Informação nº 1: percebendo apenas um pouquinho mais de futebol do que de termodinâmica ou de mulheres, sigo os campeonatos de clubes tão pouco quanto a comunicação social e a decrescente destreza dos meus dedos na manipulação do telecomando televisivo me permitem.
Informação nº 2: a capacidade da minha memória diminuiu tanto nos últimos anos como... caramba, juro que ainda agora tinha uma analogia perfeita.
Avancemos. Não obstante tudo o que está atrás ser 100% verdade (OK, exagerei num ponto: sei o bastante sobre termodinâmica para estar consciente de que dois corpos em fricção causam aumento de temperatura e tendem a gerar trabalho), lembro-me do Cristiano Ronaldo dos tempos do Sporting. Um rapaz muito verde (desculpem, não resisti à piada; caso vos seja insuportável, pensem numa folha em branco) mas já com potencial futebolístico para chegar a estrela. Nos anos seguintes, sem prestar grande atenção mas sem conseguir evitá-lo (como poderia?), fui dando conta do nascimento dessa estrela. Tinha e tem duas facetas: a de jogador excepcional, mescla de talento inato e dedicação maníaca, e a de prima-dona, dentro do relvado (ah, aquelas poses na marcação dos livres, que Sepp Blatter tão bem parodiou, antes de infelizes acontecimentos o afastarem de um cargo que distraídos como eu chegam a pensar ser vitalício) e fora dele (carros, mulheres, declarações variadas, campanhas publicitárias, bling bling de gosto duvidoso, microfones e a tendência para exibir aquele torso de Photoshop, exasperante para qualquer macho humano normal). Mesmo consciente de que a segunda faceta podia estar a chegar-me distorcida pela duvidosa acribia (sim, estou a tentar meter nojo) dos títulos dos jornais e dos rodapés dos noticiários televisivos, ainda assim ela impedia-me de ser um fã de Ronaldo. Achava que ele tinha todo a direito a estar orgulhoso do que alcançara (falsas modéstias são-me tão irritantes como textos nos quais os autores procuram desesperadamente introduzir humor) mas descoroçoava-me que ele mostrasse o orgulho de formas ostentatórias e por vezes agressivas. Para ajudar à minha má-vontade, Ronaldo raramente jogava ao mais alto nível nos encontros da selecção (os únicos em que o via), apesar de todos os outros jogadores parecerem ter sido convocados apenas porque as regras não permitiam que jogasse sozinho (manobras de Blatter, certamente).
E depois chegou anteontem e aquela final no Instituto Entomológico de Paris (achei estranho irem incomodar as traças, confesso). Num encontro em que praticamente não jogou, Ronaldo mostrou-me outro Ronaldo. Mostrou-me uma espécie de Ronaldo dos tempos do Sporting, actualizado para um homem de 31 anos. Um Ronaldo esforçado, sincero, sem poses. Um jogador de equipa, que não desiste e dá o seu melhor, até mesmo quando não o pode fazer dentro do campo. Anteontem, num encontro em que o jogador fora de série não pôde surgir porque levou uma cacetada antes dos dez minutos (Ça Alors!, Par Toutatis! e Mille Sabords!), Ronaldo fez-me respeitá-lo como raramente o conseguira antes.
E pronto. Lamento o anticlimático final piegas mas este texto não passa da nota de arrependimento e apreço de um ex-crítico. As piadas foram só uma tentativa para disfarçar o incómodo.
Partilho a alegria e acho muito bem que se venha festejar para as ruas: em tempos de individualismo, os momentos de comunhão só podem ser benéficos. O que me confunde é a rapidez com que surgiram as caravanas de veículos. Ainda Ronaldo não começara a coxear pelas escadas acima em direcção à taça e a cacofonia nas ruas do Porto - mais serenas do que numa manhã de São João durante o encontro - já era indescritível (um adjectivo muito útil para os momentos em que não sabemos como descrever as coisas). Honestamente, fica-me a ideia de que antes de Éder desferir aquele rematezito fulminante já centenas de pessoas estavam sentadas dentro dos carros, aguardando no escuro a oportunidade de poderem sair a apitar.
