É o que ninguém sabe acerca de ti que te permite conheceres-te a ti mesmo.
Don DeLillo, Ponto Ómega.
Edição Sextante, tradução de Paulo Faria.
Para a maior parte das pessoas, o mundo só tem dois sítios: o sítio onde elas vivem e a televisão.
Don DeLillo, Ruído Branco.
Edição Sextante, tradução de Rui Wahnon.
O livro é dos anos 80. Agora devíamos acrescentar a internet, claro.
Ela olhava-me, avaliando-me às claras. Perguntei a mim mesmo o que estaria ela a ver. Senti que lhe devia algumas explicações acerca dos anos decorridos entretanto. Sentia aquele vago pavor que experimentamos quando alguém nos examina atentamente depois de uma longa separação e nos faz pensar que cometemos um pecadilho ao atingirmos este ponto das nossas vidas tão diferentes e tão crispados. Estranhos aos nossos próprios olhos, compreendem. Alcançarmos esta fase de tal maneira indefesos ante os nossos próprios ardis que permitimos que a verdade nos fosse escamoteada.
Don DeLillo, Submundo.
Edição Sextante, tradução de Paulo Faria.
Às vezes vejo coisas tão comoventes que sei que não me devo demorar a contemplá-las. É ver e partir. Se ficamos demasiado tempo, exaurimos a comoção sem palavras. Sentir o frémito da paixão e confiar no que assim nos toca e partir.
Don DeLillo, Submundo.
Edição Sextante, tradução de Paulo Faria.
Como, quando perante um prato delicioso, evitar comer demasiado. Assumir – mais, procurar – uma ligeira insatisfação. Manter o desejo. Nada fácil. Exactamente o oposto daquilo que, num mundo de gratificações máximas e imediatas, pensamos ambicionar. Num mundo em que fazemos questão de esgotar todas as sensações tão depressa quanto nos for possível, ficar aquém da experiência total é inconcebível. E manter o silêncio, algo de impensável. Precisamos de discutir, analisar, comparar, explicar tudo. Não há subtileza num mundo assim. Mas há frustração.
Quantos começos antes de nos apercebermos das mentiras em que assenta o nosso entusiasmo?
Don DeLillo, Ponto Ómega.
Edição Sextante, tradução de Paulo Faria.
Antes? E depois? Mesmo quando já estamos conscientes das mentiras, continuamos a jogar o jogo. A necessitar de entusiasmo – e de começos. Temos de o fazer. É isso a vida. Insistência. Fingimento em cima de mentiras.
«Não o devemos fazer às claras, é o que tu estás a dizer. Mas isso é porque ainda continuas a ser o mesmo romântico que, provavelmente, eras aos vinte anos. O sexo já deixou de ser uma coisa assim tão secreta. O sexo foi desvendado. Sabes o que o sexo significa para a maioria das pessoas?»
Baixou a mão e pousou-a sobre a minha, e moveu a pélvis ligeiramente, roçando-se contra a minha palma.
«O sexo é aquilo a que temos acesso. Para algumas pessoas, para a maioria, é a coisa mais importante a que têm acesso sem terem nascido ricas nem inteligentes, e sem precisarem de roubar. Eis uma coisa que a vida nos pode oferecer e que é igual ou até melhor ao que os outros possuem, e que não temos de andar seis anos na universidade para alcançarmos. E não é uma religião nem é uma ciência, mas podemos explorá-lo e aprender coisas novas acerca de nós mesmos.»
Don DeLillo, Submundo.
Edição Sextante, tradução de Paulo Faria.
Eu notava como as pessoas fingiam que eram executivos, quando, na realidade, detinham mesmo cargos executivos. Será que eu próprio também o fazia? Mantemos uma distância flutuante entre nós próprios e o nosso emprego. Há um espaço constrangido, uma consciência da encenação cerimoniosa que é uma espécie de pânico suspenso, e talvez o revelemos num gesto forçado ou no pigarrear ritual. Qualquer coisa saída da infância sibila neste espaço, uma percepção dos jogos e das personalidades ainda incompletas, mas não é que estejamos a fingir ser alguém que não somos. Estamos a fingir que somos exactamente quem somos. Eis o que é mais curioso.
Don DeLillo, Submundo.
Edição Sextante, tradução de Paulo Faria.
Deixara de ser uma simples rua, era agora um mundo, um tempo e espaço de cinza a tombar e quase noite. Ele caminhava para norte através do entulho e da lama e havia pessoas que o ultrapassavam a correr, com toalhas encostadas ao rosto ou casacos a cobrir a cabeça. Tapavam a boca com lenços de assoar. Traziam sapatos nas mãos, uma mulher com um sapato em cada mão surgiu a correr e deixou-o para trás. Corriam e estatelavam-se, algumas, confusas e desajeitadas, com destroços a tombarem à sua volta, e havia pessoas a abrigarem-se debaixo dos automóveis.
O rugido permanecia no ar, o ronco distorcido da queda. Agora o mundo era assim. O fumo e a cinza rolavam pelas ruas fora e dobravam as esquinas, irrompiam brutalmente às esquinas, ondas sísmicas de fumo com folhas de papel timbrado a surgirem em lampejos, folhas de formato padronizado com bordos cortantes, a pairarem, arrastadas num sopro, coisas inimagináveis na cortina de fumo matinal.
[…]
O mundo era também isto, figuras humanas em janelas trezentos metros acima do chão, a lançarem-se no vazio, e o cheiro nauseabundo do combustível a arder, e o ar rasgado pelas sirenes insistentes. O ruído estava em toda a parte para onde as pessoas corriam, o som estratificado a acumular-se em volta delas, e ele afastava-se e ao mesmo tempo mergulhava no seu seio.
O Homem em Queda, de Don DeLillo
Edição Sextante, tradução de Paulo Faria
Foto retirada daqui.
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