como sobreviver submerso.

Segunda-feira, 22 de Outubro de 2018
Momentos com significado

Consideremo-nos felizes ou infelizes, bonitos ou feios, inteligentes ou estúpidos, ou, como é mais habitual, tudo isto em momentos diferentes, a nossa vida parece quase sempre ter menos significado e ser mais incongruente do que a dos outros, em particular se não existir uma qualquer crença (na maioria das vezes religiosa) que simultaneamente a relativize e lhe dê sentido. Seja como for, o principal objectivo da vida de qualquer pessoa é torná-la real; conferir-lhe significado. Quase toda a gente o atinge apenas durante momentos dispersos - entre os quais o que precede a própria morte.


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publicado por José António Abreu às 00:03
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Sexta-feira, 11 de Novembro de 2016
Cohen, a paz antes da partida

 

In his chair, Cohen waved away any sense of what might follow death. That was beyond understanding and language: “I don’t ask for information that I probably wouldn’t be able to process even if it were granted to me.” Persistence, living to the last, loose ends, work—that was the thing. A song from four years ago, “Going Home,” made clear his sense of limits: “He will speak these words of wisdom / Like a sage, a man of vision / Though he knows he’s really nothing / But the brief elaboration of a tube.”

The new record opens with the title track, “You Want It Darker,” and in the chorus, the singer declares:

Hineni Hineni

I’m ready my Lord.

Hineni is Hebrew for “Here I am,” Abraham’s answer to the summons of God to sacrifice his son Isaac; the song is clearly an announcement of readiness, a man at the end preparing for his service and devotion. Cohen asked Gideon Zelermyer, the cantor at Shaar Hashomayim, the synagogue of his youth in Montreal, to sing the backing vocals. And yet the man sitting in his medical chair was anything but haunted or defeated.

“I know there’s a spiritual aspect to everybody’s life, whether they want to cop to it or not,” Cohen said. “It’s there, you can feel it in people—there’s some recognition that there is a reality that they cannot penetrate but which influences their mood and activity. So that’s operating. That activity at certain points of your day or night insists on a certain kind of response. Sometimes it’s just like: ‘You are losing too much weight, Leonard. You’re dying, but you don’t have to coöperate enthusiastically with the process.’ Force yourself to have a sandwich.

“What I mean to say is that you hear the Bat Kol.” The divine voice. “You hear this other deep reality singing to you all the time, and much of the time you can’t decipher it. Even when I was healthy, I was sensitive to the process. At this stage of the game, I hear it saying, ‘Leonard, just get on with the things you have to do.’ It’s very compassionate at this stage. More than at any time of my life, I no longer have that voice that says, ‘You’re fucking up.’ That’s a tremendous blessing, really.”

 

O final de um excelente perfil de Leonard Cohen, surgido na The New Yorker de 17 de Outubro. A juventude, Marianne, outras mulheres, Dylan, a enganadora simplicidade da música, os concertos ao vivo, as drogas, a transcendência, a ideia da morte. E, a propósito desta, faz-me uma certa impressão - fica sempre a ideia do vatícinio - ter referido há exactamente duas semanas que ele se declarara pronto para morrer.

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publicado por José António Abreu às 10:02
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Sexta-feira, 6 de Fevereiro de 2015
Instituições
Ele pedia a Deus que os ateus estivessem certos. Porque a existir uma vida para além da morte seria institucional porque alguém teria de a gerir e ele não conseguia passar por aquilo outra vez. E a única coisa pior seria a reencarnação e o regresso ao oceano de instituições humanas.

Norman Rush, Mortals. Edição Jonathan Cape. Tradução minha.


publicado por José António Abreu às 07:51
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Quinta-feira, 2 de Agosto de 2012
Gore Vidal
Com atraso (sem férias mas com inércia adequada a elas, a minha vida fica estranha nos meses quentes), uns quantos excertos, meio ao calhas, de Navegação Ponto por Ponto, de Gore Vidal (edição Casa das Letras, com tradução – não propriamente brilhante – de José Luís Luna):

 

Saul Bellow aparecia de vez em quando em Roma, normalmente sozinho. Teve cinco mulheres, mas como eram todas tão parecidas nunca memorizei os nomes.

 