Blergh, gajas!
Aqui entre nós, a expressão da guarda-redes sueca é deliciosa mas a silhueta da atacante nigeriana constitui pura poesia.
Fotos: Kevin C. Cox/Getty Images North America, pescadas na net.
Passos Coelho olha para a reacção dos portugueses à pantomima de Blatter e dos adeptos portistas a um conjunto de resultados medianos e, não obstante um ou outro exercício aeróbico de step na escadaria do Parlamento, só pode pensar: «Ainda bem que isto não é futebol.» Mas, evidentemente, a racionalidade pode assumir um papel muito secundário nas questões em que a maioria das pessoas tem apenas investida paixão.
E perdoe-se-me o «apenas».
Seis milhões de portugueses reagem mal a descontos.
Há seis milhões de portugueses que hoje nem ele conseguirá fazer deixar de sorrir.
E agora, durante quatro anos, dezenas de modalidades desportivas ficam novamente remetidas à obscuridade. Sendo que se alguma coisa os Jogos Olímpicos demonstram é que, em termos de espectacularidade, o futebol está longe de justificar a hegemonia de que goza na maior parte do planeta. Como os norte-americanos costumam referir, trata-se de uma modalidade em que nada acontece durante a maior parte do tempo e é também das poucas onde se pode verdadeiramente jogar para o empate – com frequência, a zero.
Os golos que a Alemanha meter na baliza grega terão de ser devolvidos. Com juros.
Há-de correr bem.
Sinto-me o garagista do velho anúncio da Dyane. Os acontecimentos passam-me ao lado «e eu a vê-los passar». Para ser franco, quase nem tenho visto os noticiários. Praga fez-me perder a vontade de acompanhar a histeria do quotidiano – e mais ainda de perder tempo a escrever sobre ela. Também, o que raio se tem passado?
António Borges – e, como por cá nunca ninguém pode ter (muito menos emitir) opiniões sem autorização do chefe, Passos Coelho – é crucificado por dizer o óbvio: no ponto a que chegámos, sem desvalorização fiscal ou níveis de crescimento económico inatingíveis (mesmo que houvesse algum dinheiro para os famigerados «estímulos»), a única forma de ajustamento é através da redução de salários ou, mais genericamente, do poder de compra. O processo até já começou há vários anos mas, perante realidades desagradáveis, continuamos a preferir o silêncio – ou declarações de circunstância. Nada de novo, portanto.
Em Espanha, a propósito de realidades desagradáveis (a iminência do colapso financeiro), a preocupação do governo é passar a imagem de que, ainda que os bancos espanhóis precisem de ajuda, o governo espanhol não precisa de ajuda. Com ligeiríssimas nuances ao nível do enredo, já vimos este filme. Nada de novo, portanto.
Em Portugal, num comício de apoio a um partido candidato às eleições na Grécia, Francisco Louçã atribui a culpa de todos os problemas do mundo à Alemanha. À primeira vista, nada de novo. Ainda assim, fico um bocadinho banzado por ele culpar a Alemanha pelas dificuldades da banca espanhola. Terá sido a compra desenfreada de casas de férias em Maiorca e Ibiza por parte de cidadãos alemães a causa da bolha imobiliária? Não fosse esta inércia incapacitante, pesquisaria o assunto.
No primeiro jogo do Europeu de futebol, a equipa portuguesa, repleta de craques quase tão à vontade a domar uma Adidas Tango como as centenas de cavalos de um Lamborghini Aventador ou de um Bentley Continental GT, só começa a jogar depois de estar a perder. Nada de novo, portanto. Por muito que me custe, devo até admitir que o futebol representa bem o país.
Enfim: vale a pena perder tempo a escrever sobre tais assuntos? Nah. Pelo que me parece que ainda não vai ser hoje.
Então porquê? Tentaram comprar os árbitros com dinheiro do FMI? E quem jogaria com a Polónia no encontro de abertura?
No fundo, vivendo de ilusões e derrotas consecutivas*, já era. Mas a situação de falência iminente demonstra sem margem para dúvidas que, ao contrário do que defendem os pretensos seis milhões de benfiquistas, o Sporting é o clube que melhor representa o país.
