Realizador deste filme, Hillcoat também me merecia crédito. Mas nem por isso eu deixava de ter medo. Descubro-me com razão demasiadas vezes hoje em dia. E a detestar que isso aconteça.
Via Senhor Palomar cheguei ao trailer do filme The Road. Há um par de anos, quando soube que o filme iria existir, suspirei e prometi a mim mesmo não pôr os pés em cinema que o exibisse. Mas a curiosidade é um roedor só aparentemente benigno. Hoje ainda hesitei mas, mesmo com o sabor da fatalidade na garganta, acabei por clicar no triângulozinho ‘play’.
Primeiro, aquilo de que a maioria dos frequentadores actuais de cinema gostará: as partes inicial e final do trailer. São de tal modo assustadoras que me deixaram a tremer e reprimindo vómitos. As imagens da catástrofe (quem necessita de a ver se imaginá-la é tão mais poderoso?), a música sincopada, a montagem feita por alguém que acabara de ingerir uma dúzia de latas de Red Bull, tudo parece anunciar uma nova inanidade de Michael Bay – não The Road, filme baseado nesse monumental (apesar das menos de duzentas páginas que tem na edição portuguesa da Relógio d'Água) e atmosférico livro de Cormac McCarthy. Felizmente (mas é um felizmente pequenino, assustadiço), a parte central do trailer está um pouco mais próxima do espírito do livro. Ainda assim, a que propósito surge tantas vezes a personagem de Charlize Theron (e eu adoro tanto Charlize Theron que ainda não recuperei totalmente da visão a que me sujeitei nestepost) que, no livro, é memorável mas aparece apenas em meia dúzia de páginas? E o que se passa com o aspecto glossy dos cenários? Condiz tanto com o mundo desolado e cinzento (literalmente de cinza) que McCarthy criou como um idiota envergando um fato rasgado no Carnaval se parece com um verdadeiro mendigo.
The Road é um livro imenso. Que não admite compromissos (o final não é um compromisso, é a réstia possível de esperança). Que causa pena, raiva, repulsa, incompreensão. E medo. Medo do futuro, da solidão, dos outros, do sentimento de impotência. E de ver este filme.