a - como ao próprio acto - cada vez menos subtil, mais baseada nos códigos instituídos pelo cinema, pela televisão, pela publicidade. Escreve ainda: Será fascinante descobrir os novos factores de complexidade e os contributos enriquecedores que poderão vir das correntes feministas. Produziram já uma poesia poderosa e uma prosa acusadora. Poderá a sua política da sensibilidade ser causa de novas orientações e de uma criatividade nova nos dialectos do amor? Até ao momento, os indícios nesse sentido são marginais. O que parece prevalecer entre as mulheres emancipadas é a adaptação, quase desdenhosa, do que eram a obscenidade e a licenciosidade clandestina do discurso masculino.(**)
Talvez não apenas do discurso. Talvez de todo o comportamento. Sexualmente, as mulheres parecem-se cada vez mais com os homens. Mas isso - a acreditar em exemplos como Girls e Fleabag, eles próprios, será conveniente ressalvá-lo, provenientes da cultura cinematográfica e televisiva - não parece torná-las felizes. À liberdade, que neste campo tende a equivaler a quantidade, contrapõe-se a estandardização (nada é novo, pouco permanece tabu), e o novo poder masculino: um egoísmo assumido, que a igualdade torna inatacável.
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(*) Edição Dom Quixote, 2006, p. 61 e 91, tradução de Fernanda Pinto Rodrigues.
(**) Edição Gradiva, 2008, p. 132, tradução de Miguel Serras Pereira.
Adenda: O que isto tudo significa para as relações de longo termo – bom, essa é outra questão. Que o aumento da taxa de separações e a diminuição do número de partos talvez ajude a explicar. A liberdade também tem custos.
Nas cartas dirigidas a Flaubert, muitas delas de uma sã crueza de linguagem, Maupassant mostra-se orgulhoso da sua virilidade excepcional e chega a confessar-se farto de sodomizar judias!... A resposta foi simples: «experimenta pelo lado tradicional e pode ser que o teu tédio desapareça».
João Costa, no prefácio a As Sobrinhas da Viúva do Coronel, de Guy de Maupassant, Bertrand, 2007.
Será possível acharmos que vivemos numa época especialmente sexual – isto é, em que se faz mais sexo do que noutros tempos e de formas mais criativas? A década de sessenta, com a libertação feminina, o amor livre, o make love not war e o sex, drugs and rock ‘n’ roll, bem como a representação cada vez mais displicente (e inconsequente) do acto sexual na televisão e no cinema terão provavelmente contribuído para tal sensação. Mas corresponderá ela à realidade? Infelizmente, sendo, por um lado, os inquéritos sobre a frequência e os hábitos sexuais o que eram nos séculos anteriores ao último (inexistentes talvez seja o termo que procuro) e, por outro, os humanos (especialmente se possuidores de um cromossoma Y) propensos a mentir quando questionados sobre estas matérias, não é fácil ter certezas. Mas julgo podermos afastar desde já a hipótese de sermos mais criativos. Se as confissões de Maupassant, afloradas acima (e confesso tê-las usado essencialmente para vos chamar a atenção), não constituem grande indicador, há milhares de outras fontes onde podemos constatar que, basicamente, nos limitámos a melhorar alguns acessórios recorrendo à electricidade, à injecção de plásticos e aos circuitos integrados. Mas e a questão da frequência? O mesmo Maupassant terá possuído numa só hora, perante uma testemunha, seis mulheres num bordel parisiense. Mas relações envolvendo troca de dinheiro dificilmente representam a realidade ou a sensibilidade de uma época. Por outro lado, convém evitar dar excessivo crédito a declarações de machos com tendência para o priapismo – ou para a gabarolice. É por esta razão que os relatos do divino Marquês de Sade também não nos servem para caracterizar o que quer que seja. Podíamos ainda recorrer à Bíblia, que nos fala de Sodoma e Gomorra, ou a relatos gregos e romanos mencionando bacanais mas continua a ser difícil fazer comparações com os tempos actuais (como determinar se Calígula participava em mais ou menos orgias do que José Castelo Branco?). De resto, talvez seja melhor atermo-nos aos tempos e às regiões de influência cristã. Então, como fazer? Eu digo-vos: buscando na ficção não erótica de diferentes épocas a ideia que os autores transmitem sobre o que representa ter muitas relações sexuais. Claro que não obteremos o número de relações em que uma pessoa média se envolvia mas pelo menos obteremos uma noção do que era considerado excessivo. Sendo isto um post de blogue (necessariamente curtinho e to the point), vou limitar-me a um par de exemplos totalmente aleatórios e, dessa forma, estou em crer que totalmente representativos.