* Houve mais uma esta noite, contra o Gil Vicente, por 0-1. Não foi um grande golo mas é um grande galo. De Barcelos.
Em tempos de crise temos uma vantagem competitiva. Estamos habituados. A crise é o nosso ambiente natural.
Não entrar num café apinhado de portistas para espreitar o resultado do Porto - Benfica vestindo uma t-shirt vermelha, ainda que sem qualquer relação com o Benfica.
Adenda: estudar melhores formas de reagir do que gritando: «Eh pá, mas eu até sou do Sporting!»
Quem vê desporto na televisão e compra jornais desportivos? Quem até, provavelmente, compra a maioria dos restantes jornais? Os homens. As mulheres não ligam a desporto. Pelo menos o bastante para se sentarem à frente de um televisor ou comprarem um jornal. (Generalizo, obviamente.) De quando em quando, as mulheres podem pensar, com um carinho inteiramente sincero, que os campeonatos para-olímpicos são uma coisa bonita, podem espreitar uma prova de ginástica ou de patinagem artística, mas ver mesmo desporto – não vêem. Preferem a Oprah, séries, filmes, telenovelas, o What Not to Wear e o Rachel Zoe Project. Se as mulheres gostassem tanto de patinagem artística como gostam de roupa, maquilhagem e decoração, a SIC Mulher apresentaria patinagem artística duas vezes por dia, existiriam revistas e jornais só acerca de patinagem artística e rapidamente os canais generalistas de televisão teriam programas de debate em que se analisaria a qualidade dos triplos Axel realizados nas provas do fim-de-semana anterior. Hélas, as mulheres não gostam assim tanto de patinagem artística nem de qualquer outro desporto. Isso faz com que sejam os homens a definir que desportos se vêem na televisão e sobre que desportos se lê nos jornais. Ora os homens são seres simples, de gostos limitados e com tendência para a conformidade (continuo a generalizar). A partir do momento em que as mulheres lhes deixam o campo livre pode dizer-se adeus aos para-olímpicos na televisão. E até à patinagem artística. Para a sensibilidade masculina (nem sempre é oxímoro), as provas para-olímpicas são um mau espectáculo televisivo e a patinagem artística não é muito melhor. E como é o gosto pelo futebol que é inculcado nos homens desde criança e o futebol é que dá para discutir durante a pausa para o café por ser o que vêem todos os outros homens (menos uns tipos esquisitos como eu), vê-se futebol. As televisões (como as rádios e os jornais) não podem então fazer outra coisa senão ir atrás do consumidor-tipo (que, neste caso, é um consumidor-gajo) e, numa espécie de pescadinha de rabo na boca, começam a passar apenas futebol.
De qualquer modo, nenhum destes factores invalida a tese, pelo que a conclusão é inevitável: a culpa de se prestar pouca atenção a desportos que não o futebol nos meios de comunicação (e, por conseguinte, na sociedade) é essencialmente das mulheres. E, pronto, um bocadinho – mas só um bocadinho – dos homens.
Vi o final do jogo. E percebi por que motivo o Porto foi buscar o João Moutinho ao Sporting: é sempre conveniente ter no plantel pelo menos um jogador português.
(E para evitar uma série de comentários desnecessários: parabéns ao Porto. E ao Braga.)
Hoje é um dia histórico. Reportagem no aeroporto Francisco Sá Carneiro. Um adepto do Porto comprou o bilhete há meses porque tinha «fé». Um adepto do Braga chegou às três da manhã para apanhar um avião que sai às nove. Regresso ao estúdio. Excerto de It's a Beautiful Day, dos U2. Ligação a Dublin onde, afinal, chove. Reportagem com o tio de Domingos Paciência, que prepara uma sardinhada num pavilhão de Matosinhos. Vai levar entre duzentos e trezentos pães mas não apanhei o número de sardinhas.
