Jamor, 2008.
Roger Federer vs. Sam Querrey, esta semana, na segunda ronda de Wimbledon.
* Mas as vitórias de Renshaw foram na década de oitenta do século dezanove, altura em que o vencedor de um ano tinha entrada automática para a final do ano seguinte; só em 1922 todos os participantes começaram a ter de passar pelo quadro geral.
Adenda (Segunda-Feira, dia 9, 8:45h)
1. Ontem fazia tenções de o referir e depois esqueci-me: este foi o torneio dos atletas com trinta anos, uma vez que Serena Williams, também com essa idade, venceu no quadro feminino.
Caro Roger,
Sei que és um tipo inteligente, capaz de pensar pela própria cabeça. Sei que estás farto de receber conselhos de fãs, todos super hiper mega convencidos de terem a solução que te permitirá voltar a dominar o circuito mundial de ténis. Sei que provavelmente tudo o que vou escrever já te foi dito por várias pessoas ao longo dos anos, talvez até por alguns dos teus treinadores (e daí pode ser que não, porque as pessoas que estão próximas de nós e têm interesses em jogo nem sempre nos dizem toda a verdade). Seja como for, não resisto, até por saber que não falas português e que raramente alguém acede a este blogue a partir de um computador na Suiça.
Comecemos por um facto que podes achar desagradável mas que para muita gente, eu incluído, não o seria assim tanto: tens quase trinta anos. Fisicamente, pareces bem: continuas ágil, veloz, resistente. Mas tens quase trinta anos, mais meia dúzia do que o Rafa ou do que o Nole. É por isso natural que estejas a chegar às bolas difíceis umas centésimas de segundo mais tarde do que era costume. Muitas vezes, tu nem te apercebes. Nós, no court e na televisão, também não. Mas se calhar estás mesmo. E repara que, enquanto há quatro ou cinco anos te encontravas no pico da forma, o Rafa e o Nole ainda estavam a melhorar. O Juan Martin, então, devia andar de calções a brincar nas ruas de Tandil, na Argentina. Eles tornaram-se fisicamente mais fortes; tu, quando muito, mantiveste a forma. Quando te vejo dar madeiradas, disparar a bola contra o topo da rede ou fazê-la cair uns centímetros do lado errado das linhas, não consigo deixar de pensar que as tuas intenções continuam boas mas o teu corpo está um tudo-nada atrasado.
Sejamos honestos: há pouco que possas fazer quanto a isto. Nem todo o teu dinheiro te vai permitir rejuvenescer. Mas há pelo menos uma coisa que podias tentar: Roger, pá, muda de raquete. Eu sei que gostas da tua Wilson Six.One Tour – é a tua imagem de marca, um modelo clássico, com a sua frame estreita e angulosa e a sua cabeça de noventa polegadas quadradas, que evoca campeões de outras eras e que é, sem dúvida, uma excelente raquete. Mas o Rafa usa uma raquete de cem polegadas quadradas. O Nole usa uma raquete de noventa e cinco polegadas quadradas. O Juan Martin usa uma raquete de noventa e seis polegadas quadradas. Toda a gente usa raquetes maiores do que a tua. Eu sei, eu sei, não é do tamanho, é da forma como se usa. Tu dizes que estás habituado. Que tens mais controlo assim. Talvez seja verdade mas isso de pouco te vale se chegas atrasado (bastam fracções de segundo, Roger) e não consegues acertar na bola com o centro da encordoação. Antes de qualquer outro factor, o controlo parte desta premissa básica, Roger: é preciso acertar bem na bola. Repara como o número dos teus erros parece ter vindo a aumentar nos últimos anos (não, não tenho estatísticas mas podes sempre colocar alguém munido de esferográfica e bloco-notas a rever gravações de encontros durante uns dias e logo tiras as dúvidas). Falhas por pouco, por muito pouco – mas falhas. Uma raquete maior – uma Wilson Six.One 95, não precisas de mudar de marca, como é óbvio – talvez te permitisse manter mais bolas em jogo. Fazer mais winners. Ganhar confiança.
E isto traz-nos ao assunto mais delicado. Confiança. Tu dizes que não tens problemas psicológicos em enfrentar o Rafa. Está bem, Roger. Mas deixa-me contar-te o que vi há menos de duas semanas, na meia-final do torneio de Miami. Entraste cheio de garra e ele também. As primeiras trocas de bola deixaram-me a sorrir. Vamos ter fogo-de-artifício, pensei. Mas depois falhaste um par de vezes e a partir daí ele fez o que quis de ti. Tu sabias o que tinhas de fazer, tentaste fazê-lo – mas nada te saiu bem. Roger: quando defrontas o Rafa, ou as coisas te saem bem desde o início ou és assaltado por dúvidas. É verdade que com outros adversários também gostas de entrar a fundo, deixando imediatamente clara a tua superioridade. Mas com os outros, mesmo quando as coisas começam por te correr mal, consegues quase sempre dar a volta à situação. Com o Rafa, não. Porque, lá no fundo, sentes que não és melhor do que ele (mas és, Roger). E então perdes a concentração. Entras em parafuso. (É uma expressão portuguesa; pergunta aí a um dos teus empregados domésticos o que significa*). E ele sabe-o. Massacra-te a esquerda com aquele top spin absurdo, empurra-te para trás e faz-te falhar porque a certa altura tu percebes que tens de atacar ou perdes o ponto mas não estás em posição de disparar um winner, ainda por cima quando do outro lado está um filho da mãe tão rápido quanto o Nadal. Eu não sou psicólogo, Roger, e até desconfio deles, pelo que não me vou pôr a dar-te conselhos sobre o que deves ou não fazer para ultrapassares este problemita (na minha simplicidade, eu tiraria para aí três meses de férias num paraíso qualquer). Mas talvez também aqui uma raquete com uma cabeça maior pudesse ajudar. Permitir-te-ia reduzir as chances de, quando forçado a atacar em posição difícil, dares uma madeirada ou colocares a bola do lado errado das linhas apenas o suficiente para me fazeres entrar em parafuso a mim.
