Tatum O'Neal, em Paper Moon (Lua de Papel, 1973).
Paper Moon, de Peter Bogdanovich, é uma revisitação dos Estados Unidos da época da Grande Depressão, baseada no último livro do escritor e jornalista Joe David Brown. Passado entre grandes espaços (frequentemente no interior de um veículo descapotável), e pequenas cidades, filmado a preto e branco (com filtros vermelhos ou verdes em frente à objectiva, de modo a gerir o contraste), e sempre com elevada profundidade de campo, o filme abre com um funeral. No pequeno grupo de pessoas que ladeia a campa, encontra-se uma rapariga de oito ou nove anos. Subitamente, aproxima-se um carro barulhento. Dele sai um indivíduo que se junta ao enterro. Moses Pray (Ryan O'Neal, protagonista de filmes como Love Story, Barry Lyndon e The Driver), diz-se amigo da falecida mãe da rapariga. Ao mencionar que vai para St. Louis, os presentes propõem-lhe que leve a miúda, Addie Loggins, até casa de uns tios, únicos familiares conhecidos, situada em St. Paul, a curta distância de St. Louis. Após alguma resistência, Moses acaba por aceitar.
Addie (Tatum O'Neal, no seu primeiro desempenho) rapidamente percebe que na base da disponibilidade de Moses não se encontram noções de solidariedade mas um plano para extorquir dinheiro à família de um ex-amante da mãe, responsável pelo acidente de automóvel em que ela faleceu. Com uma segurança fenomenal, troca-lhe as voltas, impedindo-o de a despachar (sozinha, de comboio) para casa dos tios e forçando-o a incluí-la nas pequenas vigarices com que vai sobrevivendo. (A favorita: entregar a viúvas bíblias pretensamente encomendadas - mas ainda não pagas - pelos falecidos maridos.) Progressivamente, a situação complica-se e a polícia acaba atrás deles.
O filme nunca esclarece se entre Addie e Moses existem laços familiares. Ela desconfia que sim e pergunta-lhe logo de início se é o pai dela. A resposta vem negativa, mas sabemos desde cedo - como Addie também sabe - que ele mente com naturalidade. Mente tanto que poderá até estar a mentir sobre o nome, tão adequado a um vendedor de bíblias: «Moses», de Moisés, e «Pray», de rezar. Na verdade, o nome constitui todo um tratado de ironia. Estamos perante um Moisés muito fraco, péssimo enquanto guia (físico ou espiritual), raramente disponível para ouvir a voz da razão, e que pura e simplesmente não reza. Foneticamente, «Pray» também pode ser «presa», uma designação muito mais apropriada à personagem. Igualmente irónico - numa forma, digamos, metacinematográfica - é o facto dos actores serem mesmo pai e filha, e de existirem indícios de que Ryan não terá sido o que se classificaria de pai ideal.
Um palavra também sobre Bogdanovich. Fez parte de uma geração de realizadores que despontava no início da década de 70 e vinha altamente influenciada por todo o cinema que acontecera antes. Incluía pessoas como Martin Scorsese, Steven Spielberg, Michael Cimino, Francis Ford Coppola e William Friedkin(*). Todos eles marcaram a época e o cinema, mas vários acabaram por ter carreiras irregulares. Bogdanovich nunca mais atingiu o nível dos seus três primeiros filmes: este Paper Moon, de 1973, e os anteriores The Last Picture Show, de 1971 (com uns muito novos Jeff Bridges, Cybill Sheperd e Cloris Leachman) e What's Up, Doc?, de 1972, que (tanto quanto recordo, dado não o ver há uma eternidade) conseguia tornar Barbra Streisand suportável. (As minhas desculpas à verdade histórica, se por acaso a minha memória se adocicou com o tempo, e aos fãs da senhora, em qualquer circunstância.)
Apesar da situação em que Addie se encontra, Paper Moon não é sentimentalista. Pelo contrário, todo o filme é perpassado por uma recusa em vitimizar Addie. A Grande Depressão fizera os tempos difíceis para quase toda a gente. Outras crianças haviam perdido os pais ou, mantendo-os, sofriam maiores dificuldades. A própria Addie tem consciência disto. Sabe que, em termos puramente materiais, não se está a sair mal. Chega mesmo a propor-se ajudar pessoas em pior situação - enquanto simultaneamente cobra mais pelas bíblias àquelas que lhe parecem estar bem na vida (Moses detesta ambas as ideias, no primeiro caso por não querer dispensar dinheiro, no segundo por recear que o excesso de ganância faça com que sejam apanhados - e também por a ideia não ter sido dele). Esta falta de sentimentalismo estende-se a várias cenas politicamente incorrectas: a polícia dispara sem pejo sobre um veículo onde se encontra uma criança, Addie fuma (é verdade que, de início, contra a vontade de Moses) e viaja nos automóveis de um modo que só pode causar desconforto nestes tempos de cadeirinhas obrigatórias e sistemas Isofix. Ainda que também sirvam propósitos de comédia (mas a comédia é uma recusa do sentimentalismo), estas cenas contribuem para situar a acção numa época e para deixar no espectador uma imagem indelével de Addie Loggins. De certo modo, Addie (esplêndida Tatum O'Neal ainda com tudo pela frente) poderia ser uma personagem de Dickens: agreste, voluntariosa, manipuladora, sincera, indomável, carente. Uma criança orfã a fingir de adulto em tempo de dificuldades.
Uma das cenas mais difíceis de rodar. Filmada em contínuo numa estrada deserta, bastava um erro no diálogo para ter de voltar-se ao início.
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(*) Os dois últimos foram produtores executivos de Paper Moon.
Nos anos seguintes protagonizou vários outros sucessos de bilheteira, uns mais prestigiantes, como From Here to Eternity (Fred Zinnemann, 1954), onde perturbou inúmeras damas ao rebolar com Deborah Kerr na areia de uma praia havaiana, outros mais claramente populares, de que Vera Cruz (Robert Aldrich, 1954) é um bom exemplo. (The Crimson Pirate, do mesmo Siodmak que o lançara em The Killers, seria outro, com a vantagem de poder ser usado para demonstrar o temperamento explosivo de Lancaster: de tal forma incompatibilizado com ele durante as filmagens, Siodmak decidiu abandonar Hollywood e fazer o resto da carreira na Europa.) Em Vera Cruz, um Western passado no México, Lancaster é um sacana irresistível, cara escurecida pelo sol e amplo sorriso de dentes brancos (ele chamava-lhe «the grin»), a quem se perdoa quase tudo: a ambição desmedida, a falta de honra, a displicência com que encara a morte alheia; apenas a circunstância de comer com as mãos e de boca aberta, sucos escorrendo-lhe pelo queixo, faz com que não se consiga simpatizar a 100% com a personagem. Gary Cooper, na fase terminal da carreira (dois anos depois de High Noon, quatro antes de Man of the West) contracena com Lancaster, mostrando ser um dos poucos colegas de profissão capazes de o olharem de cima (Lancaster media 1,85 m, Cooper 1,91 m). Vera Cruz inclui ainda uma muito atraente Sarita Montiel, revolucionários pobres com princípios admiráveis, autoridades ricas com princípios detestáveis, uma carruagem vermelha com fundo falso e aquela incrível capacidade - só existente nos Westerns - de fazer saltar a arma do adversário com uma bala sem lhe causar sequer um arranhão. Por outras palavras: não é um Western essencial mas é um Western divertido.
Tendo formado uma companhia de produção ainda na década de 1940 (primeiro Norma Pictures, em homenagem à mulher, depois Hecht-Lancaster, finalmente Hecht-Hill-Lancaster), responsável por vários êxitos nos anos seguintes (incluindo Vera Cruz), em 1957 Lancaster decidiu produzir e - algo inicialmente não previsto - interpretar, ao lado de Tony Curtis, Sweet Smell of Success. O filme é uma obra-prima mas deveria talvez chamar-se Sour Smell of Unsuccess porque quase levou a companhia à falência. As coisas correram mal desde o inicio. O argumentista Ernest Lehman retirou-se por doença, tendo o guião sido completamente reescrito por Clifford Odets, num processo que se prolongou pela rodagem. Lehman mostrara desejo de realizar o filme mas essa tarefa acabou entregue ao inglês Alexander McKendrick, que fizera carreira nos estúdios Ealing (vinha de dirigir o brilhante The Ladykillers). Com a ajuda da cinematografia de James Howe e da música de Elmer Bernstein, Odets e McKendrick geraram um filme genial que, todavia, deixou em choque os fãs das duas estrelas (no caso de Curtis, constituídos em grande medida por raparigas adolescentes). Lancaster encarna o poderoso, arrogante e manipulativo colunista nova-iorquino J.J. Hunsecker (segundo se diz, inspirado em Walter Winchell), que fará o que for necessário para impedir a irmã (com quem partilha residência e por quem está claramente apaixonado) de casar com um músico de jazz. Por seu turno, Curtis é o relações públicas Sidney Falco, disposto a tudo para satisfazer os caprichos de Hunsecker e subir na vida. Lancaster e Curtis engolem os inexperientes Susan Harrison (no papel da irmã de Hunsecker) e Martin Milner (no papel do músico de jazz) em toda e qualquer cena onde entram mas isso apenas acrescenta força ao filme. Sweet Smell of Success, um filme negro até em sentido literal (a esmagadora maioria das cenas ocorre durante a noite), ocupa hoje um dos lugares de topo na carreira de qualquer dos seus protagonistas mas, à época, poucas pessoas estavam dispostas a vê-los em papéis tão ferozmente desagradáveis. Lancaster achou tão pouca piada ao amargo odor do insucesso que, num encontro casual com Ernest Lehman, acusou-o de ser o principal responsável pelo falhanço e ameaçou esmurrá-lo. Lehman terá respondido: «Faça-o. Preciso do dinheiro.»