É possível que o noticiário (?) das oito da TSF tenha incluído notícias (?) ainda mais bonitas mas eu, que admito ter uma relação complicada com a paciência (com o Paciência não tenho problemas, pelo menos enquanto ele não for treinador do Sporting), saí do carro antes de se chegar, sei lá, à informação (essa sim, seria relevante) de que hoje as strippers minhotas oferecem lap dances gratuitas aos sócios do Braga. (Aos do Porto parece que já ofereciam – ou era só aos dirigentes?) Enfim, acima de tudo, não esquecer de repetir pelo menos dez vezes durante o dia: hoje é um dia histórico.
Até a jogar futebol Portugal está parecido com a Grécia.
A Espanha fazia questão de ganhar.
Gosto tanto do universo futebolístico como José Saramago gostava do religioso. Tornou-se assim inevitável escrever sobre o assunto. Afinal, os ódios – especialmente os de estimação – são tão estruturantes como as paixões. Como o grande poeta irlandês Paul Hewson* escreveu recentemente: Choose your enemies carefully ‘cos they will define you / Make them interesting ‘cos in some ways they will mind you / They’re not there in the beginning but when your story ends / Gonna last with you longer than your friends. Não estou certo de concordar com a parte final mas o início afigura-se-me perfeito.
Adiante. Tratando este texto de futebol, sinto-me quase obrigado a começar com um cliché: eu até gosto de futebol; não gosto é do que se passa em torno do futebol. E do facto de muitas vezes não haver futebol, mesmo dentro do campo de futebol (ou, creio ser assim que se diz, do «rectângulo de jogo»). Vamos por partes (mais que duas).
Terminologia
O desporto-rei. O esférico (quando se optar pelo uso de «bola», é conveniente salientar que é redonda). As quatro linhas, ou o rectângulo de jogo. O plano técnico-táctico. O jogo directo. O primeiro poste. A cabeça da área. O pressing. O místere. O manáger. O dérbi. O encontro de alto risco. O frango. O pontapé de bicicleta. O fazer-se à falta. O mergulho (também conhecido por «atirar-se para a piscina»). A falta cirúrgica. O fazer a diagonal. O chuveirinho. O 4-4-2, o 4-3-3, o 4-3-2-1, o 4-1-3-2, o 5-3-2, o 3-5-2, o 4-5,33-0,67 (a táctica da selecção portuguesa quando joga com um avançado baixinho e solitário chamado Liedson, que só toca na bola quando recua até ao meio-campo, altura em que Portugal joga em 4-6-0). O autocarro. A chicotada psicológica. As declarações: estava escrito que o jogo ia acabar empatado, uma equipa só joga o que a outra deixa jogar, há que respeitar o adversário, o resultado acaba por se ajustar ao que se passou dentro das quatro linhas, a haver um vencedor, só podia ter sido o XYZ (que, em futebolês, equivale a «nós»), penso que merecíamos a vitória, tenho que dar os parabéns aos meus jogadores, vocês sabem que eu nunca falo do trabalho do árbitro, o que se passou foi uma vergonha. O apito final.
Fitas
Haverá desportista mais fiteiro que o jogador de futebol? Leva um toque na perna direita e atira-se ao chão agarrado à esquerda, como se a tíbia estivesse à mostra e o perónio desintegrado em fragmentos. Quando um esquiador ou um piloto de motos cai e fica agarrado a uma perna, a gente percebe que ela está partida em pelo menos vinte e dois locais diferentes, e também percebe porquê. Um patinador artístico usa calças de lycra e corpete justo mas levanta-se mais depressa do que cai. E não falemos dos tipos do rugby, para quem as lesões serão provavelmente motivo de orgulho tão grande quanto os ferimentos de bala e de arma branca o eram para as personagens desempenhadas por Mel Gibson e Rene Russo no mítico Arma Mortífera 3 (ei, as referências culturais devem ter a profundidade requerida pelo assunto em análise). Já para não falar das fitas dos dirigentes, dos comentadores e dos jornalistas. O futebol é um desporto pejado de prima-donas kitsch, combinação tão pavorosa como pão-de-ló de Ovar com miúdos de frango.
Cromos
Comentadores
Onde é que se tira o curso? Era na Independente?