Nesses tempos, os editores estavam quase tão perplexos como hoje quanto ao modo de atrair leitores numa época do cinema e da arrivista televisão. Resolvi-lhes o problema completamente por acaso. Como ainda me interessava por política, tinha continuado a ir à televisão sempre que possível para falar do estado do país, o que agradava a Carson e a poucos mais – muito poucos – convidados. Um deles era Hugh Downs, a discreta estrela do programa Today. Nesses tempos sem pressas, ele e eu sentávamo-nos a uma mesa com o New York Times entre os dois e conversávamos – muito moderadamente – acerca das notícias do dia, com intervalos para a publicidade, meteorologia e o noticiário. Quando a editora de Juliano, Little Brown, me pediu para ir à livraria dela, em Houston, promover o livro, disse que me parecia inútil mas que, se eles insistissem, iria. Deram-me uma data que tentei cancelar porque entrava em conflito com uma entrevista no programa Today de Hugh Downs. «Por que não fazer ambas as coisas?, perguntou o meu editor. «E dizer umas palavras acerca do livro no programa.» Expliquei-lhe que falávamos sobretudo de política. «Então faça uma excepção», disse-me. E foi o que fiz. Falei brevemente do livro enquanto Downs o segurava de braço estendido no ar como se fosse o Santo Graal. A seguir, saí do estúdio e apanhei o avião para Houston onde Ted Brown da livraria epónima me disse: «Não só esse programa de televisão vendeu todos os exemplares que tínhamos em stock como també, segundo parece, todos os exemplares que existiam em Houston. Tudo isso numa só manhã.» Juliano tornou-se rapidamente o sucesso literário número um da lista do Herald Tribune (o New York Times – sempre consistente – listou-o mais abaixo, mas, uns anos depois, puseram milagrosamente o meu Lincoln em segundo lugar durante dois anos, quando ocupava o primeiro na Publishers Weekly). De qualquer modo, o resto pertence à história da edição quando os editores empurraram os seus escritores para os programas de televisão, todos contentes por conseguirem tanta publicidade gratuitamente. Com o tempo, claro está, e embora os poderes inventivos dos romancistas fossem realmente extraordinários, os espectadores cansaram-se de vê-los a dizer que absolutamente tudo nos seus romances era absolutamente verdade e tinha-lhes realmente acontecido como descreviam. Capote até chegou a declarar ter inventado um romance não fictício (sic) acerca de um assassinato verdadeiro.

 

Vladimir Nabokov (o qual nunca encontrei) e eu gostamos de trocar insultos elaborados através da imprensa. Nabokov disse numa entrevista que a conversão de Graham Greene ao catolicismo lhe parecia completamente falsa, mas que sabia, através de fontes seguras, que eu tinha ido a Roma. Estas farpas, como Vera Nabokov lhes chamava, terminaram quando eu comentei numa entrevista ser bastante estranho que os dois maiores escritores russos tivessem ascendência africana. Antes de ele ter ter tempo para responder, a morte pôs termo a estas joviais trocas de palavras.

 

Em 1976, fui eleito para a Academia Norte-Americana de Artes e Letras, uma augusta assembleia à qual William James, mas não o irmão, Henry, recusou pertencer. Também recusei a minha eleição. Quando uma pessoa interessada me perguntou porquê, citei William James, que tinha dito que não gostava de muitas das inclusões assim como das exclusões. Como insistissem, acrescentei que «já fazia parte do Diner's Club». Isso foi citado aqui e ali e, embora os revisionistas da academia gostassem de dizer que eu não escrevera isso na minha carta de rejeição, disse-o realmente a um funcionário desta congregação de imortais americanos. Um quarto de século mais tarde, quando o nosso milénio se aproximava do fim, o presidente da academia (um primo devido a um casamento que deixou de ser meu primo devido a um subsequente divórcio e novo casamento em que fui substituído, nesse grau de parentesco, por Jackie Kennedy), esse velho amigo e estimado colega romancista-historiador, Loius Auchincloss, disse que tinha chegado a altura de eu me portar de forma responsável e de aceitar a antiga nomeação de boa vontade, pois, uma vez que se é eleito, é-se instalado para sempre, quer se queira quer não, no Parnasso. Fui, assim, devidamente instalado e, a seguir, foi servido um lauto jantar. Umas duas dúzias de académicos e os seus amigos, muitos dos quais não via há anos, encheram um enorme salão ao lado da sala de jantar com as suas cadeiras de rodas, o que me fez pensar nos carros eléctricos do parque de diversões Glen Echo, perto de Washington DC.

 

Li algures como era estranho o facto de eu me ter candidatado por duas vezes a um cargo público e nunca ter escrito acerca disso nem porquê. Bem, parte desse porquê, em 1960, foi porque Jack Kennedy se tinha casado com Jackie cuja mãe tinha tomado o lugar da minha como Sra. Hugh Dudley Auchincloss. Depois de a minha mãe e eu termos saído da casa de Auchincloss em Virgínia, a mãe e a irmã de Jackie mudaram-se para lá e o meu meio-irmão e a minha meia-irmã tornaram-se irmãos putativos de Jackie. Tantos divórcios e novos casamentos na nossa interligada família criaram numerosas ligações esquisitas bem como nenhumas ligações. Tenho quatro irmãos putativos, filhos do último marido da minha mãe, o general Olds: não só nunca os conheci como também não sei os seus nomes. Oh, que teia emaranhada é tecida quando as divorciadas concebem.

 

Num momento de distracção, aceitei ser presidente do júri do Festival de Cinema de Veneza. Evito habitualmente festivais, entrega de prémios e toda a espécie de burocracia que envolva até mesmo as artes. Não posso imaginar porque é que disse que sim. Disseram-me – avisaram-me! – que havia um júri feminista. Por que não?, pensei. Tinha participado, ou lançado, em dois torneios desse género, do lado das senhoras.

