como sobreviver submerso.
Lembro-me de trovoadas que faziam com que a minha mãe começasse a rezar a Santa Bárbara, interrompendo-se uma fracção de segundo de cada vez que soava um trovão, para logo recomeçar com maior ímpeto, e me deixavam a tremer, mais por causa dos trovões do que dos relâmpagos e, mais ainda, por não saber como lidar com uma mãe assustada. Um miúdo de quatro ou cinco anos fica perdido quando os pais se assustam. Os pais sabem tudo, aguentam tudo, são capazes de o proteger de todos os perigos. O que fazer, quando o medo que sentem não parece inferior ao dele?
Eram trovoadas fortes, as que ocorriam junto à Serra da Estrela. As trovoadas são muito mais assustadoras fora das cidades. Mais puras, também. Nas cidades, parecem uma intromissão desagradável, quase impertinente, da natureza. Um obstáculo ao fluxo do trânsito e das pessoas calcorreando os passeios. Uma chatice. No campo, com o vento, exultante, sacudindo árvores, dobrando arbustos, penteando a erva, com a luz do dia sugada pelas nuvens escuras e baixas, com a água caindo como um corpo sólido, não é a incongruência que sobressai mas algo mais primevo. Algo que remete para um jogo entre luz e sombra, entre razão e instinto, entre recompensa e castigo. Daí as rezas a Santa Bárbara.
Trovoadas breves ecoaram sobre o Porto durante a manhã. Sinto vontade de telefonar à minha mãe e lhe perguntar como está o tempo por lá. E, se estiver a trovejar, de ficar a conversar sobre qualquer coisa sem importância (as maldades do gato, por exemplo) até que passe.
De
Margarida a 23 de Fevereiro de 2010 às 14:58
... medinho de uma trovoadazita de nada?!
(mas o texto está lindo...)
Agora tenho essencialmente aquele medo muito masculino de que a trovoada me queime alguns brinquedos (televisor, leitor de CDs, amplificador, Xbox360, etc.), apesar das fichas com mil e um interruptores e protecções a que está tudo ligado.
E obrigado.
De
Margarida a 24 de Fevereiro de 2010 às 09:42
...quase que retiro o que escrevi (sobre a trovoada) face à brutalidade da de esta noite...
Ficámos sem luz por mais de uma hora.
Os alarmes dos carros dispararam num susto ruidoso e colectivo, o granizo parecia não terminar até fazer das casas passadores...
muito...primevo...
mesmo assim, não senti necessidade de orar a santa alguma.
Eu, é logo directo com Deus.
Tem o número dele, Margarida? Nunca se sabe se me pode dar jeito, um dia destes...
(E, já agora, que rede é que ele usa: TMN, Vodafone ou Optimus?)
(O meu único grande ponto de contacto com o Dr. Mário Soares fica bem à vista na circunstância de me esquecer sempre de utilizar a inicial em maiúsculas nas referências a Deus...)
De
Margarida a 24 de Fevereiro de 2010 às 12:01
A rede de Deus é:
Use à vontade, não tem limite nem custo.
De
paula a 23 de Fevereiro de 2010 às 15:02
aí está um telefonema que eu apreciaria, alguém que compreendesse o meu pavor a trovoadas. ufa! esta já passou!
Façamos assim, Paula: durante as próximas trovoadas imagine que eu lhe telefono e que conversamos - sei lá - sobre os filmes do Clint Eastwood...
De
Margarida a 24 de Fevereiro de 2010 às 09:37
De
Margarida a 24 de Fevereiro de 2010 às 12:02
De
Margarida a 24 de Fevereiro de 2010 às 12:15
Desisto.
De
Margarida a 24 de Fevereiro de 2010 às 13:51
..tá mal!
também fui acordada por essa trovoada no porto. mas eu gosto de trovoadas desde pequenina, já de vento...
De
paula a 23 de Fevereiro de 2010 às 19:08
:)
Bendita trovoada que o inspirou assim, JAA. É verdade: tal como o luar, a trovoada é diferente no campo.
A pastelaria continua geograficamente virtual; a pasteleira é que andou por terras da invicta em tempo de trovoada.
quanto ao vento, é como dizia o meu pai, desarruma-nos os neurónios - basta visitar sagres para perceber do que falo
OK, tenho de o fazer de novo. Só fui a Sagres duas vezes na vida. Na primeira tinha seis anos e não me recordo de nada ; na segunda tinha trinta e um e não me recordo de estar assim tanto vento...
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