como sobreviver submerso.

Domingo, 7 de Junho de 2009
Federer

No futebol é mais fácil. É, aliás, fácil demais. O frenesi mediático e a histeria dos adeptos garante a muitos futebolistas a condição de heróis muito antes de terem conseguido algo de verdadeiramente excepcional. Noutros desportos, com escrutínio menos público mas mais exigente, as coisas são diferentes. É também mais difícil para um desportista que não jogue futebol transcender o universo dos que apreciam o desporto que pratica e tornar-se um ícone global. Roger Federer conseguiu-o há anos. Mas, para muitos apreciadores de ténis, faltava-lhe vencer Roland Garros. Já não falta.
 
A forma como Federer jogou nesta quinzena foi fantástica, mesmo – ou especialmente – quando não jogou bem. Em nenhum momento isso terá sido tão evidente como na sexta-feira, na meia-final contra Juan Martin Del Potro. Del Potro (um futuro campeão) foi mais forte durante cerca de três sets. Ganhou o primeiro e o terceiro, perdeu o segundo no tie break. Ao longo destes três sets Federer pareceu quase subjugado, falhando muito e, mesmo quando não falhava, com um jogo inócuo para o argentino. Mas foi fazendo algo que se revelou crucial: obrigou Del Potro a correr. Fê-lo correr de um lado para o outro e, acima de tudo, fê-lo correr para a frente e para trás, com bolas longas, bolas curtas e drop shots. No quarto set Del Potro começou a ceder. Começou a ser mais lento, a colocar menos primeiros serviços, a falhar mais. E Federer venceu. Hoje, na final, não deu hipóteses a Robin Soderling, que actuara em estado de graça frente a Nadal, Ferrer ou Gonzalez. Tremeu um pouco no final do encontro mas dominou sempre. Em grande medida, isso sucedeu porque o estilo de jogo de Soderling “encaixa” melhor no seu que o de outros jogadores. E também porque os factores psicológicos que intervêm quando defronta Nadal – mesmo que Federer os negue – não tinham razão de ser. Mas não foi apenas isso. Numa prova de inteligência, Federer ajustou alguns pormenores do seu jogo. Passou a usar mais o drop shot (já o fizera há três semanas em Madrid, onde venceu Nadal na final). Procurou os seus próprios pontos fortes e não se deixar cair no estilo de jogo do adversário (ele que chegou a ser conhecido por gostar de derrotar os adversários jogando no estilo deles). E, acima de tudo, nos momentos em que as coisas não lhe corriam bem, foi inteligente – e suficientemente humilde – para aguentar estoicamente, cansar o adversário e desferir o ataque no momento certo (fê-lo contra Del Potro mas, dias antes, havia-o feito contra Tommy Haas). Todos os grandes desportistas têm que possuir boas capacidades técnicas. As lendas vão um pouco mais longe porque sabem que por vezes é aí que conseguem a diferença, em especial quando já não estão no máximo da forma física.
 

Teria sido interessante vê-lo defrontar Nadal. Creio que poderia ter ganho. Mas, nunca fiando (os tais factores psicológicos...), foi melhor assim. Porque esta vitória é uma coroação merecida e é também fundamental para garantir grandes espectáculos nos próximos tempos.

 

(Como de costume, a foto é do Estoril Open do ano passado.)



publicado por José António Abreu às 18:11
link do post | comentar | favorito

Sexta-feira, 29 de Maio de 2009
Michelle Brito e a eliminação em Roland Garros.

Michelle Brito foi eliminada na terceira ronda de Roland Garros. O encontro foi interessante. Michelle é muito nova. É também imatura mas tem garra. Como outros "produtos" da academia Bolletieri tem um jogo pouco imaginativo: pancadas de chapa, tão fortes quanto possível, direccionadas às linhas. Como Sharapova (a mais famosa aluna da academia) guincha imenso ao bater na bola. E isto foi um problema em Paris. Diga-se já que as queixas da adversária de hoje, Aravane Rezai, a jogar em casa, pareceram mais um estratagema pré-preparado, aproveitando alguma polémica anterior, que verdadeiro incómodo. Ou melhor: se havia incómodo, este era por estar a sentir tantas dificuldades durante o primeiro set. Tanto assim que, no segundo, mais à vontade, os berros de Michelle já não pareceram incomodá-la. Na edição de Wimbledon de (creio) 2007, Elena Dementieva foi eliminada por Maria Sharapova. Após o encontro perguntaram-lhe se os gritos de Sharapova não a haviam incomodado. Dementieva respondeu que, de facto, às vezes eram algo exagerados mas que não diria nada quando estava a perder (porque não eram os gritos que faziam com que estivesse a perder e porque daria a ideia de não conseguir encaixar a superioridade da adversária). Alguém devia ler as declarações de Dementieva a Rezai. Por outro lado, teria Rezai protestado tanto se do outro lado da rede tivesse Sharapova ou Serena Williams? Claro que não. O facto de Michelle ser nova, ainda mal conhecida, e ter talvez uma atitude pouco humilde (dependendo do ponto de vista, como na Sharapova de 2004, também se pode apelidar de garra), facilitaram-lhe a vida. O público no estádio e alguns comentadores (na TV e na net) parecem não ter gostado do cumprimento frio que Michelle deu a Rezai no final do encontro. Se apreciam actos hipócritas, critiquem à vontade. Mas depois do que Rezai fez ao longo do primeiro set, seria pura hipocrisia estender-lhe a mão com um sorriso.

 

Mais importante é o futuro. Michelle não tem um tipo de jogo que eu aprecie. Precisa de crescer (física e mentalmente). Mas vai entrar no Top 100 aos dezasseis anos (feitos em Janeiro). Chegou à terceira ronda de Roland Garros com um estilo de jogo que parece mais adequado a pisos rápidos. Tem garra. Não vale a pena embandeirar já em arco (como tantas vezes se faz em Portugal) mas é o tenista (masculino ou feminino) com maiores probabilidades de vir a atingir os lugares de topo nos rankings do ténis. Dê-se-lhe tempo. E se não vier a conseguir tanto quanto se espera, evitem-se as crucificações e os "eu sempre disse que ela era um bluff". Ao contrário de muitos de nós, a miúda tenta.

 

 

(As fotos são do Estoril Open do ano passado.)



publicado por José António Abreu às 15:46
link do post | comentar | ver comentários (2) | favorito

dentro do escafandro.
pesquisar
 
Janeiro 2019
Dom
Seg
Ter
Qua
Qui
Sex
Sab

1
2
3
4
5

6
7
8
9
10
11
12

13
14
15
16
18
19

20
21
22
23
24
25
26

27
28
29
30
31


à tona

Federer

Michelle Brito e a elimin...

reservas de oxigénio
tags

actualidade

antónio costa

blogues

cães e gatos

cinema

crise

das formas e cores

desporto

diário semifictício

divagações

douro

economia

eleições

empresas

europa

ficção

fotografia

fotos

governo

grécia

homens

humor

imagens pelas ruas

literatura

livros

metafísica do ciberespaço

mulheres

música

música recente

notícias

paisagens bucólicas

política

porto

portugal

ps

sócrates

televisão

viagens

vida

vídeos

todas as tags

favoritos

(2) Personagens de Romanc...

O avençado mental

Uma cripta em Praga

Escada rolante, elevador,...

Bisontes

Furgoneta

Trovoadas

A minha paixão por uma se...

Amor e malas de senhora

O orgasmo lírico

condutas submersas
subscrever feeds