Na primeira votação, um filme realmente horrível realizado por uma dinamarquesa – Syrup (refiro-me ao filme e não à dinamarquesa) – ganhou o prémio atribuído ao melhor argumento.

 

Quando alguém me enviou uma grande lata de caviar, Howard decidiu fazer uma pequena festa só para nós, os Shaw e Greta Garbo. Ao último minuto, Irwin telefonou a perguntar se podia trazer a jornalista Martha Gellhorn. Sempre gostei do que ela escrevia e simpatizava com todas as mulheres que se tinham casado com Hemingway. A pequena festa correu lindamente. Garbo chegou cedo e vestiu imediatamente o blazer de Howard. Gostava de se vestir com roupa de homem e costumava referir-se a si mesmo em termos masculinos. «Onde é que é a casa de banho dos rapazinhos?» era uma das suas expressões favoritas. Foi Ina Claire, a delicada comediante da Broadway, que foi à casa de banho dos rapazinhos logo depois de Garbo sair de lá e, de facto, o assento da sanita estava levantado.

 

Assim que resolvi deixar de me interessar por obituários, o Papa e Saul Bellow morreram.

 

Nos últimos anos, raramente vi Saul. Julgo que a última vez que nos vimos foi quando ele veio visitar-me ao nosso apartamento do Largo Argentina, em Roma. Como ele gostava de Alberto Moravia (cujo nome próprio sempre pronunciava em três sílabas deliberadamente lentas: Al-Bare-Toe), levava-os a um restaurante gerido por uma ordem laica de belas freiras do Terceiro Mundo. Temia que os dois lúbricos velhos mestres cobiçassem estas núbeis cantoras de salmos, mas, afinal de contas, passámos uma noite bastante alegre. A dada altura, falámos da morte e de como esperávamos morrer. Saul mostrou-se muito positivo. «Apenas espero desgastar-me.» E foi o que aconteceu. Era um filósofo utilitário.

 

Quando agora me movo, graciosamente, espero, em direcção da porta marcada Saída, ocorre-me que a única coisa que eu gostava de fazer era ir ao cinema.

 

Boas sessões aí onde estiveres, Gore. Não sejas demasiado duro com Deus.

 

(Uma dúzia de tiradas famosas.)

 

Foto obtida aqui.


publicado por José António Abreu às 11:02
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Terça-feira, 24 de Abril de 2012
Enfrentar o desconhecido

A primeira vez no deserto foi uma epifania. Não me interpretem mal. Só o conhecia do cinema e dos livros e humildemente admito sempre o ter encarado com prudente relutância.

“O deserto é como o esqueleto do ser, frugal, rarificado, austero, absolutamente bom para nada.” (1)

Tinha apontado religiosamente esta frase no bloco de notas antes de mergulhar no inevitável. “Absolutamente bom para nada”, pois. Mas há sempre uma primeira vez e devo confessar que tive sorte, muita sorte. Não é por acaso que as associações entre as areias e os mares são recorrentes. No “mar” de areia, o oásis é uma “ilha” e foi por aí mesmo que comecei. Pelo fragmento de deserto que é o seu contrário, o que não foi feito pela mãe Natureza mas pelo esforço dos homens. Habituámo-nos, todos, a imaginar os oásis como pequenos lagos arredondados protegidos por palmeiras. Devem existir oásis assim, mas não conheço nenhum. O da minha primeira vez foi uma preguiça estendida ao longo de trezentos quilómetros, entre maciços montanhosos. Nem redondo nem palmar. Apenas deslumbrante. Permitam, então, que vos conte.

Partimos de Aden, no Sul do Iémen, em dois Toyotas. Rumámos na direcção do Oriente. A estrada comportava-se bem, seguindo paralela à costa, até começar a desaparecer diante dos nossos olhos, submersa por ventos de areia que insistiam em mergulhar no Índico. Perto de um porto abandonado, imitámo-las. Creio que o fizemos como viemos ao mundo, ante o olhar complacente e distraído de uns quantos camelos. Refrescados, retomámos a rota, agora para Nordeste, em direcção das montanhas. Os jipes subiram durante uma boa hora. Tínhamos a estrada e a paisagem só para nós, quando um deles começou a ficar, a pouco e pouco, para trás. Naquela montanha careca e pedregosa, sem vivalma, o atrasado quase não subia e o dianteiro prometia vertigens na descida, o que viria a acontecer quando os seus travões se decidiram por uma greve de zelo. Lembrei-me logo de outra frase de bolso, que parecia feita de encomenda para a situação:

“Na cidade, a aventura é um evento excepcional num cenário normal; no deserto, é um acontecimento normal num fundo excepcional.” (2)

Numa curva larga da ascensão, o condutor da frente encostou e decidiu esperar pelos atrasados. Enquanto não chegavam, abriu a sua porta, desceu pela encosta umas dezenas de metros, procurou uma pedra lisa e em cima dela colocou uma lata de Coca-Cola. Depois regressou ao jipe e dele retirou a sua kalaschnikov e ainda uma pistola de fabrico soviético que guardava no porta-luvas. Acto contínuo, entregou-ma. Será que quer um duelo ao sol? Cogitei comigo mesmo. Não, apenas queria divertir-se à nossa custa. Em rigor, à minha custa. Tinha acabado de lhe colocar umas questões incómodas sobre a poligamia entre os árabes e agora era a sua vez.