Apreciando sucesso comercial, em especial quando tinha dinheiro próprio em risco, Lancaster virava-se no entanto cada vez mais para papéis exigentes e prestigiantes. Ganhou um Óscar por Elmer Granty (Richard Brooks, 1960), criou pássaros em O Prisioneiro de Alcatraz (John Frankenheimer, 1962), foi até Itália filmar Il Gattopardo (1963) com Luchino Visconti (este aceitou-o contrariado e tratou-o mal até ao dia em que, em pleno set, Lancaster o convidou a acompanhá-lo à sala ao lado; depois da conversa a dois - bastante audível do exterior -, ficaram amigos) e, em 1964, deslocou-se a Paris para filmar The Train com o mesmo Frankenheimer que realizara O Prisioneiro de Alcatraz (eu sei, com tal apelido era improvável que fosse outro). The Train começou por ser um projecto modesto sobre a resistência francesa ao roubo de obras de arte pelos nazis mas acabou transformado no último grande filme de acção rodado a preto e branco.
Lancaster é Labiche (nome de heroicidade duvidosa mas, como na vida, nem todos os heróis cinematográficos têm a sorte de serem baptizados Luke Skywalker, Snake Plissken ou Max Rockatansky), líder de um grupo de resistentes que trabalham para os caminhos de ferro. O coronel Von Waldheim (Paul Scofield) é um amante de arte que, vendo a guerra perdida (no inicio do filme, os aliados estão a poucos dias de Paris), resolve meter parte do espólio dos museus parisienses num comboio e fazê-lo dirigir-se à Alemanha. O resto do filme consiste numa sequência de sabotagens e perseguições, que inclui ataques aéreos e um choque entre comboios (mais realista do que muitas congeminações digitais dos dias que correm), filmadas com o estilo directo que Frankenheimer sempre privilegiou (relembrem-se as perseguições automóvel do seu último grande êxito, Ronin, filmado um quarto de século mais tarde). The Train dá-se ainda ao meritório esforço de discutir se as obras de arte se destinam essencialmente a quem as sabe apreciar (o coronel acha que sim) e, mais importante, se a sua defesa justifica a perda de vidas humanas. A dada altura, voltando-se para um muito céptico Labiche, um dos resistentes dá talvez a única resposta possível: «Alguma vez viste qualquer dos quadros que estão no comboio? Eu não. Sabes, depois disto acabar, acho que devemos ir dar uma olhadela.»
The Train foi outro sucesso comercial na carreira de Lancaster, numa fase em que ele evitava os filmes de grande espectáculo. Contudo, participaria noutro apenas dois anos mais tarde. The Professionals (Richard Brooks, 1966) constituiu não apenas o regresso a um tipo de personagem que ele costumava desempenhar na primeira década da carreira (em Vera Cruz, por exemplo) mas também uma espécie de despedida - dele em relação aos Westerns tradicionais (que não aos Westerns tout court) e destes em relação à sua época de ouro (Peckinpah preparava-se para mudar as regras e os anos setenta torná-los-iam antiquados). The Professionals vai buscar inspiração a The Magnificent Seven (já uma adaptação de Os Sete Samurais, de Kurowasa) e é um dos vários filmes saídos na década de 1960 nos quais um grupo de homens se propõe executar uma missão quase suicida (outros exemplos são The Guns of Navarone, The Dirty Dozen e Where Eagles Dare). Apresenta um conjunto de quatro especialistas (interpretados por Lee Marvin, Burt Lancaster, Robert Ryan e Woody Strode) que um magnata (Ralph Bellamy) contrata para lhe recuperarem a mulher (Claudia Cardinale), pretensamente raptada por um revolucionário mexicano (Jack Palance). Porém, nem tudo é o que parece e, a haver rapto, talvez não seja por parte do mexicano. O filme tem excelente cinematografia, óptimas cenas de acção (demonstrativas de como, aos cinquenta e poucos anos, Lancaster - que apenas deixaria de fazer jogging já depois dos setenta - ainda se encontra em invejável forma física) e uma sequência entre as personagens de Lancaster e de Palance que, para além de um jogo do gato e do rato, se revela também uma inesperada discussão filosófica sobre o amor, a guerra e as fidelidades e traições que um e outra originam (ambas as personagens estão feridas e vão conversando enquanto procuram a melhor posição para disparar). No final, o amor acaba por vencer tanto a atracção pelo dinheiro como o poder formal do casamento, uma solução que o código Hays - prestes a cair - teria tornado difícil apenas uma década mais cedo (não atacar a instituição do matrimónio era uma das suas várias alíneas).
Mais ainda do que Breakfast at Tiffany's, Two For The Road é um filme agridoce. Ambos possuem momentos divertidos, leves, que geram optimismo, mas onde Breakfast at Tiffany's tem melancolia, Two for the Road apresenta quase sempre acidez. Isto faz com que seja mais difícil gostar dele. E a estrutura - fragmentada, com saltos temporais constantes - não ajuda. (Como seria de esperar, o trailer, mostrado acima, evita quase totalmente os momentos de infelicidade.)
O conceito do filme é simples: seguimos Mark (Albert Finney) e Joanna (Hepburn) numa série de viagens através de França. A mais antiga corresponde àquela onde se conheceram e apaixonaram. As restantes, a diferentes fases da relação. Viajam quase sempre sós, num dos casos acompanhados por outra família. O filme salta entre as viagens sem aviso, obrigando o espectador a situar-se através dos veículos utilizados (progressivamente menos irreverentes), das roupas, dos estilos de penteado e, acima de tudo, do ponto da relação (progressivamente menos feliz).
O guião foi escrito por Frederic Raphael, autor de guiões para filmes como Darling, de John Schlesinger (protagonizado por uma Julie Christie em início de carreira, talvez ainda surja nesta série) e Eyes Wide Shut, de Stanley Kubrick. Raphael admitiu tê-lo baseado nas suas próprias viagens com a mulher. Mas - e também isto ele admite - o diálogo não é exactamente realista. Por num ou noutro momento as terem usado, todos os casais com vários anos de relacionamento reconhecerão as acusações, as indirectas, as ironias. Mas ninguém consegue réplicas tão rápidas e mordazes, tão elegante e certeiramente cruéis, de forma tão consistente. Como num filme ou numa série de um dos mais conhecidos argumentistas actuais, Aaron Sorkin, Two For The Road depura a realidade, concentrando-a em duas horas de encenação.
A realização é de Stanley Donen e custou-me sempre conciliar este filme com os musicais que lhe marcaram a carreira - On the Town (1949), Singin' in the Rain (1952), Seven Brides For Seven Brothers (1954) - ou mesmo com o seu outro grande filme da década de 60, o já referido (no primeiro parágrafo) Charade. Fica-me a sensação de que, ao apoiar Raphael, que lhe propôs a ideia antes de escrever o guião, esperava um balanço mais claramente voltado para a comédia romântica. Mas não parecem ter existido discordâncias entre os dois, pelo que talvez Donen quisesse mesmo alterar o seu registo habitual.
A história de Audrey Hepburn é conhecida. Das dificuldades enfrentadas durante a Segunda Guerra Mundial ao trabalho de apoio à UNICEF, quase tudo foi já discutido até à exaustão. A rodagem de Two for the Road não terá coincidido com um dos períodos mais felizes da sua carreira - a que, excepto por umas quantas aparições fugazes, Audrey colocaria um ponto final dois anos mais tarde. A decisão da Warner Bros. de dobrar a sua voz nas canções de My Fair Lady - e a reacção de alguns críticos a esse facto - magoara-a. Pior: vivia os últimos tempos do casamento com Mel Ferrer, que durava desde 1954 e incluíra dois abortos espontâneos mas também o filho que sempre desejara. Em Two for the Road, encontra-se extremamente magra. Muitas das palavras que tem de dizer e ouvir seriam mais do que palavras escritas por um estranho, remetendo certamente para discussões com Ferrer. Mas nada disso transparece. Os momentos de tristeza parecem genuínos (e como aqueles olhos transmitiam tristeza) mas os momentos de alegria também parecem genuínos (e como aquela voz e aquele riso conseguem ser mais eficazes que qualquer antidepressivo). De resto, Joanna constitui a face optimista do casal. Mark é resmungão e agressivo ao ponto de chegar a sentir-se vontade de entrar no filme e lhe dar um murro no nariz. De dizer a Joanna: larga-o e parte para outra (ou talvez mais exactamente para outro, sendo que um espectador masculino nunca deixa de se colocar no papel desse «outro»). Mas Joanna não desiste, o que pode ser difícil de aceitar para algum público actual (especialmente feminino) porque hoje parece desistir-se mais cedo. Escolheu Mark (na viagem em que se conheceram, ele parecia mais interessado numa colega dela - Jacqueline Bisset, em estreia no ecrã), vê nele o que muitas vezes ele não consegue ver em si mesmo, sabe que grande parte das palavras que lhe saem da boca não são para levar a sério. Mantêm-se estóica, luminosa, quase sempre optimista. No final verifica-se que, pelo menos no ecrã (Hepburn e Ferrer divorciar-se-iam em 1968), havia razões para isso.
Anos mais tarde, questionado sobre a actriz com quem preferira trabalhar (uma pergunta que tende a ser respondida de forma politicamente correcta), Albert Finney não hesitou: «Audrey Hepburn.» Já Gregory Peck considerara as filmagens de Roman Holiday como as mais felizes da sua carreira. Não surpreende. Audrey era um caso especial. Como qualquer pessoa percebe ao ver os seus filmes.