Comecemos pela actualidade e por uma série televisiva intitulada How I Met Your Mother ou, na versão portuguesa, Foi Assim Que Aconteceu. Nesta série, Barney Stinson, um awesome (definição do próprio) jovem mulherengo nova-iorquino com cerca de trinta anos, tem relações sexuais com a duocentésima mulher diferente durante a quarta temporada. Já perto do final da quinta, refere que a contagem vai em quase duzentas e oitenta (o que revela um considerável aumento de ritmo). Temos então que, de acordo com a mentalidade actual, fazer sexo com quase trezentas mulheres é mais do que suficiente para que um tipo de trinta e tal anos possa considerar-se (e ser considerado) um engatatão de primeira classe. Se Barney tiver iniciado a vida sexual aos quinze, isto dá uma média de catorze ou quinze mulheres por ano. Razoável, de facto, pelo menos quando comparado com a minha estatística pessoal – mas eu tendo a esquecer-me das coisas.
Antes de recuarmos no tempo e colocarmos à prova as façanhas de Barney Stinson convém explicar que toda a lógica deste post se aplica aos homens. E não por uma questão de machismo, pelo menos da minha parte. Apenas porque, no que respeita às mulheres, não há qualquer dúvida. Convenhamos que discutir o número a partir do qual uma mulher era classificada como – er, conquistadora nem sequer é o termo, pois não?... promíscua, então? – há um par de séculos não é mais do que escolher entre os algarismos um, dois e três, consoante se tratasse de um mulher solteira, casada pela primeira vez ou casada pela segunda vez após morte do primeiro marido. Felizmente, hoje a situação é bastante diferente (felizmente também para os homens, que têm – dizem-me – menores dificuldades em arranjar sexo barato). Ainda assim, sinto-me forçado a salientar que, décadas depois da tal «revolução sexual» dos anos sessenta, continua a notar-se uma diferencita no valor considerado excessivo para homens e para mulheres. Lembram-se da cena, em Quatro Casamentos e Um Funeral (de 1994, mas creio que ainda razoavelmente representativo) na qual a personagem interpretada por Andie MacDowell enumerava os amantes que tivera? Ela apenas chegou a trinta e qualquer coisa mas terminou corada de vergonha e, diante dela, a personagem interpretada por Hugh Grant começava a entrar em estado de choque. Ou seja, trinta e qualquer coisa parceiros sexuais já são demasiados para uma mulher de trinta e qualquer coisa anos mas quase trezentas parceiras sexuais ainda não embaraçam um homem de trinta e qualquer coisa anos (pelo contrário, ele continua a sorrir, orgulhoso).
In Italia seicento e quaranta;
In Alemagna duecento trentuna;
Cento in Francia, in Turchia novantuna;
Ma in Ispagna son già mille e tre.
Passando sobre a desfeita de Don Giovanni ter ignorado as mulheres portuguesas (porquê, João, porquê?), somem os números e chegarão a – prontos? – duas mil e sessenta e cinco conquistas sexuais. Ora Don Giovanni teria apenas vinte e dois anos de idade. Considerando uma vida sexual de sete anos, obtém-se a astronómica média de duzentas e noventa e cinco mulheres diferentes por ano. O que são, comparadas com isto, as catorze de Barney Stinson? A conclusão é dolorosa mas inevitável: a menos que na televisão actual se exagere afinal muito pouco, vai-se a ver e ainda temos muito que... muito que… ainda temos muito sexo a fazer.
– Depois de ti nunca mais tive um namorado ou um amante que amasse o meu corpo tanto como tu o amaste.
– Tiveste namorados?
Lá estava eu de novo, com a mesma conversa. Esquece os namorados. Mas não conseguia.
– Tiveste, Consuela?
– Tive, mas não muitos.
– Dormiste regularmente com homens?
– Não. Numa base regular, não.
– Como era o teu emprego? Não houve ninguém no teu emprego que se apaixonasse por ti?
– Apaixonavam-se todos.
– Eu compreendo isso. Mas, e depois? Eram todos homossexuais? Não conheceste homens heterossexuais?
– Conheço, conheci, mas não prestavam.
– Não prestavam porquê?
– Masturbam-se apenas no meu corpo.
Philip Roth, O Animal Moribundo.