Num lugar de nenhures, um tipo não se arma em pacifista. Oferece o peito ao destino, respira fundo e pede secretamente ao Altíssimo que o ajude. Ele deve ter-me inspirado porque ao primeiro tiro a lata voou com graça pelo ar. Inchado, passeei ao vento a minha altivez, tomada de empréstimo a Peter O’Toole em Lawrence da Arábia. Os árabes da expedição devem ter apreciado o estilo porque, a partir daí, me trataram como um senhor. Estava apto a entrar no deserto e a enfrentar o desconhecido.

Miguel Portas, in Périplo, páginas 67 e 68; Almedina, 2009.

 

(1) Edward Abbey, in Désert Solitaire, 1968, citado em Désirs de Desert; Autrement, hors série, 2000.

(2) Alain Laurent, in Désirs de Desert, pág. 22; Autrement, 2000.

 

É bom haver pessoas que respeitamos ainda que muitas vezes não concordemos com elas. E é péssimo que partam tão cedo.


publicado por José António Abreu às 21:17
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Domingo, 24 de Julho de 2011
RIP
Detesto Lady Gaga. Mas há umas semanas, num segmento que o Sixty Minutes lhe dedicou e no qual teve atitudes tão ridículas como aparecer ao repórter quase nua porque naquele dia «não lhe apetecera vestir-se», admirei a consciência que ela tem da forma como é encarada ao afirmar que os media e muito público lhe seguem os passos esperando assistir à sua queda. Querendo estar lá quando exagerar, quando algo de horrível lhe acontecer. Quando morrer. Mas, acrescentou, sabe perfeitamente o que faz e não lhes (nos) vai dar essa satisfação. Admirei-a pela lucidez (sim, somos vampiros desejosos do sangue – real ou metafórico – dos famosos que não apreciamos) mas pensei que é por este calculismo, pelo modo como a música parece nela apenas um meio para atingir o verdadeiro objectivo – a fama – que não a aprecio. São os genuínos que ficam para a história. Os que, cantem, dancem, escrevam ou pintem, não parecem fingir. Os que mostram sentimentos em que se pode acreditar. E destes – é duro admiti-lo –, especialmente os que morrem cedo e de forma violenta. Porque não se tornam banais e porque provam que todas as fragilidades eram verdadeiras. Descansa em paz, Amy.


publicado por José António Abreu às 00:14
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Sexta-feira, 6 de Maio de 2011
Quatro

Há quatro vias para tentar minimizar o medo da morte sem passar pela religião: a inconsciência, que, sendo a única verdadeiramente eficaz, sem recurso a drogas nunca resiste à entrada na quinta ou sexta década de vida; a luta contra os indícios de envelhecimento, que rapidamente se torna patética; o recurso à violência, como desafio e exorcismo; e a melancolia, como método de aprendizagem. É demasiado cedo para pensar nisto, eu sei, mas às vezes não o consigo evitar. A médio e longo prazo, apenas duas destas formas me parecem constituir opções viáveis para mim. De momento, por entre breves períodos de inconsciência, vou-me agarrando à melancolia.


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publicado por José António Abreu às 08:40
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Domingo, 1 de Maio de 2011
Perder a opção de morrer (dia da mãe: 3)

Nunca usei outro perfume a não ser o que foi criado para mim a pedido de Guillaume nessa viagem a Paris. Substituiu o Bounce, fala por mim e recorda-me de que existo. Uma das minhas companheiras de apartamento passou vários anos a estudar teologia, arqueologia e astronomia, para perceber quem foi o nosso criador, quem somos, por que motivo existimos. Todas as noites, chegava a casa não com respostas mas com novas questões. Eu nunca me questionei sobre coisa alguma a não ser sobre o momento em que poderia morrer. Deveria ter escolhido esse momento antes da chegada dos meus filhos, pois desde então perdi a opção de morrer. O cheiro acre dos seus cabelos ao sol, o cheiro a transpiração nas suas costas à noite ao acordarem depois de um pesadelo, o cheiro poeirento das suas mãos quando voltam da escola obrigaram-me e obrigam-me a viver, a ficar deslumbrada com a sombra das suas pestanas, comovida com um floco de neve, transtornada com uma lágrima nas suas faces. Os meus filhos deram-me o poder exclusivo de soprar numa ferida para tirar a dor, de perceber palavras não pronunciadas, de ser dona da verdade universal, de ser uma fada. Uma fada apaixonada pelos seus cheiros.

Kim Thúy, Ru.