Em abono de Montand, deve salientar-se que a perda de beleza de Signoret não quebrou a relação de décadas que mantiveram e que terminou apenas com a morte dela, em 1985, na sequência de cancro do pâncreas (Montand faleceu seis anos mais tarde e foi sepultado a seu lado, no cemitério Père Lachaise). De resto, ainda que cruel, o comentário mostra-se relativamente exacto (a rodagem de Casque d'Or correspondeu ao período inicial da relação entre ambos, tendo Montand - que não entrava no filme - assistido à filmagem de muitas cenas) e, acima de tudo, útil para perceber o temperamento de Signoret, que fumava e bebia em excesso, era senhora do seu nariz e se mostrava pouco preocupada com a manutenção da beleza da juventude (algo aparentemente impensável para as actrizes - e actores - dos dias de hoje, que começam a esticar a pele da cara mal saem da adolescência) mas muito preocupada com a genuinidade das suas interpretações. (Haverá certamente por aí quem se lembre dela na série policial Madame Le Juge, de 1978, transmitida pela RTP há cerca de 35 anos.)
Como tantas vezes no início da carreira, em Casque d'Or desempenha o papel de uma prostituta. Na Paris dos primeiros anos do século XX, Marie é a preferida de Roland, um criminoso que não vê com bons olhos a entrada em cena de Georges Manda (Serge Reggiani), carpinteiro desde que saiu da prisão por crimes que nunca ficam claros. Numa luta nas traseiras de um bar, Manda mata Roland. Leca, líder do bando a que Roland pertencia e também ele de olho em Marie, incrimina Raymond, amigo de infância de Manda. Para evitar que o amigo seja guilhotinado, Manda tem que escolher entre a liberdade (e Marie) e a confissão que o conduzirá à guilhotina no lugar do amigo.
O filme baseou-se numa história verdadeira ocorrida em 1898 e não teve grande sucesso em França aquando da estreia (ao contrário do que sucedeu em Inglaterra, onde Signoret ganhou um BAFTA). O tom de tragédia iminente terá algo a ver com o assunto, como talvez a recusa em fazer julgamentos de moral (Manda não julga o passado de Marie, a esta não interessa o dele) e a falta de tiradas grandiosas e de juras reiteradas de amor. A relação entre Marie e Manda desenvolve-se muito mais à base de gestos, posturas e, acima de tudo, olhares do que de palavras: Manda quase não se dirige a Marie em todo o filme e esta pouco fala com ele. Tem lógica (as palavras são supérfluas para pessoas que já viram muito e estão cientes da fragilidade da situação e da necessidade de aproveitar o pouco tempo disponível) mas terá sido um pouco desconcertante para o público (e para os críticos) de então. Porém, em grande medida, é este à-vontade imediato, instintivo, que transmite a sensação de estarmos perante um encontro de almas gémeas (estar confortável com os silêncios é algo que costuma ocorrer muito mais tarde nas relações). Jacques Becker, um realizador lento, perfeccionista, discretamente romântico, que - como Jean Renoir, de quem foi assistente - gostava de filmar em exterior sempre que possível (o que fazia disparar os custos), reforça esta sensação através de imagens luminosas, precisas, sem elementos supérfluos, ainda que frequentemente pontuadas com detalhes do quotidiano.
(Casque d'Or pode não ter tido sucesso comercial mas marcou várias pessoas, entre as quais uma rapariga chamada Eunice Waymon, nascida na Carolina do Norte em 1933, que adoptaria o nome artístico Nina Simone em homenagem ao desempenho de Signoret.)
Becker - que nunca obteria um grande sucesso de bilheteira - não foi o primeiro realizador a pegar no projecto de Casque d'Or. Porém, torna-o seu conferindo-lhe uma simplicidade e uma fluidez desarmantes (características dificílimas de obter mas tantas vezes desvalorizadas). Intuindo-se que dificilmente o final será feliz, há na forma como a história se encontra apresentada uma faceta de redenção, de aproveitamento pleno do pouco tempo disponível, que a torna estranhamente optimista - talvez uns quantos dias de felicidade absoluta valham mais do que uma vida de frustrações. Signoret e Reggiani eram actores com estilos muito diferentes - ela mais instintiva, ele mais necessitado de «habitar» a personagem - mas criam ambos figuras memoráveis. Sem uma ponta de overacting, Reggiani compõe um solitário de poucas palavras que não deseja problemas mas não recua perante eles e a quem o destino surge sob a forma de um amor incontornável. Quanto a Signoret, imbui Marie de uma dignidade e de uma força por vezes roçando a insolência (é ela quem escolhe Manda desde o início, circunstância que torna o final ainda mais pungente) que transformam a Casque d'Or numa das personagens femininas mais marcantes da história do cinema e viriam a caracterizar muitos outros papéis seus (recorde-se, por exemplo, a amante preterida de Room at the Top). Nos melhores e nos piores momentos, Marie domina - e ilumina - a tela. Esteja o seu cabelo de ouro apanhado ou caindo-lhe esplendorosamente sobre os ombros.
A vítima julga-se o caçador. E depois é tarde.
Um minuto de imobilidade e silêncio parece-me claramente insuficiente.
(Desculpem; é mais forte do que eu. Ignorai-me e passai uma excelente Páscoa.)
Há outra presença feminina inesquecível em Wild River, de Elia Kazan: Jo Van Fleet, no papel de Ella Garth, uma mulher íntegra e teimosa que luta pelo direito a permanecer - enquanto viva e também depois de morta - na terra que ela e o marido reclamaram há dezenas de anos e sob a qual ele já se encontra. Mas os olhos azuis, a pele luminosa e a repentina sede de viver de Carol, a personagem interpretada por Lee Remick, ofuscam.
É estranho que Remick esteja mais ou menos esquecida. Depois de vários anos na televisão, começou a carreira cinematográfica em filmes como The Long, Hot Summer, de Martin Ritt, contracenando com Paul Newman (Joanne Woodward tinha o principal papel feminino), e Anatomy of a Murder, de Otto Preminger, ao lado de James Stewart (já como actriz principal). Em 1960 veio Wild River e, ao longo da década seguinte, obras de Blake Edwards, Carol Reed, Arthur Hiller e John Sturges. Nos anos 70 a sua estrela começo a perder brilho (ainda assim, é forçoso mencionar o icónico The Omen, de Richard Donner, com Gregory Peck) e acabou de regresso à televisão, antes de falecer, nova de 55 anos, em 1991.
Wild River (Quando Rio se Enfurece) é um Kazan ligeiramente menos teatral do que as suas obras da primeira metade da década de 50 (Um Eléctrico Chamado Desejo, Há Lodo no Cais, A Leste do Paraíso). Pode até ser visto como uma primeira versão do filme seguinte, Esplendor na Relva. Inclui, porém, quase todas as suas marcas registadas: method acting, luta entre forças desiguais, preocupações sociais (neste caso, ligadas à questão racial), desejos reprimidos, paixões que se confundem com amor e são sobretudo desejo de escapar à realidade em que se vive. Wild River acompanha os esforços de Chuck Glover, funcionário de uma agência governamental, para convencer Ella Garth a abandonar a sua pequena ilha no rio Tennessee, uma vez que as águas irão subir na sequência da construção de uma barragem. Chuck é Montgomery Clift, em versão pós-acidente de automóvel, que lhe alterou muito mais do que o rosto, como ficaria ainda mais visível no filme seguinte: The Misfits, de John Huston, com Marylin e Clark Gable. (*)
Quando Chuck aparece, Carol, a neta da dona da ilha, está viúva há três anos (desde os 19). Tem dois filhos a cargo e encontra-se resignada ao desencanto e à proposta de casamento de um pretendente local, bastante mais velho. Chuck também é mais velho (Clift fez 40 anos em 1960; Remick, 25) mas vem de fora e, mais importante, não ficará por ali. É uma oportunidade, uma esperança repentina a que por vezes - de modo a evitar desilusões - ela tenta resistir. A certa altura, diz-lhe que o ama e talvez seja verdade (as circunstâncias desempenham um papel crucial no despoletar das paixões) mas encontra-se acima de tudo a tentar convencê-lo e a tentar convencer-se a si própria, justificando de caminho as traições que sente estar a cometer: à avó, à terra que esta defende com unhas e dentes, ao (surpreendentemente íntegro) pretendente local, a um outro método de arranjar marido. Como em quase todos os filmes de Kazan, a sexualidade é intensa e carnal mas nasce das poses, das hesitações, das palavras ditas e deixadas por dizer, dos gestos e dos olhares, das respirações, muito mais do que de cenas de sexo. Nasce também da beleza física de Remick. Esta, juntamente com o ardor e vergonha que dominam a personagem, constituem um cocktail a que poucos homens (ainda que nada interessados em ver-se de súbito com uma esposa e dois filhos) conseguiriam resistir. Kazan (e Paul Osborn, que escreveu o guião, baseado em livros de William Bradford Huie) sabia-o. Mas também sabia que uma relação assim dá parcas garantias de felicidade. O final parece feliz mas deixa no ar ambiguidade suficiente para o espectador apenas se poder permitir manter uma ligeira esperança de que tudo correrá bem. E fá-lo porque Carol - luminosa Remick - merece-o.
(*) Em 1956, Clift embateu com o seu Chevrolet contra uma árvore quando saía de uma festa em casa de Elizabeth Taylor. Conta-se que ela lhe salvou a vida, ao remover dois dentes que lhe bloqueavam a garganta.