Edição D. Quixote, tradução de Fernanda Pinto Rodrigues.
Este amor, este amor mortal, foram eles que o criaram, algo que nós não planeámos, previmos ou sancionámos. Como é que não haveria de nos fascinar? Demos-lhes aquela irresistível compulsão no baixo-ventre – Eros e Ananké trabalhando de mãos dadas –, só para que eles superassem a sua repulsa pela carne do outro e se unissem de bom grado, mais do que de bom grado, no acto de procriação, já que, uma vez que os criámos, detestámos a ideia de os deixar perecer, sendo eles, no fim de contas, a nossa obra, para o bem e para o mal, ou, como é muitas vezes o caso, para o mal. Mas, olhem!, vejam o que eles fizeram desta trapalhada do esfreganço. É como se alguém tivesse dado a uma criança birrenta umas quantas aparas de madeira e um balde de lama para ela ficar sossegada e, de imediato, ela tivesse erguido uma catedral, com direito a baptistério, campanário, cata-vento e tudo. No recinto desta consagrada casa, oferecem-se uns aos outros refúgio, desculpam uns aos outros as suas falhas, suores e cheiros, as suas mentiras e subterfúgios e, acima de tudo, a sua inextirpável auto-obsessão. É isto que nos desconcerta, a maneira como fugiram ao nosso controlo e, de alguma maneira, se tornaram livres de se perdoar uns aos outros por tudo aquilo que não são.
E do princípio ao fim, a coisa não passa de uma fantasia auto-induzida. O que o meu pai, ansiando pela amor delas, não vê e não admite que lhe digam é que aquilo que o amor ama é precisamente a representação, pois a representação é a única coisa que o amor conhece. Ou nem sequer tanto. Mostrem-me um par em pleno acto e eu mostro-vos dois espelhos, rosados, lisonjeiramente distorcidos, presos num abraço de incompreensão mútua. Eles amam para poderem ver o seus eus em piruetas maravilhosamente reflectidos nos olhos do amado. É a imortalidade que buscam – sim, aquilo de que gostaríamos de nos livrar, eles almejam, ou pelo menos, desejam a ilusão de imortalidade, a sensação de viver para sempre num instante de paixão. Donde as suas cerimónias de entrega e voracidade. Ágape?... Sim, nesse festim eles comem-se uns aos outros, devorando-se mutuamente. E isso, isso é o que grande Zeus cobiça, os seus pequeninos arroubos manufacturados dos quais ele se vê excluído.
John Banville, Os Infinitos.
Edição Asa, tradução de Tânia Ganho.
«Não o devemos fazer às claras, é o que tu estás a dizer. Mas isso é porque ainda continuas a ser o mesmo romântico que, provavelmente, eras aos vinte anos. O sexo já deixou de ser uma coisa assim tão secreta. O sexo foi desvendado. Sabes o que o sexo significa para a maioria das pessoas?»
Baixou a mão e pousou-a sobre a minha, e moveu a pélvis ligeiramente, roçando-se contra a minha palma.
«O sexo é aquilo a que temos acesso. Para algumas pessoas, para a maioria, é a coisa mais importante a que têm acesso sem terem nascido ricas nem inteligentes, e sem precisarem de roubar. Eis uma coisa que a vida nos pode oferecer e que é igual ou até melhor ao que os outros possuem, e que não temos de andar seis anos na universidade para alcançarmos. E não é uma religião nem é uma ciência, mas podemos explorá-lo e aprender coisas novas acerca de nós mesmos.»
Don DeLillo, Submundo.
Edição Sextante, tradução de Paulo Faria.
Em poucos anos, o acto sexual transferiu-se das densas florestas tropicais para os desertos mais desprovidos de vegetação existentes no planeta.
Esta imagem desaparecerá dentro de quinze segundos. Catorze. Treze. Doze...