Edição Alfaguara, tradução de Paula Centeno.



publicado por José António Abreu às 15:31
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Deixar de amar (dia da mãe: 1)

Quando eu era mais jovem via a tia Dois prostar-se diante de Buda, diante de Cristo, diante do próprio filho para lhe suplicar que não desaparecesse durante meses, que não voltasse para ela ao fim desses meses de ausência escoltado por homens que lhe encostavam uma faca ao pescoço. Antes de eu ser mãe, não entendia como é que ela, uma mulher de negócios lutadora, de olhar vivo, de língua afiada, podia acreditar nas histórias e nas falsas promessas do seu filho viciado no jogo. Na minha recente visita a Saigão, ela disse-me que devia ter sido uma grande criminosa na sua vida anterior para ser obrigada, nesta vida, a acreditar nas intrujices do seu próprio filho. Ela queria deixar de amar. Estava cansada de amar.

Porque fui mãe, também lhe menti ao omitir a noite em que o seu filho pegou na minha mão de criança e a pôs à volta do seu sexo de jovem adulto, e a noite em que se introduziu no mosquiteiro da tia Sete, aquela que é deficiente, indefesa. Calei-me para que a tia Dois, envelhecida, esgotada, não morresse por ter amado.

Kim Thúy, Ru.

Edição Alfaguara, tradução de Paula Centeno.



publicado por José António Abreu às 15:30
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Quarta-feira, 20 de Abril de 2011
Suicídio, parte II
O suicídio também é difícil de enfrentar por ter a carga do acto definitivo e do inominável (por genética ou decisão divina, estamos programados para o encarar com horror). A assumpção de um papel também servirá para tentar escapar a este problema. Um papel curto e directo (bang!) ou, para quem isso não baste, um papel mais elaborado, que passe primeiro por uma declaração eloquente – por, e é só um exemplo, entrar num sítio qualquer e matar meia dúzia de pessoas (o cinema e a televisão tornaram tão fácil vermo-nos a fazer isto) – que anteceda o derradeiro tiro nos próprios miolos. Ou talvez o tiro nos miolos desferido por um polícia assustado ao ver-se finalmente perante os seus mais recalcados medos e inconfessados anseios, o que sempre permitiria evitar ter de se representar o clímax da peça, a cena culminante e intimidatória, a morte de Otelo (mas sem arrependimento) ou de Julieta (mas sem amor).

 

A verdade é que para quem leva uma vida comum nos países «desenvolvidos» apenas o suicídio resta como opção de morte significativa (a doença e o acidente são demasiado contingentes e, desse modo, pouco dignos de apreço). Isto se aceitarmos que ainda há actos com significado. Ou seja, se por esta altura não os tivermos esvaziado já a todos de qualquer significado, digamos, significativo. O que – e fechemos o círculo neste ponto, para nos dedicarmos a pensamentos mais «positivos» – não deixa de constituir um dos mais válidos argumentos a favor do suicídio.



publicado por José António Abreu às 13:16
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Terça-feira, 19 de Abril de 2011
Encenação

(...) todos os dias pensava em matar-se com a arma que tinha no sótão - uma espingarda Remington 870 que guardava na casa de campo isolada para defesa pessoal - e mesmo isso parecia teatro, mau teatro. Quando um actor representa o papel de alguém que está a desmoronar-se, fá-lo com organização e coerência; quando é ele próprio que está a desmoronar-se, e representa o papel do seu próprio fim, isso é outra coisa, uma coisa transbordante de terror e medo.

Philip Roth, A Humilhação.

Edição D. Quixote, tradução de Francisco Agarez.

 

A incongruência do suicídio é um dos maiores obstáculos enfrentados por quem o pondera. É difícil pensar no suicídio e não lhe detectar um lado de falsidade – de fuga, de encenação, de cliché. A solução para o problema no último Roth editado por cá é engenhosa, em especial num tempo em que a consciência de se desempenhar um papel extravasa em muito o universo dos actores profissionais. A assumpção plena do suicídio como encenação, como performance. Não procurar evitar a incongruência mas mergulhar nela. Cometer suicídio como que aguardando as palmas.

 

(E porém, ainda que há vários anos namore obsessivamente a ideia da morte, parecendo buscar uma via de, mais do que aprender a aceitá-la, ser capaz de ir ao seu encontro, Roth ainda não se matou.)



publicado por José António Abreu às 08:04
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Quarta-feira, 2 de Março de 2011
Novos momentos proporcionados pela tecnologia

Apagar o número de telefone de um morto da memória do telemóvel ou consultar a sua conta inactiva no Facebook.