Política
Recuso um desporto em que o nível de promiscuidade com o poder é maior do que no conselho de administração das maiores empresas nacionais.
Fãs
OK, sou elitista. Mas, com ou sem vuvuzelas, os fãs do futebol são extremamente irritantes. Em primeiro lugar, são muitos e qualquer conjunto grande de pessoas com interesse similar e sem vergonha de o assumir adquire rapidamente tendências totalitárias. Em segundo lugar e em parte decorrente do primeiro, falam alto, em linguagem incompreensível, sobre pessoas chamadas Di Maria, Nani, Hulk, Coentrão, e – já não joga, pois não? Que pena, do nome deste até eu gostava – Martelinho. Depois, são quase todos homens, com pança e bigode (literal ou metaforicamente). Há excepções a este ponto? Há. Algumas fãs que os cameramen das televisões se esforçam por descobrir por entre grunhos e tontos, uma Cinha Jardim fora do prazo de validade, apesar dos corantes e conservantes, e mais umas quantas raparigas que apenas gostam de olhar para os futebolistas, amaldiçoando a regra que os leva a receberem um cartão amarelo quando festejam golos tirando a camisola.
Claques
Os fãs de que ninguém gosta. A prova de que o homem do neandertal não se encontra extinto.
Empates
Não gosto de empatas nem de empates. O futebol não é o único desporto em que o empate é possível, claro. Mas o facto de ser possível empatar, e de frequentemente isso constituir um mal menor, leva a que o empate se torne no objectivo não-declarado mais vezes do que Sócrates desdiz o que disse garantindo ter sempre dito o que está a dizer. Ora jogar para o empate é de mariquinhas. (Desconfio que nos dias que correm é politicamente incorrecto usar o termo «mariquinhas» para designar atitudes que são, bom, mariquinhas, mas vou deixá-lo ficar porque não encontro melhor para descrever comportamentos que, bem vistas as coisas, são mariquinhas). O futebol está cheio de gente a jogar para o empata. Empatas. Como Carlos Queirós (resumo do jogo com o Brasil: eles não faziam questão de ganhar; nós jogámos à defesa). O empate é pantanoso. Uma coisa disforme. Prefiro ver o Federer perder. É uma sensação mais intensa e definida. Perder com galhardia é mais bonito do que empatar.
Hierarquias
O futebol parece-se demasiado com a vida do dia-a-dia. Um clube de futebol tem uma estrutura similar a uma empresa, o que implica hierarquias, jogos de poder, beija-mãos, problemas de motivação e utilização de bodes expiatórios. Ora eu – e certamente não estarei só – já obtenho no emprego quantidades de tudo isso muito acima da dose diária recomendada pela OMS. Por que raio haveria de ter vontade de mergulhar ao fim-de-semana num universo com exactamente as mesmas características? Mais: o futebol é um jogo colectivo, onde – dizem – todos os jogadores são igualmente importantes. Na realidade, como nas empresas, cada jogador desunha-se para sobressair do esforço colectivo (passa o raio da bola, Ronaldo de uma figa!) e a igualdade é ilusória: quantos defesas atingem a fama e a remuneração dos melhores atacantes? Por que motivo se desculpam dez falhanços de um ponta-de-lança mas se crucifica um guarda-redes após um ou dois? Mesmo nós, espectadores, relembramos essencialmente grandes jogadas individuais: Maradona no México em 1986; o calcanhar de Madjer; as performances de João Pinto enquanto jogador do Benfica nos encontros com o Sporting (#$%&£@§). Os «movimentos» colectivos tendem a desvanecer-se da memória. Antes um desporto individual, então. Sempre é menos hipócrita.
E já chega, que o Portugal – Espanha está prestes a começar. Qual será a nossa táctica, hoje? 5-5-0? Ou usaremos o quadrado?
* Mais conhecido como Bono.
Parabéns aos benfiquistas. Já se pode ligar o televisor?