Diz que vai abrir uma sex shop oriental. Ou melhor, com produtos orientais. Mas não apenas chineses, que isso podia transmitir a ideia de material barato e sem qualidade. Explica que ainda existe muito mistério, muita construção de fantasias, em torno dos orientais – e especialmente das orientais. «Um vibrador com um nome que pareça oriental – flor de lótus, ou shinkansen, por exemplo – adquire logo uma aura especial.» E depois haverá roupa interior e objectos estranhos e cremes que até podem nada ter a ver com sexo («Estou convencido de que podia vender Atrix enfiado num tubo com a designação 'Sushi Pleasure Enhancer' sem dificuldades, pá. Está tudo na cabeça e os clientes iam achar que aquilo dava resultado. E mal não lhes fazia: deixava-lhes a pele mais suave.») mas que poderão ser vendidos por preços exorbitantes («A Chanel vende água perfumada a quinhentos euros o litro e nem é suposto ajudar nas erecções...») se as pessoas desconfiarem que sim. Planeia comercializar peluches eróticos («Serão fantásticos para festas de despedida de solteiro e tretas similares»), e convida quem o ouve a imaginar o divertido que será colocar um macaco japonês a ter relações sexuais com um panda chinês. Promete quimonos de cabedal, com incrustações metálicas, orifícios e fechos (não há trejeito de horror que o faça hesitar). Diz que disponibilizará objectos hi-tech, com chips, luzinhas, músicas (orientais, sempre orientais) que arrancarão nos momentos certos, câmaras microscópicas e ligação wi-fi para download imediato de imagens e vídeos para o Facebook. («Tudo made in Japan ou Korea ou, vá lá, Taiwan, mas nada made in China, que o rótulo faz diferença no preço que se pode cobrar.») Gosta de imaginar os clientes tentando descobrir como usar um vibrador vendido com o rótulo vibrador transversal. («'Transversal' por causa do que se costumava dizer do sexo das orientais, estás a ver? Mas claro que o vibrador vai igual aos outros; àqueles mais sofisticados, bem entendido.» E se lhe perguntarem como é que se usa? Sorri. «Fácil. Digo-lhes: experimente da forma em que está a pensar e depois vá inovando. Do que as pessoas precisam é de pensar que são ousadas, que estão a chegar mais longe do que o parceiro do lado... ou pelo menos tão longe quanto ele. Sabes o que se diz: o cérebro é o verdadeiro órgão sexual.») Quer instalar a loja num centro comercial («Reparaste que em nenhum dos principais há sex shops?») e já tem nome para ela. Gosta de o dizer depressa e em voz alta porque, garante, se obtém um efeito tipicamente oriental. «Vou chamar-lhe 'Glande e Clitóris', pá. Não é de génio?». Anda entretido a pensar no logótipo: não sabe se é melhor arranjar um símbolo oriental sugestivo, se colocar apenas um ponto de exclamação («com duas pintinhas em vez de uma, assim lado a lado, o que é que achas?») a seguir ao nome.
Dois braços e duas mãos;
Duas pernas e dois pés;
Dois olhos;
Duas orelhas;
Duas narinas;
Duas mamas;
Duas nádegas;
Uma boca;
Um pénis ou uma vagina.
Boca e sexo causam-nos os maiores problemas. E cedo começam à procura de par.
Este blogue tem apenas quatro meses e uns dias. Olhando para a coluna das tags verifico que, antes de este post ser publicado, há já vinte e um com a tag “Sócrates” mas apenas sete com a tag “mulheres” e onze com a tag “sexo”. Há qualquer coisa tremendamente errada comigo.
Uma voltinha pelo Museu do Louvre permite rapidamente constatar três coisas: a Vénus de Milo, que tem cara de rapaz, parece cansada e só não afasta as pessoas que se acumulam à sua frente por falta de braços; a instalação/performance na sala da Mona Lisa, em que uma multidão tira fotos ao (e em frente ao) enigmático (e cansado e resignado) sorriso, fazendo questão de ignorar ostensivamente todos os restantes quadros na sala (um apontamento de arte contemporânea pelo qual Serralves trocaria de bom grado todas as obras envolvendo garrafas ou pedaços de madeira que já teve em exibição), funciona bem; as estátuas clássicas gregas têm pénis pequenos. Os dois primeiros pontos são específicos do Louvre, o terceiro não, e, por incrível que possa parecer, muita gente já reparou nele. Procurei explicações na net. Como seria de esperar, encontrei para todos os gostos. Há quem diga que era para não chocar o espectador; há quem assegure que era para os homens não se sentirem como hoje em dia alguns se sentem ao verem as monumentais obras de arte exibidas em certos canais codificados de televisão; há quem avente a possibilidade dos modelos estarem com frio enquanto posavam, uma vez que não existiam sistemas eficazes de aquecimento; há quem sugira que, sendo os gregos à época um bocado gays, pénis