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publicado por José António Abreu às 08:38
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Segunda-feira, 31 de Janeiro de 2011
A luz

Se analisada de forma séria e racional, a história de ao morrer se avançar em direcção a uma luz pode ter duas explicações. A primeira é aquela em que acreditam os cristãos: morremos e avançamos para o Paraíso. Faz-me alguma confusão que o Paraíso seja um inferno para gente fotossensível mas é uma possibilidade. E suponho que um alerta: quem não vir a luz sabe desde logo estar condenado ao Inferno ou a uns milénios de Purgatório. A segunda hipótese exige que se acredite na sanidade de Shirley MacLaine (de cujos filmes gosto muito mas que nunca me pareceu ter todas as engrenagens cerebrais montadas de acordo com o manual de instruções) e que se entenda que, à chegada, já passámos por experiência similar: no parto, exceptuando casos de partos nocturnos durante apagões, avança-se mesmo por um túnel escuro em direcção à luz. Repare-se: luz à chegada, luz à partida. Um ciclo. Voilá: a reencarnação existe e a morte, como o nascimento, não passa de um canal vaginal.

 

Acaba por ser uma hipótese estranhamente reconfortante. Pelo menos para alguém como eu.



publicado por José António Abreu às 08:42
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Sexta-feira, 21 de Janeiro de 2011
Coordenação

A natureza é perfeita e adaptada a todas as necessidades humanas. A idade aumenta a um ritmo primorosamente coordenado com a perda de ilusões. O optimismo esvai-se, a propensão para acreditar no valor facial do que se vê e ouve diminui, a capacidade para a hipocrisia aumenta por fora e diminui por dentro. A fé nas capacidades alheias quase desaparece, em especial porque os outros se vão revelando incapazes de ver o mais importante: nós.

 

E depois, num perfeito sentido de oportunidade (ou só ligeiramente imperfeito, porque às vezes demora mais do que seria ideal), morre-se.


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publicado por José António Abreu às 08:40
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Quinta-feira, 16 de Setembro de 2010
Funeral

Classificar o céu como cinzento é uma simplificação que lhe destrói a subtileza. Há zonas de cinzento-escuro, outras de um cinzento-azulado extraordinariamente denso, outras ainda de um tom mais claro e quente, a tender para o amarelo. Chuvisca – daquele modo tão espaçado, no espaço e no tempo, que quase toda a gente, receando exagerar, costuma manter os guarda-chuvas fechados. Neste caso, a inexistência de guarda-chuvas abertos dever-se-á mais à circunstância de ninguém parecer ter trazido guarda-chuva do que a qualquer outro factor. Talvez não passe de mais uma ideia construída em livros, filmes e séries televisivas mas apanho-me a pensar que parece haver sempre chuva nos funerais. (Não era no Quatro Casamentos e Um Funeral que alguém referia o facto?)

 

O cemitério é pequeno, com duas zonas desniveladas unidas por três degraus de pedra granítica. Para lá do muro caiado de branco, junto ao qual se alinham meia dúzia de mausoléus, há campos por cultivar e, mais ao longe, pinheiros bravos. O padre diz as últimas palavras em frente ao caixão, pousado sobre um apoio de pedra no corredor central (e único) do cemitério. As pessoas – mas mais as mulheres do que os homens – entoam as orações com uma convicção inusitada. Perante a morte, o medo alimenta a fé. De resto, esta é a primeira morte na família em que a falecida tinha a mesma idade – ou menos – da maioria dos presentes. A sensação de proximidade do fim agrava-se quando se começam a enterrar irmãos e primos.

 

Olho em volta. Pela enésima vez penso que não conheço quase ninguém. Haverá aqui muitos familiares afastados mas não os identifico. Quando há um par de horas cheguei à casa mortuária, uma mulher e um homem vieram cumprimentar-me. Ele – sessenta e tal anos, bigode à treinador de futebol dos anos oitenta – deu-me os pêsames. Surpreendido, agradeci entredentes e remeti-me ao silêncio. Há mais de quinze anos (mais de vinte, se incluir o período da universidade) que a minha vida não é aqui. Todavia, não consigo evitar o sentimento de que devia conhecer estas pessoas – pelo menos a maioria delas. Não as reconhecer, manter-me de lado, só vai reforçar a imagem de distância, de frieza mesmo, que julgo ter criado ao longo do tempo. Mas não me apetece fazer o esforço. Agora ou noutra altura qualquer. Penso apenas que, sejam quem forem, estão todas mais velhas e quase todas mais gordas.

 

Observo o meu primo – tão direito quanto um primo pode ser: o pai dele irmão do meu pai, a mãe dele irmã da minha mãe. É o corpo da mãe dele que está no caixão. Sessenta e cinco anos, morta de cancro nos pulmões – ela que nunca fumou –, como o pai dele morrera de cancro nos rins há vinte e dois anos. Mantém o olhar fixo num ponto entre o padre e o caixão, ou assim me parece, enquanto enlaça a mulher com o braço direito e a minha mãe com o esquerdo. Ao chegar dei-lhe um abraço, disse-lhe qualquer coisa que não recordo (para quê recordar banalidades?), e depois mantive-me de lado. Nunca sei o que dizer nestas ocasiões mas não sei especialmente o que lhe dizer, a ele, nesta ocasião.