Nota: Os mais perspicazes (vocês sabem quem são; nah, sabem nada) terão depreendido pelo título que é suposto este texto dar início a uma série. Gostaria de informar que não faço promessas quanto à regularidade e duração da mesma. Se conseguir convencer-me a escrever textos mais curtos (facilitam tanto a vida...), talvez saia um por semana. Caso contrário, no Natal isto já deve ter chegado ao nº 2.
Tracks, de John Curran.
Se Só os Amantes Sobrevivem e Debaixo da Pele partem de olhares externos sobre a condição humana (usando um par de vampiros e uma alienígena, respectivamente), Tracks usa a receita mais habitual de seguir as acções de um humano que se sente insatisfeito e desenquadrado, que não sabe o que quer da vida mas sabe que quer algo de diferente. Um humano que resolve tentar encontrar-se através de um desafio aparentemente sem sentido, exigindo isolamento e tenacidade.
Há uma diferença fundamental entre, por um lado, Jim Jarmusch e Jonathan Glazer e, por outro, John Curran: para o bem e para o mal, Curran não é um “autor”. Isso evita-lhe toques que poderiam ser acusados de pretensiosismo mas não lhe permite escapar a um ritmo que, embora lento, é bastante mais hollywoodesco do que o de Só os Amantes Sobrevivem ou Debaixo da Pele. Não lhe permite também escapar a vários clichés. E se, considerando o tema, a tendência para mostrar paisagens deslumbrantes (ainda que frequentemente agrestes) até se justifica, a abordagem da relação entre Davidson e Smolan nem por isso. Sendo certo que, em boa medida, é através dela que o processo de (re-)socialização progressiva de Robyn nos é mostrado, a relação “soa” a falso e a evolução de Smolan, de cretino bem-intencionado (ao ponto de ofender a comunidade aborígena, forçando Robyn a efectuar uma alteração ao trajecto previsto) para alguém mais maduro, respeitador de esferas e decisões alheias, é demasiado rápida e esquemática. Mais conseguidas são as cenas em que Robyn estabelece contacto com os membros da comunidade aborígene ou os encontros com turistas (Davidson tornou-se notícia, sendo conhecida como a Camel Lady) e com um motociclista tentando bater um recorde qualquer, que admite nem sequer ter tempo para ver a paisagem. Acima de todos elas, porém, encontram-se as que a mostram sozinha no deserto com o cão e os quatro camelos. (Tracks é um filme que poderá desagradar a quem se irrita com pessoas que parecem preferir animais a humanos.) É aí que os planos metafísico e (extremamente) físico da viagem se impõem. É também aí que o trabalho de Mia Wasikowska surge em todo o esplendor.
Wasikowska (também australiana) vem fazendo escolhas sui generis desde que chamou a atenção como Alice, no filme de Tim Burton. Em Tracks, é inteiramente credível, na forma como lida com os animais, com as consequências físicas da viagem, com os momentos de dúvida, exasperação, dor, apatia, medo e tristeza.
O filme evita alongar-se sobre possíveis motivações. Excepto por uma série de flashbacks que nos levam à infância de Robyn (a mãe suicidou-se quanto ela tinha 11 anos mas o filme não explora demasiado essa perda, parecendo até considerar outra, ocorrida por essa altura, como mais importante), não conhecemos Robyn antes de chegar a Alice Springs. A única alusão aos anos de vida boémia é a visita (insuportável para Robyn) de um grupo de amigos, logo no início do filme. Mesmo assim, talvez tivesse sido preferível nem sequer incluir esses momentos. Ainda que seja a primeira pergunta a sair dos lábios de quase toda a gente confrontada com decisões difíceis de entender, o «porquê» é frequentemente desnecessário. Num momento ou noutro, todos os seres humanos sentem vontade de se afastar de tudo – e em especial dos outros humanos. Interessante é perceber se a viagem funciona como meio de reaproximação.
Tracks é ligeiramente fragmentado e incoerente, por vezes banal. Um realizador mais destemido talvez pudesse ter extraído da história uma obra-prima. Ainda assim, inclui momentos sublimes e, ao contrário de tantos outros filmes, ficou-me na memória. Provavelmente por apelar à minha bem desenvolvida costela de eremita – uma vez que (e ainda que o filme me tenha levado a apreciá-los um pouco mais) fã de camelos não sou.
* Os camelos foram introduzidos na Austrália pelo homem. Com o desenvolvimento do automóvel, a sua utilidade desapareceu e muitos foram libertados, multiplicando-se em estado selvagem.
Debaixo da Pele, de Jonathan Glazer.
Os últimos vinte minutos, quase sem diálogo, são assombrosos. A alienígena corta com o seu mundo e tenta perceber o nosso. Está completamente impreparada para o conseguir e, no entanto, de certa forma vai consegui-lo. Vai perceber que uma das características humanas mais fortes é a aleatoriedade dos comportamentos, mesmo quando nascidos de impulsos similares (neste caso – como tantas vezes –, de índole sexual). Que um ser desamparado e estranho tanto pode encontrar a bondade (a qual, ainda assim, traz consequências) como a violência. Assistir a Debaixo da Pele é como ver um animal selvagem ganhar progressivamente consciência. E pagar o preço inevitável.
Só os Amantes Sobrevivem, de Jim Jarmusch.
Jarmusch é pessimista e, com frequência, pretensioso. Esta história de dois vampiros transbordantes de estilo e ennui tinha todos os ingredientes para exasperar. Adam e Eve (pun claramente intended) estão vivos e – não obstante viverem em cidades diferentes no início do filme – apaixonados um pelo outro há centenas de anos. Conheceram poetas, dramaturgos, filósofos. Adam é músico. Chegou a oferecer um adágio a Schubert (que o melhorou). Evitam o contacto com os humanos (a que se referem como zombies) e até com outros vampiros, menos intelectuais, mais impulsivos, simultaneamente mais perigosos (a discrição é fundamental, numa época em que andar por aí a beber sangue humano dá demasiado nas vistas) mas também mais integrados nos tempos actuais. Tempos incultos, de espectáculos básicos e reality shows, que Eve suporta à base de leitura, estoicismo e pragmatismo mas que deprimem Adam profundamente. De entre os poucos vampiros com que se dão, realça-se um idoso Kit Marlowe, o – como poderia ser de outra forma? – verdadeiro autor das peças atribuídas a Shakespeare.
Por atraente que a premissa seja, o filme tem problemas. Um deles está em raramente admitir que na actualidade ainda são produzidas obras culturais dignas de registo. Há uma cena na qual Eve mete livros numa mala e The Infinite Jest, de David Foster Wallace, é claramente visível. Há outra, em Tânger, perto do final, na qual Adam e Eve assistem mesmerizados a um espectáculo da libanesa Yasmin Hamdan. Pouco mais. Outro está na forma glorificada como o passado nos é apresentado. Se o Renascimento e o Iluminismo foram épocas de avanços nos campos político e cultural, não deixaram por isso de ser tempos em que, percentualmente, muito mais gente estava impedida de aceder à cultura (e mesmo à literacia) e vivia sob regimes autoritários altamente classistas. Jarmusch parece assim lamentar o processo de democratização da cultura, por – segundo ele – induzir um decréscimo de qualidade. Trata-se de uma tendência comum em que eu próprio já caí. Mas, ainda que possa ter uma componente de verdade, é simplista.
O que salva o filme? Acima de tudo, o romantismo. A relação intensa, paritária, separada do mundo, entre Adam e Eve. O estilo, também – é mais um Jarmusch nocturno, desolado mas belo, em que os bairros abandonados de Detroit surgem como paradigma da decadência humana e as ruas de Tânger como uma hipótese de comunidade. Os actores, excelentes, ainda que desempenhando papéis que se prestam a tal. Tilda Swinton, Tom Hiddleston, John Hurt e a ubíqua Mia Wasikowska (seis filmes nos últimos dois anos, sendo que abordarei outro no terceiro texto desta mini-série) agarram com unhas e dentes papéis que (nos casos de Swinton, Hiddleston e Hurt) lhes permitem exprimir de forma inteligente e plena de estilo (estes são vampiros tão cool que até dói) a propensão para o pessimismo – para o niilismo, mesmo – que afecta a parte bem pensante da sociedade actual.
Para o espectador (para mim, em todo o caso), Só os Amantes Sobrevivem é um mergulho culposo no prazer do pessimismo e da depressão, em nome da capacidade salvífica da cultura (como elemento verdadeiramente diferenciador do ser humano) e de um romance belíssimo, resistente à passagem dos séculos, que (e será esse o verdadeiro raio de luz do filme) permite acalentar esperanças na existência de uma versão à escala humana, com a duração de algumas décadas.
Excerto 1
Ingrid Bergman nasceu em Estocolmo em 1915. Com 12 anos tinha perdido ambos os pais mas era forte – as pessoas espantar-se-iam com a sua força interior durante toda a sua vida – e estava determinada a fazer carreira no palco. Cresceu alta e bela, com uma energia dramática que poucos haviam encontrado antes. Começou a fazer filmes na Suécia no papel de ingénue e estava a ser considerada para um contrato na Alemanha com os estúdios Ufa. (A sua mãe era alemã.) Mas no edifício nova-iorquino onde David Selznick tinha escritórios havia uma operadora de elevador sueca a que tinham chegado notícias de casa sobre quão gloriosa era esta Ingrid Bergman. Passou a opinião (conversa de elevador) a Kay Brown, uma das pessoas que descobriam coisas para Selznick. Descobrira E Tudo o Vento Levou, Rebecca, e mais tarde repararia na rapariga que se transformaria em Jennifer Jones mas nesta altura disse: «Há esta rapariga sueca…»
Para abreviar a história, Kay Brown foi à Suécia conhecer Ingrid. Encontrou uma mulher recém-casada com um bebé. Estaria ela disposta a desistir disto para ir para a América?, perguntou Kay Brown. Oh, sim, disse Ingrid, olhos bem abertos. É uma lenda moderna que as pessoas farão o que quer que seja pelo cinema.