pequenos eram menos assustadores para neófitos (parece-me bem que é não conhecer os gays...). A explicação que me pareceu mais fundamentada defende que os gregos tinham um ideal de beleza masculina em que pénis demasiado grandes (tal como pénis circuncidados) não se enquadravam. Gostavam de corpos atléticos, com torsos e pernas musculados, não perturbados por excrescências volumosas. Não tinham qualquer problema em relação à nudez e o facto de aceitarem ser reproduzidos com pequenas partes pendentes pode até ser visto como um sinal de maturidade intelectual: no fim de contas, a Grécia ou, mais precisamente, a Atenas Clássica é a primeira sociedade onde a cultura não só é apreciada como estimulada. Tanto que, depois de espreitar os tais canais codificados ou de ver algumas páginas de publicidade a boxers, sou forçado a pensar que regredimos. A tendência actual, na representação ou sugestão do órgão sexual masculino como noutras áreas, é para privilegiar o tamanho, ainda que em detrimento da qualidade: já me queixei antes da popularidade das gigantescas mamas de silicone mas também estão na moda estaturas elevadas, olhos gigantes e lábios grossos. Mas há mais: as mulheres preferem homens com mãos grandes e, desde a eleição de Obama, até orelhas-de-abano parecem estar in (circulam rumores de que José Rodrigues dos Santos não tem já qualquer dúvida de que é um símbolo sexual). Mesmo os automóveis (a tradicional extensão do pénis) têm vindo a ficar maiores: comparem um Clio da primeira geração com um actual ou, mais flagrante ainda, um Mini clássico com um dos que a BMW agora produz. Regredimos também noutra área: enquanto a nudez era vista de modo natural na Grécia de há dois mil e quinhentos anos, é encarada com reservas por muita gente hoje em dia, um pouco por todo o mundo. Independentemente do tamanho dos pénis.
Desconheço o que pensam os gregos actuais da representação do pénis nas suas estátuas. Não sei se sentem algum embaraço e se têm constantemente que provar que os seus antepassados exageravam. Seja como for, de nós, portugueses, os gregos não devem temer bocas foleiras. Depois da selecção grega nos ter derrotado duas vezes no europeu de futebol de 2004, a última das quais na final, nós sabemos que eles podem não ter pénis grandes mas: a) têm certamente tomates; e b) a expressão "o tamanho não interessa" deve estar certa porque nos doeu a valer.
(Fotos tiradas no Louvre e no Jardim das Tulherias em Maio de 2009.)
Esta notícia do i sobre o "I Salão Erótico Medieval" que parece estar a decorrer desde hoje em Vila Nova de Gaia levanta (é uma forma de expressão) tantas questões que nem sei por onde começar.
Pelo conceito, talvez. "Na época medieval existia uma forte componente erótica", assegura o organizador. “As senhoras da nobreza demoravam quatro horas para se vestir e precisavam da ajuda de aias para colocar os corpetes para evidenciar os seios.” Está-se sempre a aprender. O tempo que as mulheres levam a arranjar-se, que para uns é um pesadelo, para outros é uma fonte de erotismo. Mas será que os organizadores esperam enchentes desejosas de ver mulheres vestindo-se? Nos filmes (a minha única fonte de informação sobre o assunto) os shows eróticos têm normalmente mulheres despindo-se. Lutas na lama protagonizadas por bailarinas exóticas, saltimbancos que recriam contos eróticos e striptease a cavalo são alguns dos espectáculos a que vai ser possível assistir. Ah, OK, assim já faz– striptease a cavalo?!
Não consigo imaginar a coisa sem quedas potencialmente perigosas. Enfim, há ainda a acrobata erótica Sónia Baby, uma outra estrela chamada Lesly Kiss, um museu de tortura medieval (hmmm, as possibilidades da roda, ainda por cima com uma acrobata por perto), lutas de varapaus (penso que não é uma forma de expressão) e cuspidores de fogo. Tudo isto decorre onde? No Cais de Gaia? Na praça em frente ao El Corte Inglés? Não. No parque de estacionamento do restaurante erótico The Lingerie. O guia Michelin tem tantas falhas...
Sejamos honestos: mesquinhas considerações puritanas à parte, são de louvar iniciativas que, nesta época de crise, tentam levantar (é uma forma de expressão) a moral às pessoas. É também de louvar o esforço dos organizadores para atrair o público feminino, através de redução de preços e da garantia, dada pelo organizador, que "Portugal tem os melhores strippers masculinos da Europa". E ainda dizemos mal do país. Se calhar, para além de artistas da bola, podíamos exportar... outro género de artistas. Já agora, como é que isso é avaliado e quem avalia? “Participamos regularmente em campeonatos de strip dance e somos bons, realmente." Ah.