E é só isto, Roger. Por favor, acredita nas minhas intenções. Acredita no que te diz alguém que quer continuar a ver-te nos courts e a ganhar torneios ainda durante vários anos e que, embora possas pensar o contrário, sabe do que fala. É verdade que nunca joguei muito e que já não jogo há anos. Mas com uma raquete de 85, 90, 95, 100 ou 110 polegadas quadradas, Roger, poucas pessoas eram tão boas a dar madeiradas como eu.
Um abraço do teu fã,
jaa
P.S.: Tirei a foto lá de cima no Estoril Open de 2008, Roger. Eu era o tipo com o boné verde três lugares ao lado da exuberante senhora suiça.
* Ah, espera, esta semana estás em Monte Carlo, não é? Pergunta ao teu valet de chambre no hotel. Se ele não souber, há-de arranjar alguém que lhe explique.
Compre um bilhete para o penúltimo dia do Estoril Open, esperando ver as duas meias finais masculinas e a final feminina. Chegue ao Jamor pouco depois do meio dia sob chuva persistente. Constate que nenhum encontro se iniciou e aguarde um par de horas. Não havendo alterações nas condições climatéricas, vá deixar a mala no hotel onde pernoitará e, cerca das quatro das tarde, sempre debaixo de chuva, opte por almoçar. Às cinco e qualquer coisa aperceba-se de que a chuva parou e encaminhe-se novamente para o Jamor. Fique bloqueado no trânsito da Segunda Circular, junto ao Estádio de... da... junto ao Colombo. Fuja logo que possa e siga em direcção a Alcântara. Chegue ao Jamor por volta das seis e corra até ao Court Central. Constate que Federer perdeu o primeiro set e encontra-se já a meio do segundo. Veja-o perder em cerca de meia hora. Junte-se à multidão que sai do Central em direcção ao Centralito, onde Frederico Gil disputa a outra meia final. Renda-se à evidência de que nem o irmão mais magro da Kate Moss, nu e untado em manteiga da cabeça aos pés, conseguiria entrar no court. Aperceba-se de que a final feminina também está a decorrer, num Court 1 com meia dúzia de gatos pingados (não literalmente, porque, relembre-se, parou de chover) a assistir. Sente-se e aprecie dois minutos de ténis, que é mais ou menos o tempo que demoram os cinco pontos que compõem o último jogo do encontro. Bata palmas à vencedora e à vencida e, verificando que continua a ser impossível entrar no Centralito, vá-se embora outra vez, dando o dia tenístico por concluído. Reze para que no Domingo (se também tiver bilhete para esse dia) consiga melhor rendimento dos 60 euros que lhe custou o ingresso.
(De momento não chove, mas...)
(Go, Gil.)
Muita gente o disse e escreveu. Um estilo de jogo como o de Rafael Nadal provoca elevado desgaste físico. O corpo humano - mesmo um corpo tão bem preparado como o de Nadal - tem limites. Há um par de anos começaram a surgir notícias de problemas nos joelhos. Neste preciso momento, Nadal não está em Wimbledon tentando defender o título conquistado no ano passado numa das melhores finais da história do ténis por causa deles. O i avança agora que ele pode ter que deixar de jogar dentro de pouco tempo. Os seus joelhos apresentarão o desgaste dos de um tenista de 33 anos (fez 23 no início deste mês). Para um fã de ténis (mesmo um que, como eu, aprecie o estilo leve e elegante de Federer acima do de todos os outros jogadores), a notícia é triste. A rivalidade entre Federer e Nadal foi o sal do ténis nos últimos quatro anos. Ainda por cima, os dois respeitam-se de uma forma rara no desporto. No ano passado, depois de bater Federer na final de Roland Garros pelo terceiro ano consecutivo, para mais com um resultado humilhante para o suiço, Nadal pediu-lhe desculpa no discurso final. Depois de perder a final do Open da Austrália deste ano, Federer interrompeu o discurso em lágrimas. Mas pegou de novo no microfone antes de Nadal falar porque "this guy deserves to have the last word". Num fim-de-semana em que, por cá, ocorreram agressões entre espectadores de uma final de um campeonato júnior de futebol, é significativo que quase todos os fãs de um dos dois maiores tenistas da actualidade apreciam e respeitam o outro. E é também por isso que espero que a realidade não seja tão grave quanto a notícia do i deixa antever. Independentemente das maiores dificuldades que a presença de Nadal possa trazer a Federer, eu quero-o nos torneios. Quero continuar a agonizar entre os desejos contraditórios de que ele perca antes de defrontar Federer e de ter mais uma final entre ambos.
Teria sido interessante vê-lo defrontar Nadal. Creio que poderia ter ganho. Mas, nunca fiando (os tais factores psicológicos...), foi melhor assim. Porque esta vitória é uma coroação merecida e é também fundamental para garantir grandes espectáculos nos próximos tempos.
(Como de costume, a foto é do Estoril Open do ano passado.)
Em semana de Estoril Open, um Federer diferente.
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