Um das formas de verificar que uma relação, de amor mas também de amizade, ainda está viva: ter imediatamente vontade, ao ser informado de algo divertido, inesperado ou incongruente, de partilhar a informação com a pessoa em questão, mesmo sabendo que o assunto lhe interessa pouco. A desilusão: perceber que ainda temos vontade de lhe dizer mas que, mesmo sendo nós a fazê-lo, o assunto lhe interessa pouco. O princípio do fim: ainda pensar em dizer-lhe mas chegar à conclusão de que não vale a pena fazê-lo porque o assunto não lhe interessa.
Às vezes, quando vêem certos comportamentos em novelas televisivas, as pessoas dizem “mas olha que isto acontece na vida real” ou “há pessoas assim”. Houve uma altura em que eu achava que isso não era verdade. Porque as novelas são simplistas e as pessoas são complexas. Hoje penso que é muitas vezes verdade. Porque as pessoas, embora complexas, tendem a imitar a má ficção a que assistem.
(Por que é que de repente me lembrei de coisas como os Morangos com Açúcar e da Carolina Patrocínio?)
O metro de Paris pode ser dos mais completos do mundo (aparentemente, nenhum edifício da cidade se encontra a mais de 500 metros de uma estação) mas não é agradável. E, em mais de vinte anos (período em que não visitei Paris), não evoluiu. Muitas carruagens estão degradadas. A maioria das estações é feia e poucas têm acesso por escadas rolantes. O metro de Lisboa é melhor. O do Porto é muito melhor mas não é um verdadeiro metro (isto pode custar-me caro). Numa estação de Paris, em momento de acalmia no fluxo de passageiros, uma ratazana passeava calmamente sob uma cadeira de plástico. Um parente do Ratatouille?
Entraram na estação de Bir-Hakeim e saíram duas estações depois. Um casal e um miúdo. A mulher arrastava uma bicicleta infantil. A origem portuguesa era óbvia ainda antes de algum deles dizer uma palavra. A mulher, rechonchuda, com trinta e poucos anos, podia ter acabado de sair de uma aldeia de Trás-os-Montes. Da Trás-os-Montes dos anos sessenta. Quando falou, para o miúdo irrequieto e barulhento, a sensação foi reforçada. Tinha uma voz cantada, transmontana, estranha de ouvir em plena cidade-luz. Pensei em meter conversa. Mas, como muitas vezes nestas situações, fiquei na dúvida: há uma certa liberdade em falar uma língua que ninguém entende. Dizer “olá” pareceu-me quase uma intromissão. Um acto agressivo. Enquanto ponderava o assunto, o metro parou numa estação e eles saíram.
Em todo o lado, as pessoas nos transportes públicos e especialmente no metro onde não há sequer vista, adquirem uma melancolia peculiar. Como se a viagem fosse um momento de pausa em que tudo pode ser recontextualizado. Para o melhor e para o pior.
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