Como nota final, é da mais elementar justiça salientar a vitalidade cultural de Gaia sob a presidência de Luís Filipe Menezes, por oposição ao imobilismo do Porto. Engole esta (é uma forma de expressão), Rui Rio.
P.S.: a foto que o i escolheu para ilustrar a notícia também é fantástica. É tão artsy que podia estar pendurada nas paredes alvas de Serralves. Nada tem de medieval ou de particularmente badalhoco – e admitam: uma notícia como esta merecia imagens badalhocas.
Descobri hoje que, em termos de visitantes, ser recomendado pelo PPM é quase tão bom como escrever posts com a tag "sexo".
Na sequência do post anterior e porque o meu cérebro tem a irritante mania de fazer associações que apenas ele entende, não resisto a deixar aqui uma versão de "Good Ship Venus", provavelmente o mais desbocado tema de piratas alguma vez composto. É cantada por Loudon Wainwright III e pode ser encontrado em Rogue’s Gallery, uma excelente compilação de canções de piratas cantadas por gente como Bono, Nick Cave, Sting, Bryan Ferry e Lou Reed, e produzida por Johnny Depp (o capitão Jack Sparrow) e Gore Verbinski (o realizador da série de filmes Piratas das Caraíbas). Acompanhem a letra com atenção mas não junto a crianças que percebam inglês. Quando a música terminar, por volta dos 3’13’’, podem ir fazer outra coisa porque não acontece mais nada.
Nove pontos! O meu cérebro é masculino por muito, muito pouco. Pelo menos estão explicados alguns pensamentos estranhos e uma ou outra atitude incompreensível.
Façam o teste (o link é para o i, que foi onde vi a notícia; depois vos reenviarão para o outro lado do Atlântico).
Maria João Bastos tem sido uma presença recorrente neste blogue (ver aqui e aqui). Não sei bem por que isso acontece. Eu aprecio-a bastante (aqueles olhos...) mas há muitas outras actrizes que também me são simpáticas. (Não sei se "simpáticas" é o termo mais correcto mas enfim...fica.) Seja lá pelo que for, tenho que a mencionar novamente. Maria João deu esta entrevista ao jornal 'i'. Diz – está logo no título – "As cenas de sexo são difíceis, tenho de pensar que não sou eu". Minha cara Maria João, considere-se sortuda. Muitas pessoas – mulheres e homens – acham as cenas de sexo difíceis por terem que pensar que o parceiro é outro.
O governo decidiu aumentar a comparticipação nos medicamentos para a infertilidade. De acordo com o Sapo Saúde:
Como tem sido abundantemente noticiado, o grupo Auchan recusa (mais uma vez) vender o livro A Casa dos Budas Ditosos, de João Ubaldo Ribeiro, por considerá-lo pornográfico (link para o blog da editora com pormenores e comentário do escritor). A Ana e o Manuel Jorge já escreveram tudo o que merecia ser escrito. Eu deixo apenas um comentário absolutamente paralelo: o que lhes vale a todos (autor incluído) é que os Budistas são pacíficos...
Há muitíssimo mais homens que mulheres a ver desporto. Por isso, são os homens que definem as audiências. Os portugueses, como muitos europeus, são loucos por futebol. Mas só quando são gajos a correr atrás da bola. Ninguém liga ao futebol feminino. O basquete, o andebol, o vólei, o hóquei e todas as restantes modalidades ditas amadoras recebem pouca atenção – mas pior se forem mulheres a jogar. Nem sei se algumas destas modalidades têm campeonatos femininos. A avaliar pela inexistência de notícias nas televisões, provavelmente não. Pelos vistos não há público interessado em ver raparigas fazendo afundanços ou deslizando sobre patins com tacos na mão. No automobilismo e noutros desportos em que a competição é mista entende-se que, por razões de força física, não apareçam muitas mulheres (mas há Danica Patrick) e torna-se difícil saber se os homens continuariam a assistir a corridas de Fórmula 1 se o pelotão tivesse mais mulheres que homens. Os desportos tipicamente americanos são domínio masculino mais uma vez. (Devo confessar que imaginar as mulheres que praticariam futebol americano me assusta). No ténis, na natação, no atletismo e nos desportos de Inverno a situação é mais equilibrada. Mesmo assim, as mulheres tendem a atrair menos espectadores.
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