Ela veio. Ela atravessou a América. Ela dirigiu-se à casa de Selznick, em Summit Drive, em Hollywood, num domingo, mas David estava nos estúdios – era 1939 e trabalhava em E Tudo o Vento Levou. Por isso a sua mulher, Irene Selznick, tomou conta de Ingrid (tornar-se-iam amigas) e levou-a a jantar e a uma festa. Selznick continuava sem aparecer. Por isso Ingrid dormitou e então Selznick apareceu. Olhou para ela e disse, Oh, meu Deus, você é alta, e os seus dentes, e precisa de maquilhagem, e o seu nome é demasiado alemão. Ingrid ergueu-se até à extensão total do seu metro e setenta e oito e disse, Olhe, isto é o que eu sou; isto é o que vai ter. Selznick sorriu e disse, Okay, vendê-la-emos como a mulher natural.
Numa questão de anos tornou-se a namoradinha da América.
Excerto 2
De facto, não obstante o marido e a filha (já na América), Ingrid era uma consumidora de homens compulsiva. Quando os homens gostavam dela e lho diziam, sentia-se sensibilizada e generosa e dormia com eles. É uma questão de segurança: se estranhos sentem dever amar uma estrela, ela pode recompensar quem quer que encontre.
David Thomson, The Big Screen – The Story of the Movies.
Edição Farrar Straus and Giroux, tradução minha.
Um jogo raro estava a ser jogado, suficientemente bom para uma comédia de Hawks, no qual um realizador está pronto a apaixonar-se pela sua actriz mas mantém a mulher por perto para fingir que não. Quando Bacall e Bogart se apaixonaram, Howard foi apanhado de surpresa. (Bogart tinha quarenta e cinco anos; Bacall tinha vinte.) O realizador disse que o romance deles estava a estragar o filme.
David Thomson, The Big Screen – The Story of the Movies. Edição Farrar Straus and Giroux, tradução minha.
Obviamente, não estava. Na adolescência, apesar da minha desesperante falta de jeito para assobiar, To Have and Have Not era o meu filme favorito. Ainda hoje continuará perto do topo (evito fazer esse tipo de listas). Tinha suspense, música, humor e, acima de tudo, Lauren Bacall, envolvida num delicioso jogo de sedução com Humphrey Bogart. Um jogo baseado em olhares (the Bacall look, nascido do nervosismo inicial aquando dos screen tests, que a levou a baixar a cabeça e a rodar os olhos para cima) e frases provocantes, tão inocente pelo padrões actuais mas tão verdadeiro que, como o surpreendido e ligeiramente enamorado Howard Hawks comprovou, extravasou das personagens para os actores, dando origem a uma das relações mais sólidas (ainda que, como qualquer relação, não isenta de tensões) que Hollywood já viu. Depois, ainda com Hawks (um apreciador de mulheres fortes que, no final, faziam o que os homens desejavam) houve The Big Sleep, o filme em que uma morte ficou por explicar (que importa?) e em que ela, apesar de Slim (uma alcunha transferida de Nancy Gross, a mulher de Hawks), encarnou na perfeição uma heroína de Chandler, e depois houve Dark Passage e Key Largo (ao lado de Edward G. Robinson no segundo, ao lado de Bogart em ambos) e mais uma série de filmes onde se destaca How to Marry a Millionaire, contracenando com uma Marylin Monroe pitosga, no tipo de papel que lhe encaixava na perfeição: o de calculista que, após uma série de contratempos (as más intenções sempre mereceram punição no cinema comercial de Hollywood), acaba por revelar um coração mole e é devidamente recompensada pelo destino. Porém, a partir de certa altura, a sua imagem, de inteligência mordaz mas bem intencionada, uma mistura de fragilidade (real) e altivez (nada real no início, talvez um pouco com o avançar dos anos), pode ter sido mais prejudicial do que útil: o que numa jovem é encantador, numa mulher de meia idade é irritante - pelo menos para os produtores cinematográficos. Qualquer que tenha sido a razão, desde a década de 50 Bacall entrou em poucos filmes verdadeiramente dignos de nota, tendo perdido o Óscar de melhor actriz secundária (para Juliette Binoche, por O Paciente Inglês) em 1996 (o filme era The Mirror Has Two Faces, um projecto de Barbra Streisand de que recordo aproximadamente zero).
Os tempos áureos de Hollywood, em que os estúdios faziam o que queriam (a Lauren mudaram-lhe desde logo o nome de baptismo, Betty Joan Perske, e obrigaram-na a adoptar um tom de voz mais rouco) viram outras actrizes com personalidade forte. Marlene Dietrich, por exemplo, que disse a Hawks: «Aquilo sou eu há vinte anos»; Louise Brooks, um cometa explosivo ainda nos tempos do cinema mudo; Rosalind Russell, taco a taco com Cary Grant em His Girl Friday (outro filme de Hawks); Tallulah Bankhead, famosa (ou quiçá infame) apesar da carreira essencialmente teatral (Lifeboat, de Hitchcock, será o único filme digno de registo em que participou); Joan Crawford, luminosa em várias obras na década de 30 (rouba todas as cenas a Garbo em Grand Hotel), funérea já na de 50, no Johnny Guitar; e, com talvez mais pontos de contacto com Bacall do que qualquer outra, Katharine Hepburn, firme e mordaz ao ponto da insolência, apaixonada por um colega mais velho (Spencer Tracy), actriz principal de Hawks em Bringing Up Baby, dando réplica a Bogart em A Rainha Africana. (Quando Bogart contraiu cancro do esófago, Hepburn e Tracy foram visita frequente.) Todas belíssimas, todas extraordinárias, mas nenhuma com a conjugação de Bacall: beleza, inteligência, força, fragilidade – e aquela voz treinada para nos encantar. Seja como for, a partir de hoje estão outra vez juntas.
Costumávamos acreditar que o ecrã existia apenas para nos ajudar a ver as imagens, a história, e a ilusão de vida. Mas agora estamos mais desconfiados e supomos que todos estes ecrãs são coisas reais, ferramentas fabulosas, é claro, mas barreiras subtis entre nós e a vida.
A cerimónia dos Óscares já foi há quase três semanas mas gostava de voltar às quedas de Jennifer Lawrence (para distraídos: uma no ano passado, quando subia ao palco para receber o prémio, outra este ano, ao sair do carro no exterior do edifício). Claramente, a rapariga não sabe conjugar vestidos de noite com sapatos de salto alto mas isso só a torna (ainda) mais simpática aos meus olhos. Numa classificação tão aleatória como estas classificações tendem a ser, para mim há três tipos de actrizes em Hollywood: as que assumem a imagem de estrelas e planam ligeiramente acima de todos os restantes mortais, incluindo os colegas de profissão (Charlize Theron e Angelina Jolie são os exemplos possíveis, nesta época tão afastada do star system de há seis ou sete décadas); as que se definem pelo trabalho e, até mesmo quando enfiadas em vestidos de gala, permanecem ligadas à Terra (Julia Roberts, Meryl Streep, Amy Adams, Jessica Chastain); as que gostariam de atingir uma das duas primeiras categorias mas enfrentam dificuldades em escapar de um nível onde são encaradas com alguma condescendência (Jennifer Anniston, Reese Witherspoon - não obstante Walk the Line -, Jessica Biel, Kristen Stewart). Jennifer Lawrence, claro, é um caso típico do segundo grupo, apesar de muita gente andar a tentar metê-la no primeiro (demasiado nova; dêem-lhe pelo menos dez ou quinze anos para perder espontaneidade e aprender a equilibrar-se nos saltos altos). As suas quedas funcionam como aqueles detalhes que os grandes actores acrescentam aos papéis. Algo que, parecendo acessório, acaba por fazer a diferença na forma como os recordamos. Em parte devido às quedas, Lawrence já é das pessoas mais memoráveis da cerimónia.
** Actriz de ascendência alemã premiada em 1936 e 1937.
Não, como todos os aspirantes a paladino dos pobres ao longo da história humana, Sugar tem de confrontar-se com uma verdade humilhante: os oprimidos podem desejar ser ouvidos mas se uma voz de uma esfera mais privilegiada falar em seu nome revirarão os olhos e troçarão do sotaque.
Michel Faber, The Crimson Petal and the White. Tradução minha.
O final feliz – através de uma reinicialização do sistema informático de Elysium, toda a gente ganha acesso a cidadania total e serviços de saúde gratuitos num passe indolor – podia ter nascido numa rábula perdida de Cheech e Chong (“Los Ilegais no Espaço”?). Trata-se de um enorme intensificador de auto-estima para aquelas pessoas brancas e ricas que dependem de mão-de-obra imigrante barata – as suas empregadas domésticas e jardineiros e amas – mas querem sentir-se bem consigo mesmas.
Nonsense irritante como este pode explicar por que motivo a classe trabalhadora não usa a expressão “Liberal de Hollywood” como elogio. A sensação quase universal de que Hollywood é um Elysium com melhor segurança e código de vestuário mais relaxado não é apenas um produto da fábrica de propaganda da Fox News – ou do TMZ – mas o resultado de um modo particular de autocongratulação em que a indústria do entretenimento tende a mergulhar.
Em 1879, no final de Uma Casa de Bonecas, do norueguês Ibsen, Nora abandona o lar (incluindo os filhos) após perceber que nunca passara de uma boneca, de um troféu servindo os interesses do marido. Foi um escândalo, apesar de Nora não ter vontade de abandonar os filhos. Na Alemanha, obrigaram Ibsen a alterar o final.