 

Um funeral é um acto de respeito e de falta dele. A catadupa de pêsames, de frases feitas (nenhuma tão ironicamente contraditória como «É a vida»), de incitações à coragem, sendo um sinal de apreço é também um pesadelo para os familiares mais próximos, obrigados a manterem-se à altura do momento – ainda que de forma inconsciente, exige-se-lhes uma delicada mistura de sofrimento e dignidade. É também um acto incongruente. Tem algo de errado, de incompleto, mesmo de farsa. O falecido já não se encontra aqui, em frente às pessoas que o velam e enterram. O corpo já não é a pessoa; é o que fica, a parte de que é necessário dispor, como os restos de uma refeição ou os bilhetes usados numa viagem. Algo que recorda uma experiência. Algo que custa deitar fora porque a experiência foi marcante.

 

Sentir a incongruência faz-me pensar na morte da minha avó materna. Foi há vinte e tal anos. (Vinte e cinco? Mais? Menos? Não sei.) Na noite antes do funeral, os meus pais e os do meu primo (ou só a mãe, por o pai já ter falecido?) foram ao velório, deixando-nos em casa. Éramos adolescentes (ele é dois anos mais novo do que eu) e, embora ambos adorássemos aquela avó, acabámos a ver Love and Death, um Woody Allen da primeira fase, com uma luminosa Diane Keaton, que eu gravara ao passar na RTP2. Poucas vezes nos rimos tanto (pelo menos juntos) como naquela noite. Inconsciência? Mecanismo de defesa? Não sei. O que interessa? Questiono-me se ele se lembrará. Talvez um dia lhe pergunte. Ou provavelmente não – evocar aquela noite só nos faria sentir a vergonha a que então escapámos.

 

As pessoas dizem Ámen num suspiro, como que aceitando uma inevitabilidade, e eu acordo das cogitações. O padre terminou. A partir daqui é tudo muito rápido – como se o corpo tivesse oficialmente perdido os últimos resquícios de transcendência. Depois de cumprimentar o meu primo, o padre vai-se embora. O caixão é levado até à sepultura e descido em cordas até ao seu interior. O coveiro começa imediatamente a cobri-lo de terra. (Mas até neste último acto há incongruência: como pode alguém desempenhar uma tarefa tão prosaica, de modo tão impessoal, defronte de um grupo de pessoas que ainda tenta encontrar um sentido – e talvez um sinal – em todo o processo?) As pessoas vão abandonando o cemitério. Coloco-me ao lado da minha mãe, ainda encostada ao meu primo. Ela enfia o braço esquerdo no meu braço direito.

 

Parou de chover. 


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publicado por José António Abreu às 13:41
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Sexta-feira, 2 de Abril de 2010
Páscoa

Todas as nossas religiões, excepto a judaica e a grega, pensam mais em nós mortos do que em nós vivos. 

Joseph Heller, Imaginem que.
Edição Difusão Cultural, 1991, tradução de Cristina Rodriguez.
 
A ressurreição de Cristo (tome-se como facto ou como símbolo) podia mostrar-nos a importância de gozar a vida. A Igreja defende que, mais do que isso, nos promete uma depois da morte, a conquistar através da contenção e do sacrifício. Todavia, enquanto não se sentem perto da morte, as pessoas (mesmo as crentes) parecem ignorar a mensagem e exigir cada vez mais da única vida de cuja existência estão certas. Ainda bem. Mas a atitude gera expectativas tão desmesuradas que é quase impossível ser-se feliz.


publicado por José António Abreu às 16:01
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Quarta-feira, 2 de Dezembro de 2009
Velhice
The temptation is to stay inside; to subside into the kind of recluse whom neighbourhood children regard with derision and a little awe; to let the edges and weeds grow up, to allow the doors to rust shut, to lie on my bed in some grown-shaped garment and let my hair lengthen and spread out over the pillow and my fingernails to sprout into claws, while candle wax drips onto the carpet. But long ago I made a choice between classicism and romanticism. I prefer to be upright and contained – an urn in daylight.
 
Margaret Atwood, The Blind Assassin.
 
Pergunto-me que tipo de idoso serei. Desconfio – temo – que nem clássico nem romântico. Muito menos um gentleman impecável e activo à la Clint Eastwood. Suspeito que vou vaguear pelos passeios, ligeiramente curvado (mas sem bengala), arrastando os pés, olhando fixamente as pessoas. De modo a deixá-las inquietas, com dificuldades em remover da memória aquele velho horrível e assustador que parecia conhecer-lhes os segredos – ou o destino. Desejo que, durante as horas seguintes, olhem duas vezes para cada lado antes de atravessar a rua.
 