Esta gentileza. E o convite para jantar na caixa de comentários. Claro que mesmo um sportinguista pessimista como o senhor jaa acha que, no caso de Sporting e Benfica se encontrarem na final da Taça Europa, como o Senhor Palomar já antes mostrara desejar num post que deixou o senhor jaa com sentimentos contraditórios (os mesmos com que também ficara ao ler este outro post do Senhor Palomar), o Sporting arranjará maneira de desfeitear as sempre inabaláveis ilusões dos benfiquistas. Mas, porque os tempos estão difíceis e o pragmatismo é hoje uma religião perfeitamente aceite pela sociedade, na eventualidade do cenário apresentado pelo Senhor Palomar se confirmar (o senhor jaa admite que não seria de todo impossível o Sporting perder com um auto-golo marcado no último minuto), o senhor jaa aceita o convite para jantar, que é a forma de sempre ganhar alguma coisa. Para finalizar, gostaria ainda o senhor jaa de alertar o Senhor Palomar que, a menos que seja pelo menos tão rico quanto um ex-administrador do BCP (poderia ser Paulo Teixeira Pinto mas suponho que, nesse caso, faria mais publicidade aos livros de Agustina Bessa-Luís que ao de Roberto Bolaño), deve evitar continuar a oferecer-se para pagar jantares a quem o elogia. É que certas pessoas podem aproveitar-se da sua boa vontade. Como, por exemplo, o senhor jaa.
(Já agora, talvez uma qualquer faculdade de psicologia e/ou sociologia pudesse fazer um estudo para analisar se um sportinguista, tarimbado no sofrimento, sofre menos com uma derrota que um benfiquista, ainda prenhe de visões de grandeza. Espero que não. Até para evitar o nível de risco a que ficariam expostos os portistas se tal fosse verdade.)
Tenho evitado abordar o tema do futebol neste blogue. É possível que isso já sugira que sou sportinguista. Os adeptos do Sporting são muito diferentes dos adeptos do Benfica e do Porto, e não apenas por entre eles se encontrar um número extremamente elevado de banqueiros, como o Gato Fedorento notou há tempos. (Atendendo à reputação actual de tal gente, os restantes sportinguistas prefeririam car-jackers ou mesmo políticos de carreira, mas é só mais um entre tantos pontos a encarar com resignação.) O que torna um sportinguista num verdadeiro sportinguista é a atitude entre a confiança impetuosa e a dúvida persistente, entre a vontade de voar e a quase-certeza de que, se der o famoso passo em frente à beira do precipício, cairá a pique. É, se quiserem e para facilitar, uma abordagem intelectual e artística da vida e do jogo de futebol. Ouço já vozes em protesto avançando nomes de intelectuais confessadamente adeptos do Benfica ou do Porto, mas peço que não invadam por enquanto a caixa de comentários com bombas, petardos e very-lights; creio que, mesmo não sendo sportinguistas, irão conseguir perceber a diferença. (E admito também que uns quantos sportinguistas não o conseguirão; há sempre gente enganada na porta.)
Por ser simpatizante do Sporting e, mais importante, pouco apreciador do universo futebolístico, tinha prometido a mim mesmo não fazer comentários sobre as eleições do Benfica. Mas, aqui sentado com a televisão a mostrar-me debates onde Benfiquistas evitam criticar as manobras sujas que caracterizaram a marcação das eleições ou a necessidade de um dos candidatos votar com escolta policial, resultados eleitorais de república das bananas, vaias aos derrotados e à comunicação social, entradas triunfais do inesperadíssimo vencedor, um discurso (cuja transmissão em directo obriga à interrupção de um debate sobre o estado da Nação na SIC Notícias) em que o presidente da vetusta e heróica agremiação parece não ir chamar “garotões” aos derrotados, acusando-os apenas de falta de dignidade, tenho que admitir que o Benfica é de facto o único clube verdadeiramente representativo dos portugueses. Dos mesmos que elegem Alberto João Jardim, Fátima Felgueiras ou Valentim Loureiro. Dos mesmos que cospem ou atiram lixo para o chão. Dos mesmos que ziguezagueiam por entre o trânsito e queimam os semáforos vermelhos. Acredito agora que o Benfica tenha os famosos seis milhões de adeptos. Talvez até sete, talvez até oito. Parabéns ao Benfica. Parabéns a Portugal.
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