Em 1953, no final de Monika e o Desejo (ou, em versão mais conforme o original, Verão com Monika), do sueco Bergman, Monika abandona casa e família (incluindo o filho) por não desejar aceitar as responsabilidades da idade adulta. O filme também suscitou alguma polémica mas mais na sequência das cenas de nudez e do pormenor de Monika não ter as axilas depiladas do que em resultado de Monika abandonar o filho por não aceitar viver uma vida manietada por ele.
Em 1966, em Persona, também de Bergman, a enfermeira Alma conta a história de Elisabet, a actriz que se recusa a falar, defronte desta. Elizabet engravidou por lhe terem dito que a falta de instinto maternal a tornava pior actriz e depois recusou o filho. O filme foi discutido mas não parece ter existido polémica em torno dos motivos de Elisabet: egoísmo (antes de engravidar), repulsa (depois).
Se Elisabet engravidou voluntariamente e Nora amava os filhos, sensivelmente por alturas de Persona a pílula fez com que o problema de Monika deixasse de ser uma inevitabilidade, transformando os filhos numa escolha prévia. Mais do que contra os homens (para quem, fora do âmbito de um casamento desejado e financeiramente estável, os filhos também sempre constituíram um pesadelo, embora – a injusta vantagem masculina – nem sempre uma responsabilidade), a liberdade sexual feminina foi conquistada contra a maternidade. Ibsen, personalidade complexa que aos dezoito anos engravidou uma rapariga dez anos mais velha e nunca manteve contacto com o filho, sabia-o – ou, pelo menos, intuiu-o. Bergman, que viveu num tempo em que estilhaçar tabus era quase um pré-requisito para se poder ser levado a sério, também. Que a sociedade (pelo menos a sociedade que já ouviu falar das peças de Ibsen e dos filmes de Bergman) pareça tender a aceitar que a ligação entre uma mãe e um filho pode, naturalmente, quase sem discussão, ser subjugada à ideia da liberdade individual e da busca por uma felicidade cada vez mais ilusória (porque centrada em elementos externos: fama, riqueza, beleza, consumo, ...), bom, esse é um daqueles assuntos que as noções do politicamente correcto vêm transformando num tabu, numa época em que parecem restar tão poucos (um sério problema para a arte, que, exceptuando uma ou outra tímida tentativa para redefinir o conceito de inocência – no cinema, fiquemos por Malick –, pouco mais faz do que insistir em efeitos de choque cada vez mais gastos ou em jogos de interpretação quase aleatória, com pouco evidentes ligações ao real). De forma mais genérica: até que ponto são os valores necessários numa sociedade «desenvolvida»? E que valores? Sendo certo que há vantagens numa sociedade não manietada pelos mais tradicionais: as noções de culpa desvanecem-se pois, mais cedo ou mais tarde, toda a gente acaba no mesmo barco. Não há culpados mas também não há inocentes. A outra personagem feminina de Persona, a tal enfermeira chamada Alma, não abandonou qualquer filho; abortou um.
Nas cartas dirigidas a Flaubert, muitas delas de uma sã crueza de linguagem, Maupassant mostra-se orgulhoso da sua virilidade excepcional e chega a confessar-se farto de sodomizar judias!... A resposta foi simples: «experimenta pelo lado tradicional e pode ser que o teu tédio desapareça».
João Costa, no prefácio a As Sobrinhas da Viúva do Coronel, de Guy de Maupassant, Bertrand, 2007.
Será possível acharmos que vivemos numa época especialmente sexual – isto é, em que se faz mais sexo do que noutros tempos e de formas mais criativas? A década de sessenta, com a libertação feminina, o amor livre, o make love not war e o sex, drugs and rock ‘n’ roll, bem como a representação cada vez mais displicente (e inconsequente) do acto sexual na televisão e no cinema terão provavelmente contribuído para tal sensação. Mas corresponderá ela à realidade? Infelizmente, sendo, por um lado, os inquéritos sobre a frequência e os hábitos sexuais o que eram nos séculos anteriores ao último (inexistentes talvez seja o termo que procuro) e, por outro, os humanos (especialmente se possuidores de um cromossoma Y) propensos a mentir quando questionados sobre estas matérias, não é fácil ter certezas. Mas julgo podermos afastar desde já a hipótese de sermos mais criativos. Se as confissões de Maupassant, afloradas acima (e confesso tê-las usado essencialmente para vos chamar a atenção), não constituem grande indicador, há milhares de outras fontes onde podemos constatar que, basicamente, nos limitámos a melhorar alguns acessórios recorrendo à electricidade, à injecção de plásticos e aos circuitos integrados. Mas e a questão da frequência? O mesmo Maupassant terá possuído numa só hora, perante uma testemunha, seis mulheres num bordel parisiense. Mas relações envolvendo troca de dinheiro dificilmente representam a realidade ou a sensibilidade de uma época. Por outro lado, convém evitar dar excessivo crédito a declarações de machos com tendência para o priapismo – ou para a gabarolice. É por esta razão que os relatos do divino Marquês de Sade também não nos servem para caracterizar o que quer que seja. Podíamos ainda recorrer à Bíblia, que nos fala de Sodoma e Gomorra, ou a relatos gregos e romanos mencionando bacanais mas continua a ser difícil fazer comparações com os tempos actuais (como determinar se Calígula participava em mais ou menos orgias do que José Castelo Branco?). De resto, talvez seja melhor atermo-nos aos tempos e às regiões de influência cristã. Então, como fazer? Eu digo-vos: buscando na ficção não erótica de diferentes épocas a ideia que os autores transmitem sobre o que representa ter muitas relações sexuais. Claro que não obteremos o número de relações em que uma pessoa média se envolvia mas pelo menos obteremos uma noção do que era considerado excessivo. Sendo isto um post de blogue (necessariamente curtinho e to the point), vou limitar-me a um par de exemplos totalmente aleatórios e, dessa forma, estou em crer que totalmente representativos.
Comecemos pela actualidade e por uma série televisiva intitulada How I Met Your Mother ou, na versão portuguesa, Foi Assim Que Aconteceu. Nesta série, Barney Stinson, um awesome (definição do próprio) jovem mulherengo nova-iorquino com cerca de trinta anos, tem relações sexuais com a duocentésima mulher diferente durante a quarta temporada. Já perto do final da quinta, refere que a contagem vai em quase duzentas e oitenta (o que revela um considerável aumento de ritmo). Temos então que, de acordo com a mentalidade actual, fazer sexo com quase trezentas mulheres é mais do que suficiente para que um tipo de trinta e tal anos possa considerar-se (e ser considerado) um engatatão de primeira classe. Se Barney tiver iniciado a vida sexual aos quinze, isto dá uma média de catorze ou quinze mulheres por ano. Razoável, de facto, pelo menos quando comparado com a minha estatística pessoal – mas eu tendo a esquecer-me das coisas.
Antes de recuarmos no tempo e colocarmos à prova as façanhas de Barney Stinson convém explicar que toda a lógica deste post se aplica aos homens. E não por uma questão de machismo, pelo menos da minha parte. Apenas porque, no que respeita às mulheres, não há qualquer dúvida. Convenhamos que discutir o número a partir do qual uma mulher era classificada como – er, conquistadora nem sequer é o termo, pois não?... promíscua, então? – há um par de séculos não é mais do que escolher entre os algarismos um, dois e três, consoante se tratasse de um mulher solteira, casada pela primeira vez ou casada pela segunda vez após morte do primeiro marido. Felizmente, hoje a situação é bastante diferente (felizmente também para os homens, que têm – dizem-me – menores dificuldades em arranjar sexo barato). Ainda assim, sinto-me forçado a salientar que, décadas depois da tal «revolução sexual» dos anos sessenta, continua a notar-se uma diferencita no valor considerado excessivo para homens e para mulheres. Lembram-se da cena, em Quatro Casamentos e Um Funeral (de 1994, mas creio que ainda razoavelmente representativo) na qual a personagem interpretada por Andie MacDowell enumerava os amantes que tivera? Ela apenas chegou a trinta e qualquer coisa mas terminou corada de vergonha e, diante dela, a personagem interpretada por Hugh Grant começava a entrar em estado de choque. Ou seja, trinta e qualquer coisa parceiros sexuais já são demasiados para uma mulher de trinta e qualquer coisa anos mas quase trezentas parceiras sexuais ainda não embaraçam um homem de trinta e qualquer coisa anos (pelo contrário, ele continua a sorrir, orgulhoso).
In Italia seicento e quaranta;
In Alemagna duecento trentuna;
Cento in Francia, in Turchia novantuna;
Ma in Ispagna son già mille e tre.
Passando sobre a desfeita de Don Giovanni ter ignorado as mulheres portuguesas (porquê, João, porquê?), somem os números e chegarão a – prontos? – duas mil e sessenta e cinco conquistas sexuais. Ora Don Giovanni teria apenas vinte e dois anos de idade. Considerando uma vida sexual de sete anos, obtém-se a astronómica média de duzentas e noventa e cinco mulheres diferentes por ano. O que são, comparadas com isto, as catorze de Barney Stinson? A conclusão é dolorosa mas inevitável: a menos que na televisão actual se exagere afinal muito pouco, vai-se a ver e ainda temos muito que... muito que… ainda temos muito sexo a fazer.