(Ou então encaram-me com ar de desprezo e esquecem-me imediatamente. E são atropeladas por um autocarro na primeira passadeira.)


publicado por José António Abreu às 23:06
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Domingo, 9 de Agosto de 2009
A criança

Passei o dia de ontem pensando no que poderia dizer acerca de Raul Solnado. A característica dele que me parece mais interessante – e que talvez suscite muito do carinho que granjeou – era a sua forma relutante de fazer humor. Relutante não no sentido de o fazer contrariado mas no da criança (e já muitas pessoas mencionaram o termo ‘criança’ ao se lhe referirem) que avalia o efeito que as suas piadas tiveram, maravilhado pela reacção mas um pouco céptico por tê-la conseguido tão facilmente. Pense-se nos mais conhecidos sketches dele e ver-se-á grande parte da típica ingenuidade infantil. E a frase “façam o favor de ser felizes” tem ou não implícito o “vá lá, façam-me a vontade” com que uma criança pede um brinquedo? Em Solnado, o cepticismo era doce e o cinismo inexistente. Via-o ontem contracenar com Bruno Nogueira no programa que a RTP apresentou depois do telejornal e reforçava essa impressão. Nogueira, como de costume, fazia de gajo esperto mas presunçoso (papel que desempenha na perfeição); Solnado, até quando lhe chamava “cabrão”, fazia-o num tom que deixava subentendido “olha-me este marmanjo” e não “olha-me este filho da puta”. Mesmo quando desempenhava papéis dramáticos (e confesso as minhas falhas porque recordo poucos), a nota dominante era um desamparo infantil e não verdadeira raiva ou maldade. Relembre-se o magnífico Elias de A Balada da Praia dos Cães. O mundo à sua volta era violento e ilógico e ele enfrentava-o com uma resignação muito adulta mas também com uma incompreensão e uma mágoa muito infantis. Como se realmente não percebesse por que carga de água as pessoas não só não queriam ser felizes como até se esforçavam por ser infelizes. A lógica dos adultos é com frequência triste, Raul.

 

Foto pedida emprestada ao Senhor Palomar.



publicado por José António Abreu às 14:57
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Terça-feira, 21 de Julho de 2009
As cinzas de Frank

Com frequência, o tempo melhora as experiências. Quem já não voltou desiludido de umas férias e, meses mais tarde, as recordou com nostalgia? Mas o tempo também dissipa paixões. Frank McCourt morreu anteontem. Li As Cinzas de Angela há mais de dez anos e, se já não me lembro de passagens específicas, recordo-me de, tal como Pedro Rolo Duarte, ter gostado bastante do livro. Mas apercebo-me também de, progressivamente, isso me ter começado a embaraçar. A culpa não é de McCourt, claro. Deve ser exclusivamente minha.



publicado por José António Abreu às 20:12
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Quinta-feira, 21 de Maio de 2009
Muito lá de casa.

Morreu João Bénard da Costa. Será recordado por ter sido director da Cinemateca mas também pelas passagens pela Gulbenkian e pela Escola Superior de Cinema do Conservatório Nacional, pelos livros que escreveu ou até pelas crónicas de viagem. Eu recordo-o como uma das principais razões para ler O Independente, onde escreveu páginas absolutamente sublimes sobre filmes, actores e especialmente actrizes. Será acima de tudo lembrado como parecendo estar permanentemente enlevado por um filme, um realizador, um actor ou – mais uma vez – especialmente uma actriz. Das várias que se poderiam referir, fiquemo-nos por Joan Crawford, no seu amado Johnny Guitar.

 

 



publicado por José António Abreu às 10:04
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Segunda-feira, 4 de Maio de 2009
O Bip-bip e os checoslovacos (tributo a Vasco Granja).

Morreu Vasco Granja. Para os miúdos (e miúdas, claro) com menos de, vá lá, trinta anos, o acontecimento deve significar pouco. Para os miúdos um pouco mais velhos, a notícia provoca um baque, como se se tratasse de um familiar afastado, que já não se via há muito mas que, nos nossos tempos de criança, aparecia com regularidade, sempre bem disposto, nunca se esquecendo de trazer guloseimas. Um tio benigno e excêntrico, mais ou menos ignorado pelo resto da família. Um adulto diferente, que parecia compreender-nos. Já nós nem sempre o compreendíamos. Ele falava durante um par de minutos sobre um filme de animação checoslovaco e nós não percebíamos patavina. E continuávamos a não perceber quando o filme era colocado no ar. Mas fazíamos um esforço tremendo, porque a falha devia ser nossa. E depois ele falava durante mais dois minutos sobre Chuck Jones ou Friz Freleng e nós ouvíamos já com um sorriso porque a seguir vinha o Bugs Bunny ou o Daffy Duck. Ou a pantera cor-de-rosa. Há anos que não vejo os filmes de animação da pantera cor-de-rosa...

 

Desconfio que os miúdos de hoje, fornecidos por uma dúzia de canais televisivos, pela Internet, por DVDs e salas de cinema, nunca chegarão a ter um Vasco Granja como amigo. De certa forma, ainda bem para eles. Mas nós, os que esperávamos ansiosamente pela sua chegada, curiosos de saber que prendas trazia, sabemos que eles estão a perder qualquer coisa.

 

Dois pequenos vídeos de homenagem.

 

Granja no "Herman Enciclopédia":

 

 

O coyote apanha o road runner (ou melhor, o bip-bip):

 

 



publicado por José António Abreu às 18:55
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