A imagem de Meryl Streep com a cara pintada de branco foi realizada durante uma sessão que não começou bem. Apenas recentemente Meryl se tornara uma estrela de cinema. Eu já tinha feito um trabalho com ela para a Vogue e, meses antes, a Life usara um retrato dessa sessão na capa. Francesco Scavullo acabara de a fotografar para a capa da Time. Esta ronda de publicidade devia-se à estreia de A Amante do Tenente Francês. Meryl sentia-se desconfortável com toda a atenção de que era alvo e cancelou a primeira marcação mas acabou por ser convencida a vir uma manhã ao meu estúdio, durante duas horas e meia. Entrou e explicou que não desejava ser alguém; não era importante, apenas uma actriz. Havia uma data de livros de palhaços espalhados pelo estúdio e maquilhagem branca que restara de uma ideia que eu tivera para uma sessão com James Taylor ou Jim Belushi. Eu disse a Meryl que ela não precisava de ser alguém em particular, e sugeri que talvez gostasse de pintar a cara de branco. Ser um mimo. Isso deixou-a à vontade. Tinha um papel a desempenhar. Foi dela a ideia de puxar a cara.
Edição Jonathan Cape, 2008. Tradução minha.
A cerimónia de entrega dos Óscares de 2012 é esta noite. Ainda não vi qualquer dos nomeados para melhor filme. No ano passado, o Óscar foi para O Discurso do Rei – um filme simpático, que podia perfeitamente ser uma mini-série da BBC (só em parte isto pretende ser um insulto). Entre os grandes derrotados estiveram A Origem, um bom filme (ou não tivesse sido realizado por Christopher Nolan), com todos os efeitos especiais necessários para maravilhar o público actual de cinema, A Rede Social, outro bom filme (ou não tivesse sido realizado por David Fincher – mas porquê refazer a trilogia Millennium, David?), sobre a ânsia, tão intensa nos dias que correm, de constituir o centro das atenções sem o esforço de produzir algo que o justifique, e Indomável, mais um bom filme (ou não tivesse sido realizado pelos manos Coen), sobre uma rapariga em busca de justiça num mundo violento – e masculino. Na minha opinião, qualquer dos três era mais merecedor do Óscar do que O Discurso do Rei – mas talvez não tanto como o nomeado que vi apenas ontem, em DVD.
A estrutura do filme dificilmente podia ser mais perfeita. Começa por mostrar-nos o ambiente em que Ree se insere, apresenta-nos o problema, faz-nos acompanhar Ree nos contactos com pessoas que parecem todas estranhamente hostis (até as que se presumiria estarem do lado dela, como os familiares mais próximos, parecem opor-se-lhe) e, lentamente, vai-nos deixando perceber o que realmente se passa, as razões para tanta hostilidade e por que se encontra afinal a tarefa de Ree praticamente votada ao fracasso. De um modo ou de outro, quase todas os personagens em Despojos de Inverno são violentas (os irmãos e a mãe de Ree constituem as excepções mais óbvias, eles por ainda não entenderem o que se passa – são as únicas personagens capazes de brincar –, ela por ter desistido de entender) mas a violência parece manifestar-se de modo diferente nos homens e nas mulheres. Eles são duros, agressivos, inacessíveis, preocupados com não mostrar fragilidades. Elas são tão ou mais duras mas a sua dureza – e violência – é uma espécie de resistência, de subjugação raivosa aos desígnios masculinos, nascida da necessidade de terem sido forçadas a adaptar-se ao mundo em que estão inseridas: à maneira de ser dos homens e aos seus problemas frequentes com a lei, aos casamentos precoces e aos filhos que deles resultam, à falta de dinheiro e de perspectivas. Se a sombra dos homens e da sua inflexibilidade é permanente ao longo do filme, são as mulheres quem mais tempo passa no ecrã e quem – desconfia o espectador – acaba por ter mais influência no modo como tudo acaba. Despojos de Inverno é um filme com uma fortíssima componente feminina e não será coincidência ter sido realizado por uma mulher, Debra Granik.
Gostaria de realçar dois últimos pontos, provavelmente também relacionados com esse eventual carácter feminino. O primeiro é que, tratando-se de um filme violento (muito violento), quase não mostra violência física. Antecipa-a, mostra-lhe os efeitos – mas não se detém sobre ela. Num tempo em que os filmes fazem questão de mostrar muito mais do que sugerir, é sempre agradável constatar como a sugestão consegue ser eficaz. Finalmente, encontrando-nos submersos por filmes em que os heróis se riem do perigo e avançam com uma frase cáustica para as mais inverosímeis lutas, é também bom relembrar que são afinal os heróis relutantes, os heróis que fazem o que tem de ser feito porque não há mais ninguém para o fazer, quem mais empatia consegue gerar num ecrã de cinema. Esta constitui, aliás, uma diferença importante entre Indomável e Despojos de Inverno: Mattie Ross é uma rapariga voluntariosa em busca de uma vingança de que pode prescindir, Ree Dolly uma rapariga encurralada que só pode escolher entre dois males – enfrentar quem nunca poderá vencer ou perder casa e família. O verdadeiro heroísmo é não desistir.
Quanto aos Óscares, who cares?
Susannah York, Sarah Miles, Susan George, Julie Christie, Charlotte Rampling, Jenny Agutter, Jane Birkin, Dominique Sanda, Sandrinne Bonnaire, Nathalie Baye, Isabelle Huppert, Carole Bouquet, Valérie Kaprisky, Victoria Abril, Maria Schneider, Hanna Schygulla, Barbara Sukowa, Carole Laure, Geneviève Bujold, Liv Ullmann, Monica Vitti, Ornella Muti... Isso sim, era serviço público.
(Ah, a RTP2 em mil nove e oitenta e poucos...)
Tendo ficado subjugado pela magnífica ideia de juntar cowboys e aliens no mesmo filme (não seria já altura de arranjar uma classificação Menores de 18 anos?), permito-me avançar algumas sugestões para futuros êxitos de bilheteira:
Monstros & Agentes Secretos;
Gladiadores & Super-Heróis;
Feiticeiros & Navy Seals;
Nerds & Bodybuilders;
Motoqueiros & Motoristas de Camião;
Cossacos & Pigmeus;
Piratas & Tuaregues;
Anacondas & Cães Super-Inteligentes;
Padres & Artistas de Cabaret;
Índios & Trabalhadores da Construção Civil;
Cartoons & Doentes Mentais;
Ilusionistas & Especialistas em Kung-Fu;
Médicos & Mentirosos Compulsivos;
Vírus Mortais & Lulas Gigantes;
Monges Tibetanos & Pregadores da Igreja Universal do Reino de Deus;
Freiras & Participantes em Gay Parades;
Alpinistas & Pilotos da Primeira Guerra Mundial;
Ladrões & Cegos, Surdos e Mudos;
Polícias & Deuses Gregos;
Bebés & Vampes;
Cozinheiros & Homens do Lixo;
Robots & Rednecks;
Lésbicas & Exploradores Subaquáticos;
Tetraplégicos & Hiperactivos;
Banqueiros & Pintores de Graffiti;
Economistas & Tarólogos;
Formigas Gigantes & Elefantes Bebé;
Pugilistas & Especialistas em Feng Shui;
Espadachins & Pauliteiros de Miranda;
Jornalistas & Escritores de Best-sellers;
Produtores de Hollywood & Prostitutas.
Hmmm, pensando bem, risquem as duas últimas – estão demasiado vistas.
Era o fim-de-semana a seguir ao Natal de 2009. Duas da manhã da noite de sábado para domingo. (Sei-o porque tomei nota; decidi então escrever este post). Preparava-me para desligar o televisor e ir dormir. No ecrã do televisor, Ethan Hawke, sentado numa livraria de aspecto tradicional, falava com alguma dificuldade do livro que escrevera sobre o encontro de um rapaz americano e de uma rapariga francesa num comboio com paragem em Viena. Não me fui deitar. Fiquei à espera dela. De lado, entre estantes apinhadas de livros, hesitante como se ele (Jesse) pudesse não a reconhecer ou, mais realisticamente, com medo do momento em que ele a reconhecesse. Apesar de conseguir visualizar mentalmente o filme cena a cena (livraria, ruas, café, ruas, parque, bateau-mouche, carrinha, acesso à casa de Céline, encontro com os pais, apartamento de Céline), ou até diálogo a diálogo (correcção: apenas diálogo, uma vez que se trata de um único, fluído apesar da mudança de temas, das hesitações, do que está por trás do que é dito), fiquei mais uma vez a assistir até à lenta dança final ao som de Nina Simone, àquele «I know» que para Jesse é como aprender novamente a respirar.
Tudo começou – pelo menos tudo começou para mim, já que falhei os filmes em que ela entrou antes* – com um filho da mãe cheio de talento e de sorte (mesmo tendo morrido aos 53 anos) chamado Krzysztof Kieslowski (àparte totalmente irrelevante: acabei de bater o recorde mundial de tempo mais longo para escrever duas palavras totalizando menos de vinte letras). Kieslowski (como em quase tudo na vida, da segunda vez já é mais fácil, até porque neste caso o copy/paste ajuda) fez uma série de filmes sublimes em que utilizou um trio de actrizes que me fizeram ponderar a mudança de nacionalidade: Iréne Jacob (em A Dupla Vida de Verónique e Trois Coulours: Rouge), Juliette Binoche (em Trois Coulours: Bleu) e Julie Delpy (em Trois Coulours: Blanc). (Acabei por não mudar de nacionalidade porque descobri que, ao contrário das outras duas, Jacob é suíça e não francesa. Arrependo-me? Mais oui, certainement.) Em Blanc, uma jovem Delpy levava um homem a um radical acto de amor. Apesar de ela estar em cena menos tempo do que seria desejável, compreendia-se a sofreguidão do apaixonado: Delpy era luminosa como um sorriso agradecido.
E foi-o tanto ou mais em Antes de Amanhecer, de Richard Linklater, um filme de culto para setecentas e oitenta e oito pessoas que o viram no cinema ou em vídeo e três alienígenas que o viram na TV enquanto procuravam decidir a sorte do planeta Terra (o filme levou-os a pouparem-nos durante mais algum tempo). Com Ethan Hawke, Delpy deu corpo à fantasia «e se?» que toda a gente pondera, num momento ou noutro: e se dois desconhecidos, depois de uma troca de olhares, decidissem começar a conversar e, contrariando os planos que tinham, passassem algum tempo juntos, de modo a confirmar ou infirmar a atracção e evitar desse modo terem que remeter aquele encontro para o arquivo das experiências que poderiam ter constituído pontos de viragem na vida? No filme, Jesse e Céline encontram-se num comboio atravessando a Europa. Ele vai sair em Viena para voar de regresso aos Estados Unidos, ela segue até Paris. Para não interromperem a relação de cumplicidade que se começa a desenhar, saem ambos do comboio em Viena e passam uma noite de conversa, deambulação e descoberta. Que a cidade seja Viena é pormenor não negligenciável mas também não é fundamental. A história funcionaria em Londres, Lisboa ou Nova Iorque. Em todas elas (sejamos caridosos para com Lisboa) há parques onde se pode estar deitado na relva olhando as estrelas. Na manhã seguinte, Céline segue para Paris enquanto Jesse fica em Viena à espera da hora do voo. Porque ainda não têm a certeza se aquilo que sentem um pelo outro é para levar a sério, combinam voltar ali, à estação de comboios de Viena, exactamente seis meses mais tarde para ver se o outro lá está.
Encontram-se apenas nove anos depois, na livraria de Paris, em Antes do Anoitecer. (Se não viram o filme e querem saber se algum deles foi a Viena, a resposta é «sim». Qual deles e por que é que o outro não foi? Ah, isso não conto.) Estão mais velhos, mais desiludidos, menos disponíveis para acreditar um no outro. Têm vidas próprias, compromissos, responsabilidades. Mas ambos ainda se perguntam “E se?”. O filme, escrito a seis mãos por Delpy, Hawke e Linklater, é uma conversa praticamente em tempo real pelas ruas de Paris. Nada mais. E ainda bem. Como quase sempre, basta o essencial.
E bastam estes três filmes. Delpy também participou em Um Lobisomem Americano em Londres e em Os Três Mosqueteiros (era Constance naquela versão em que entravam Charlie Sheen, Kiefer Sutherland e Chris O’Donnell, e em que o nome «D’Artagnan» provocava risadas de cada vez que era pronunciado) mas não vale a pena falar disso. Foi Zoe em Killing Zoe, de Roger Avary. Teve uma participação breve mas explosiva no narcoléptico mas interessante Broken Flowers, de Jim Jarmusch, e outra apenas um pouco mais longa no aceitável The Air I Breathe, de Jieho Lee. E participou, com Hawke (enquanto Céline e Jesse), num curto segmento do peculiar Waking Life, do partner in crime Richard Linklater. Reconhece que podia ter entrado em mais filmes se tivesse sabido jogar segundo as regras de Hollywood: aceitar outros projectos de treta, sorrir, ser simpática para os responsáveis dos estúdios.
A verdade é que, sendo atraente, Delpy não é uma beleza estonteante, como a típica estrela de cinema, e também não se comporta como uma. Mostra indícios da idade que tem (quarenta e um feitos há nove dias), dá entrevistas de jeans, toca no pescoço ou nos dentes enquanto pensa no que dizer, ri-se de forma quase explosiva. Há dois tipos de beleza, em actrizes como em quaisquer outras mulheres (e talvez homens): a beleza inacessível, intimidante, alicerçada no aspecto físico e numa pose quase permanente, e a beleza mais humana, a que pode ou não corresponder uma grande beleza física mas a que corresponde sempre uma espontaneidade e uma inteligência que pedem contacto. Delpy é um exemplo perfeito do segundo grupo. Digamos que poucos homens (ou mulheres) imaginarão cruzar-se na rua com Angelina Jolie mas já parece mais possível partilhar acidentalmente um banco de jardim com ela. E encetar uma conversa descontraída e interessante, iluminada pelo aquele fantástico sorriso.
* Détective, de Jean-Luc Godard, e Europa, Europa, de Agnieszka Holland, merecem ser referidos.
«Gostas de cinema?»
«Imenso. Agora vou pouco às salas mas houve uma época em que era viciado.»
«A sério?»
«Quando andava na universidade.»
«Que tipo de filmes gostavas de ver? Eu passava-me com certos ciclos dedicados a realizadores antigos. Ao neo-realismo italiano, por exemplo. Ou à nouvelle vague.»
«Er, pois. Eu também. Embora, nesses campos, em Coimbra a oferta fosse um bocado limitada.»
«Eu adorava – e ainda adoro – os primeiros Godard. Vi À Bout de Souffle duas ou três vezes.»
«Hã-hã.»
«E tu? Que filme viste mais vezes enquanto andavas na universidade?»
«Bolas, olha para as horas! Desculpa lá mas tenho que ir. Depois a gente fala, ok?»
É verdade: actualmente frequento pouco as salas de cinema. Fartei-me de pipocas, comentários e ruído de sorvo no vazio. Mas passei fases em que ia ao cinema várias vezes por semana. Enquanto estudante universitário em Coimbra, uma cidade que, quando lá cheguei, tinha quatro salas de cinema, sendo que uma passava apenas filmes pornográficos, fartei-me de repetir o visionamento de filmes. Vi duas vezes uma data deles, três vezes uma mão-cheia e quatro vezes apenas um. Uma obra-prima, certamente. Claro. Como não?
Lembro-me de ir ver ciclos dedicados a Martin Scorsese e a John Ford no Teatro Académico Gil Vicente, Um Peixe Chamado Wanda no Colégio S. Teotónio (olha, afinal eram cinco salas, se bem que esta tivesse uma actividade tão reduzida que quase não conta), La Belle Noiseuse (ah, quatro horas de Emmanuelle Béart nua num filme em que quem estivesse com atenção a outros detalhes que não esse podia aprender a pintar) na Sala 2 do Avenida (a sala que se dedicava ao porno já passara à história e havia agora duas – um luxo – no mesmo centro comercial), Viver e Morrer em LA (o último Friedkin de jeito) no Tivoli, A Lista de Schindler no Girassolum. Mas que filme vi quatro vezes? Só mais um pouco de paciência. Tenho que fazer o enquadramento. Vi-o sozinho num dia à tarde. Um par de dias depois um colega perguntou-me se queria ir com ele. Fui. Na semana seguinte fui novamente, com outros dois colegas. E, por fim, vi-o ainda nessa segunda semana uma quarta vez, acompanhado por uma das poucas raparigas que se dignava prestar-me atenção (como recusar?). O filme? Só se prometerem não rir. Mentirosos. O filme que mais vezes vi numa sala de cinema é o Pretty Woman.
Uma pessoa olha para os elementos das forças especiais plantados nas ruas que o Papa percorre e tem de reconhecer que são belos animais: grandes, musculados, maciços, sempre atentos, com um fantástico sentido de pose. Dobermans, impondo respeito e até temor, mas não eliminando completamente nos que os vêem a vontade de lhes fazer uma festa atrás das orelhas. Porém, a certa altura encontrei-me a pensar que talvez seja contraproducente usar calmeirões assim: haverá alvos mais fáceis para qualquer atirador? E, por outro lado, não devem ser fáceis de arranjar, nem de alimentar (em tempos de crise convém pensar nestes pormenores). Daí à ideia de criarmos uma força especial composta por agentes pequeninos foi um pequenino passo. Uma força composta por portugueses com a estatura que os portugueses costumavam ter, em torno do metro e sessenta, ou até abaixo do metro e meio para os elementos femininos. Agentes assim poderiam ser ainda mais ágeis que os actuais, passariam em sítios onde estes ficam certamente encravados, e constituiriam alvos muito mais difíceis. Bem escolhidos e treinados, operacionais com estas características seriam um caso de sucesso e de diferenciação. Imagine-se a curiosidade (e o respeito) que suscitariam ao nível das instâncias internacionais. Da NATO, por exemplo.
Até em termos cinematográficos a ideia me parece ter méritos. Desde logo, o do realismo (como sabemos, uma preocupação constante em Hollywood, especialmente nos filmes de Michael Bay): ver o típico herói de acção rastejar dentro de condutas de ar condicionado (à la John McClane, em Nakatomi Plaza), ou penetrar em zonas técnicas de aviões (que já não têm muito espaço nas áreas destinadas aos passageiros) sempre me pareceu pouco verosímil. Mas uma força especial de agentes pequeninos seria ideal para operações deste tipo. Poderia ser comandada por um coronel duro mas justo, interpretado pelo Danny DeVito (ou pela Linda Hunt, que parece já estar a treinar para o papel na série Investigação Criminal: Los Angeles mas corre o risco, contracenando com o Chris O’Donnell, com o LL Cool J e com a Daniela Ruah, de contrair uma lesão grave no pescoço antes de ter oportunidade de o desempenhar) e chamar-se The S-Team (de short), o que permitiria excelentes trocadilhos ao gosto de Hollywood, como «Let’s release some steam», (o tema-título poderia ser a canção do Peter Gabriel) ou «Once again, you came up short» (frase do general que sempre se opusera à criação da equipa). E há ainda mais um ponto em que os ganhos de credibilidade seriam evidentes: o típico herói de acção é anti-social, refilão, e detesta sentir-se posto em causa. Tudo características que assentam que nem luvas a imensas pessoas pequeninas.
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